Saros, que Saros?


Prever a ocorrência de um eclipse, seja lunar ou solar, não é uma proeza recente. Alguns milénios antes de nós, os chineses sabiam, que todos os eclipses se repetem, pela mesma ordem, após um prazo de 18 anos e 11,33 dias ou 18 anos e 10,33 dias, conforme o número de anos bissextos que ocorram durante este prazo. Este intervalo de tempo chamamos o ciclo de Saros. A causa para esta repetição é simples. Um eclipse apenas pode ocorrer se a Lua e o Sol estão muito próximos dos nodos da órbita lunar e se a Lua está Cheia (eclipse lunar) ou Nova (eclipse solar). A Lua precisa 27,21 dias para voltar para o mesmo nodo (designados como pontos de Dragão, daí o nome do mês dracónico = 2 passagens pelo mesmo nodo).



Fig.7: A Terra em órbita do Sol e a Lua em órbita em torno da Terra. Para que os eclipses no topo da imagem se possam repetir, será necessário atingir a mesma configuração dos astros. Por sinal, isto acontece aproximadamente cada 18 anos.


De forma semelhante, a mesma fase da Lua apenas se repete após 29,53 dias, a que chamamos um mês sinódico. Devido à regressão do nodo lunar, o Sol leva 346,62 dias para voltar ao mesmo nodo, ou seja, um pouco menos que um ano trópico. Embora fora de uso, a este período chamamos um "ano de eclipses" ou ciclo de eclipses.

Assim, para que o mesmo eclipse se possa repetir, é necessário que tanto o número de meses dracónicos (mesmo posição no nodo), o dos meses sinódicos (mesma fase) e do ciclo de eclipses (mesma posição relativa do Sol) seja um número inteiro. Como tal, para a repetição da constelação e das circunstâncias são precisos, no mínimo:

223 meses sinódicos = 6585, 35 dias
e
242 meses dracónicos = 6858,32 dias
ou
19 ciclos de eclipses = 6585,78 dias
e ainda
239 meses anomalísticos (=tempo entre dois perigeus) = 6585,54 dias

Os antigos Caldeus, um povo que viveu na Mesopotâmia cerca 2000 anos antes da nossa era e que dominou a Babilónia e Assíria até o ano 539 AC, registaram com muito cuidado as datas de todos os eclipses e também chegaram à conclusão, que a sequência de eclipses se repetia sucessivamente após cerca 6585 dias. Este período, os Caldeus chamaram um Saros, o que no seu idioma era um derivado da palavra "repetição".

Apesar de os povos antigos inicialmente não saberem nada da causa que provoca os eclipses solares e lunares, tanto os Chineses, como os Caldeus e mais tarde os Babilónios, conseguiram, graças a esta repetição, prever com bastante exactidão as datas da sua ocorrência. Desde então, e até terem sido descobertos meios matemáticos mais fiáveis, o ciclo de Saros serviu de meio de previsão dos eclipses também no mundo ocidental.

Infelizmente, esta repetição dos eclipses não é perpétua. Devido às pequenas discrepâncias entre a duração dos meses sinódicos e dracónicos e do ciclo de eclipses (ver os valores acima), os múltiplos desses intervalos divergem após vários ciclos e levam a que as condições dos eclipses se alterem lenta e gradualmente. Por consequência, após um certo tempo acontece, que um dado eclipse sai do ciclo de Saros, enquanto outro eclipse se junta ao mesmo. Por sinal, o ciclo de Saros não permite prever a entrada e saída dos eclipses no ciclo. Isto foi particularmente fatal, segundo as lendas, para os astrónomos chineses Hi e Ho, os quais foram executados, porque não tinham previsto o eclipse do dia 22 de Outubro 2137 AC. Felizmente, hoje em dia, ser Astrónomo já não é uma profissão de risco.

Normalmente um eclipse lunar mantém-se durante cerca 1000 anos dentro do ciclo de Saros, enquanto um eclipse do Sol se mantém em média durante 1200 anos. O eclipse parcial do Sol que se verifica no dia 14 de Outubro 2004, ou seja, 10 dias antes do eclipse lunar do mesmo mês e apenas visível no Nordeste da Ásia, começou como um eclipse parcial de fase crescente no dia 6 de Março 1049. Depois este seguiu ao longo do ciclo de Saros com oito eclipses parciais de fase crescente desde 1067 até 1193. A partir de 1211 até 1986 este eclipse mostrou-se como eclipse total. E com o eclipse parcial desde ano começa a fase decrescente com nove eclipses parciais. O último desses eclipses dar-se-á no ano 2149 (9 de Janeiro) terminando assim a sua presença no ciclo.