A Viagem



Uma imagem do asteróide Ida, com o seu companheiro Dactyl. Repare, Ida tem um tamanho de uns 50 km, Dactyl é apenas 1.5 km em diâmetro ! Crédito: NASA
Galileo foi lançado no dia 18 Outubro de 1989 pelo VaiVem Espacial da NASA. A viagem para Júpiter não seria uma viagem directa, embora a missão tenha sido preparada para isso. Aconteceu que o acidente com o VaiVem Espacial em 1986 fez parar o programa da mesma durante algum tempo. De facto, a Galileo era para ter sido lançado mais cedo. Por essa e outras razões o caminho da Galileo, lançada com atraso, teve de ser outro. A Galileo usou os campos gravitacionais de Vénus e da Terra para alcançar a velocidade suficiente para atingir Júpiter. Passou perto de Vénus em Fevereiro de 1990, depois passou perto da Terra em Dezembro do mesmo ano. A partir daí deu uma grande volta, que a levou dentro da cintura de asteróides, voltando novamente ao planeta mãe dois anos depois, em Dezembro de 1992. Nesse encontro conseguiu acumular a energia suficiente e foi então directo para Júpiter, sem outros desvios.

Penso que se pode dizer que a missão Galileo já era um grande sucesso, mesmo antes de chegar a Júpiter. Durante as suas visitas a Vénus, duas vezes à Terra e à Lua, e duas vezes à cintura de asteróides, fez inúmeras observações, usando todos os instrumentos a bordo. Foi a primeira nave da história a observar dois asteróides de perto, primeiro o asteróide Gaspra, depois Ida. Descobriu que Ida, um objecto em forma de batata com um tamanho aproximado de 50 km por 20 km, tem um asteróide satélite à volta dele, baptizado Dactyl. Esse objecto tem um tamanho de 1,5 quilómetros, uma coisinha pequenina. Graças à determinação da órbita de Dactyl à volta de Ida, os cientistas conseguiram pela primeira vez determinar com alguma certeza a densidade de um asteróide. Este é um parâmetro muito importante, pois dá dicas importantes sobre a composição do objecto.

Outro ponto muito positivo foi o facto de poder usar os instrumentos da Galileo para observar uma série de objectos diferentes ao longo dos anos da viagem. Assim, os técnicos e cientistas conseguiram testar e habituar-se ao funcionamento dos instrumentos, assim com ao tratamento dos dados. Pessoalmente, diria que foi essencial esta aprendizagem, pois permitiu obter resultados da análise dos dados muito rapidamente, depois de a Galileo ter chegado no seu destino final.

Aconteceu mais um bónus ao caminho para Júpiter. Em Julho de 1994, um ano e meio antes da chegada da Galileo, um cometa chamado Shoemaker-Levy/9 colidiu com o planeta. Visto a partir da Terra essas colisões (foram vários pedaços que entraram na atmosfera de Júpiter) aconteceram no lado nocturno de Júpiter, e portanto invisível para o espectador terrestre. No entanto, a Galileo estava numa posição melhor, e conseguiu ver os impactos directamente. Fez observações únicas, que completaram as observações feitas a partir de telescópios terrestres.

De facto, antes de chegar a Júpiter e de começar a missão oficial, já os cientistas tinham efectuado muita análise dos dados da Galileo (atmosfera de Vénus, a Terra, os asteróides, o impacto do cometa) e publicaram trabalhos científicos. Eu pessoalmente trabalhei sobre os dados da atmosfera de Vénus, para o meu estágio de fim de curso e para o estágio de mestrado, no Observatório de Paris.

Mas nem tudo correu bem. Sucedeu algo de grave, que prejudicou toda a missão, colocando mesmo o seu sucesso e execução em causa. A Galileo levava uma antena parabólica de 4,8 metros de diâmetro para poder comunicar com a Terra. Essa antena estava fechada durante o lançamento como uma guarda-chuva. Só ia ser aberta depois da primeira passagem pela Terra. A data em que isto era para acontecer estava planeada para ser o dia 11 de Abril de 1991. No entanto, nesse dia a antena não abriu. Mais tarde, os engenheiros aperceberam-se que duas das dezoito varetas tinham ficado presas, impedindo a abertura correcta. Confusão total. Antenas deste tipo tinham sido usadas em muitos satélites de telecomunicações, sem quaisquer problemas. Seguiram-se muitas tentativas para libertar as varetas presas, todas elas sem sucesso. Sem antena, a Galileo era quase surda e muda. Não podia transmitir as 50.000 imagens, entre outros dados, inicialmente previstas. Um novo plano para a missão teve de ser elaborado. Um plano em que as observações teriam de ser feitas com muito cuidado, e de zonas muito bem seleccionados. Com este plano, três quartos dos objectivos científicos iniciais podiam ser executados. Agora, em retrospectiva, penso que de facto muitos dos objectivos foram atingidos, tendo ido até além das expectativas. Não foi possível fazer os filmes da atmosfera de Júpiter, e por isso não foi possível estudar tão bem a sua meteorologia. Não foi possível ter cobertura global do planeta, e acho que se perdeu com isso. No entanto, os dados que a Galileo transmitiu para a Terra ainda têm muito para se analisar, e irão ocupar cientistas durante mais algum tempo. A Galileo foi uma missão simplesmente fantástica e pioneira na história da exploração dos planetas gigantes, história essa que só está a arrancar.