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Phoenix – O fim anunciado

2008-11-19

Visão artística da Phoenix na superfície de Marte. A uma latitude elevada (como é o caso), quando chega o Inverno o Sol só se deixa ver durante algumas horas por dia – até, por fim, desaparecer por completo. Crédito: Corby Waste, JPL.
Há pouco mais de uma semana, a sonda Phoenix da NASA deixou de contactar a Terra. Este desenvolvimento era esperado, como já aqui foi referido. De facto, a missão da sonda já tinha sido alargada – a duração inicialmente prevista era de três meses, até ao fim de Agosto (a aterragem da sonda em Marte deu-se em 25 de Maio). É facto que a duração prevista de qualquer missão é sempre calculada de forma conservadora – no caso dos dois pequenos veículos, o Spirit e o Opportunity, este “prazo de garantia” também não ia além dos três meses; passados vários anos, eles continuam a rodar e a desbravar novos horizontes na paisagem do planeta vermelho (mesmo que apresentem alguns problemas de idade…).

Neste caso, porém, havia algumas importantes diferenças. Em primeiro lugar, tratava-se de um engenho estático, que não se podia ir colocar numa posição mais favorável para recolher a luz solar e sobreviver. Depois, Marte, tal como a Terra, tem estações do ano; e, tal como na Terra, a uma latitude elevada (como é o caso), quando chega o Inverno o Sol só se deixa ver durante algumas horas por dia – até, por fim, desaparecer por completo. Ainda como na Terra, o gelo acumula-se na superfície de Marte… Portanto, a sorte da Phoenix estava há muito decidida: a escassez de energia, a impossibilidade de operar os instrumentos, e depois um revestimento de gelo. Uma espécie de morte… Alguns sonham com uma hibernação, de que a sonda possa recuperar quando Marte der mais meia-volta em torno do Sol e a Primavera regressar ao hemisfério norte do planeta. Está portanto planeado voltar a tentar contactá-la daqui a menos de um ano (cada estação, em Marte, dura praticamente o dobro dos três meses aqui da Terra).

Ainda assim, uma vez que tudo continuava a funcionar, apesar do frio (que já chegava perto dos -100 C, com máximas da ordem dos -40…) a missão prosseguia nos últimos dias de Outubro, utilizando os instrumentos a bordo para continuar as suas investigações. Depois, os acontecimentos precipitaram-se: uma tempestade de poeira sujou de tal forma os painéis solares que os níveis de energia baixaram drasticamente, e a sonda deixou de dar novidades, apesar dos esforços dos controladores para se manterem em contacto. (Já agora, uma pergunta habitualmente colocada quanto a isto: se existem painéis solares e se a poeira lhes prejudica o rendimento, porque é que estas sondas não têm uma espécie de limpa-pára-brisas? A resposta mais simples é: numa sonda, o que interessa é ter o mínimo de peso e gasto de energia, e os “lugares” disponíveis são para instrumentação científica e sistemas de engenharia…)

A Phoenix possuía uma gama de instrumentos pensados para dois objectivos principais: a caracterização do solo (e do gelo que, como se esperava, espreitava logo por baixo de uns centímetros de areia fina e poeira) e da atmosfera, na região de aterragem. Neste último caso, a estação meteorológica (de construção canadiana) foi procedendo a um registo contínuo da pressão, temperatura, humidade e velocidade do vento, e realizou ainda importantes observações sobre a presença de poeiras na atmosfera, sobre as nuvens marcianas (filmadas repetidamente) e até sobre a queda de neve em Marte.

Para investigar as propriedades e composição do solo, a sonda tinha dois micro-laboratórios: o TEGA e o MECA. Estes acrónimos escondem, no primeiro caso, uma espécie de forno (ou melhor, oito, não reutilizáveis, de dimensões comparáveis às da carga de uma caneta) onde amostras de solo (igualmente diminutas) eram aquecidas lentamente até à vaporização, sendo os produtos analisados e identificados por um espectrómetro de massa. Já o MECA incluía microscópios para analisar em detalhe as partículas de poeira recolhidas, uma série de agulhas para medir a temperatura e condutividade do solo, e mais uma série de micro-contentores (neste caso, quatro) onde outras amostras de solo foram analisadas depois de lhes ser adicionada água (levada deste nosso azul planeta).

Como é dito num comunicado de imprensa da equipa responsável pela sonda, esta escavou, recolheu, cozeu, cheirou e saboreou a matéria marciana. Para lá disso, recolheu ainda mais de 25 000 imagens a várias escalas de observação (desde os panoramas grandiosos da superfície aos detalhes das escavações e das mais pequenas partículas do solo). Revelou mais informações sobre a presença da água no planeta, identificou um solo com características mais “amigáveis” do que os que até agora tinham sido investigados em diversos locais (e que levou a um comentário jocoso sobre a possibilidade de plantar nabos em Marte…), e até encontrou diminutas quantidades de carbonatos – um tipo de mineral inequivocamente associado à água, e que até agora tinha persistentemente escapado à detecção no planeta vermelho.

Claro que a imensidade de dados recolhidos pela sonda está longe de ter sido vasculhada pelas equipas científicas dos diversos instrumentos. Dito de outra forma, há informação para os manter ocupados durante muito tempo… a eles, num primeiro tempo, mas depois também a toda a espécie de cientistas que se queiram debruçar sobre as questões ainda por elucidar quanto à história e evolução deste nosso vizinho planetário. Por exemplo, a possibilidade de Marte ter albergado vida, algures no seu passado; ou de, pelo menos, ter exibido condições de habitabilidade.

Entretanto, três outras ondas (as americanas Mars Odyssey e Mars Reconnaissance Orbiter, e a europeia Mars Express) prosseguem, em órbita, a sua permanente vigilância e recolha de dados sobre Marte. E, apesar das dúvidas, continua prevista a partida do Mars Science Laboratory para daqui a uns meses. Portanto, a investigação marciana está bem viva, recomenda-se, e não deixará de continuar a provocar surpresas…