A Influência da Exploração Espacial no Nosso dia-a-dia
A exploração espacial e a aparente perda de impacto sobre a sociedade
A perda de importância da exploração espacial no subconsciente das pessoas (embora não - de todo! - no seu dia-a-dia) tem diversas origens. É natural que a repetição de imagens sobre o espaço desde há mais de 40 anos ajude à banalização das viagens espaciais, e da observação do Universo, na perspectiva do cidadão comum, mas isto não é nada que não aconteça com qualquer série televisiva! O Universo sempre foi, é, e será uma fonte de inspiração para o Homem, não só porque coloca questões filosóficas existenciais tremendas - de onde vem o mundo? Porque estamos aqui? Qual é o nosso destino e o do mundo? Será que estamos sozinhos? - como também nos envolve num processo infinito de descoberta, maravilhando-nos continuamente. Na verdade, não é nada difícil encontrar torrentes de imagens na Internet, neste preciso momento, que nos mostrem fenómenos novos, diferentes ou inexplicáveis para os cientistas - basta perder um pouco de tempo nas páginas das agências espaciais mundiais!
A Ciência e uma actividade que produz resultados a longo prazo
Mas a realidade é complexa para além do que ainda hoje podemos imaginar, embora se gastem milhares de milhões de euros em missões consecutivas para nos estudar. Será que, por exemplo, é assim tão fácil de explicar tudo o que se vai passando com o clima do nosso planeta, mesmo com a quantidade e qualidade de informação de que hoje dispomos? Basta referir que os detalhes sobre o objecto de estudo que nos está mais próximo, o nosso próprio cérebro, estão em grande parte ainda por descobrir. A complexidade de certos mecanismos não se torna evidente só com a existência de dados e a dedicação de pessoas: é preciso tempo! A verdade é que o processo que leva, finalmente, a aplicação de certos conhecimentos, pode levar gerações. Veja-se o caso do diagnóstico médico: será que, em certa fase da ciência, não teria sido defensável bloquear fundos para a investigação sobre a existência de anti-matéria, sabendo hoje que, em medicina, se utiliza esse mesmo conhecimento para efectuar de forma eficaz a detecção de cancro, doenças cerebrais e das artérias coronárias através de tomografias por emissões de partículas de anti-matéria (no caso, positrões, uma partícula semelhante em massa ao electrão mas com a carga oposta)?
E quantas pessoas sabem que a influencia dos CFCs na destruição da camada de ozono da atmosfera terrestre foi inicialmente identificada a partir de investigações direccionadas especificamente para a atmosfera de Vénus?
A Ciência não exprime o valor moral das coisas
Finalmente, e preciso deixar claro que a Ciência não procede a um julgamento de valor sobre as coisas, apenas procura desvendar as razoes por que as coisas são como são, porque os fenómenos acontecem como acontecem, e qual a sua influencia sobre o Homem. Os maus usos da ciência e da tecnologia, sobretudo ao longo do século XX, são de facto diversos, desde o desenvolvimento de aeronaves com objectivos militares ate a utilização de conhecimentos em física nuclear para a constituição das bombas atómica e de hidrogénio (bomba H), e motivam por vezes uma certa desconfiança das pessoas em relação aos cientistas, o que é natural. Mas dever-se-á também lembrar que, por exemplo, no caso particular da construção da bomba atómica nos anos 40 do século XX, se tratou claramente de uma corrida contra o tempo – sabia-se que a Alemanha estava, na altura, em vias de a conseguir, e temia-se legitimamente pelas consequências de não a obter em antecipação ao inimigo. Muitas vezes, o desenvolvimento cientifico-tecnológico tem de facto essa faceta militar, mas como vitima de um enquadramento especifico, como a urgência em obter superioridade sobre um oponente ameaçador. Do ponto de vista de cientistas e engenheiros, a opção torna-se entre o mau e o pior: contribuir para a concepção de armas sabendo que estas serão utilizadas para infligir seres humanos, ou abster-se de o fazer, deixando os seus conterrâneos e entes mais próximos à mercê do inimigo?
Convém não esquecer, por outro lado, que os dois casos apresentados acima nos servem no dia-a-dia como meio insubstituível de transporte e assistência em ocasiões de catástrofes naturais (o primeiro), e como possível fonte de energia inesgotável para o futuro longínquo (o segundo, através da fusão nuclear de elementos como o hidrogénio e hélio noutros mais pesados). O mau uso é proveniente dos mesmos fundamentos que levam a criação de muitos usos benéficos da mesma tecnologia. Indo directamente a raiz deste aparente imbróglio: tudo não passa mais de uma questão de direccionamento da ciência e tecnologia do que do seu valor moral intrínseco, que é inexistente!
Nos próximos artigos procurarei focar algumas das formas através das quais a conquista do espaço nos proporcionou desenvolvimento económico e humano. Em particular, dividi-las-ei em três áreas principais: a contribuição da exploração espacial como fonte de ensinamentos para o Homem (dividida em duas partes), a contribuição do desenvolvimento tecnológico saído das missões espaciais para o dia-a-dia das pessoas (também dividida em duas partes), e a contribuição da presença do homem no espaço para o nascimento de uma nação global.
Autoria: Tiago Hormigo Licenciado em Engenharia Aeroespacial pelo Instituto Superior Técnico Mestre em Engenharia Aeroespacial pela Universidade Técnica de Delft (Holanda) |