Introdução



Poster do filme “Uma Verdade Inconveniente” vencedor do Óscar 2007 para melhor documentário
Ao começar a ler estas linhas poderá pensar quando foi a última vez que leu, viu ou ouviu, alguma notícia sobre um dos diversos assuntos relacionados com a problemática das Alterações Climáticas globais. No caso de ser leitor de jornais e revistas nacionais 1,2, ouvinte de rádio 3,ou ainda no caso de ser espectador de televisão 4 depressa se aperceberá que, provavelmente, não terá sido há muito tempo.

De facto, existe actualmente um alargado consenso científico que aponta no sentido de a influência antropogénica sobre a composição da atmosfera poder provocar (e em alguns caso poder mesmo já estar a provocar) efeitos significativos na temperatura média global à superfície da terra. Estes efeitos irão, por sua vez, originar impactos significativos sobre a biosfera terrestre, alterando padrões climáticos que durante largos anos foram considerados como garantidos.

Estas alterações no clima e subsequentes implicações sobre toda a estrutura socio-económica, tanto a nível global como nacional/regional, são motivo de preocupação ainda mais se considerarmos todas as incertezas associadas a esta área. Outro motivo que deverá pesar quando confrontados com a possibilidade de estarmos a provocar alterações significativas no nosso ambiente global, o mesmo ambiente que nos fornece a sustentação básica para viver (e.g. terra, ar, água), é o facto de todos estes impactos que nos são frequentemente apresentados sobre a forma de cenários, apenas poderem ser confirmados e verificados quando já for demasiado tarde para os evitar.


Joseph Fourier (1768-1830)
Mas voltando um pouco atrás no tempo será interessante perceber um pouco melhor como as questões relacionadas com o efeito de estufa, o aquecimento global e as alterações climáticas surgem na nossa longa história como sociedade.

Uma das primeiras referências conhecidas sobre o efeito de estufa atmosférico é creditada a Joseph Fourier (1768-1830), matemático e físico Francês que em 1827 publicou um ensaio onde afirmava que os gases na atmosfera poderiam aumentar a temperatura à superfície da terra 5. Fourier estabeleceu ainda o conceito de balanço energético planetário referindo que os planetas recebem energia proveniente de uma série de fontes provocando um aumento da temperatura, mas que também perdem energia através do que ele designou por “calor obscuro” (que mais tarde se viria a descobrir ser a radiação infravermelha), a uma taxa que aumenta com a temperatura. Apesar de Fourier compreender esta relação é curioso notar que a equação de Stefan-Boltzmann que a equaciona de forma exacta apenas ter sido experimentalmente descoberta cerca de 50 anos mais tarde.


Svante Arrhenius (1859-1927)
Em 1896, o químico Sueco Svante Arrhenius (1859-1927) desenvolveu uma teoria onde além de procurar explicar as épocas glaciares, especulou que os níveis de Dióxido de Carbono (CO2) na atmosfera poderiam substancialmente alterar as temperaturas à superfície da terra através do efeito que viria a ser conhecido como o efeito de estufa.6 Apesar de muitos dos seus cálculos sobre a capacidade da terra de absorver e reflectir a radiação solar terem resultado em valores erróneos, é de salientar que Arrhenius estimou que uma duplicação das concentrações de CO2 na atmosfera (normalmente designada por sensibilidade climática) deveria provocar um aumento da temperatura global à superfície entre os 4 e os 6 ºC.

Recentemente 7 o IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) apresentou, para este mesmo parâmetro, uma estimativa de valores (com uma probabilidade superior a 66%) entre os 2 e os 4,5 ºC, sendo a melhor estimativa a rondar os 3 ºC e sendo muito pouco provável (P <10%) que este valor seja inferior a 1,5 ºC. Assim, Arrhenius que acreditava que um mundo mais quente poderia ser uma alteração bastante benéfica e que calculou que a duplicação dos níveis de CO2 poderia levar até 3000 anos a ocorrer (actualmente acredita-se que poderá apenas levar cerca de um século), aproximou sozinho um valor de sensibilidade climática que requereu, nos últimos anos, o trabalho conjunto de muitas centenas de cientistas a nível mundial.


John Tyndall (1820-1893)
Um terceiro cientista a quem se reconhece trabalho pioneiro na área das alterações climáticas é John Tyndall (1820-1893), filósofo naturalista Irlandês que se notabilizou pelo seu trabalho sobre a transparência e opacidade de gases/vapores e relação com o calor radiante. Tyndall demonstrou que as moléculas de vapor de água, o CO2 e ainda o Ozono (O3) absorvem muito bem a radiação calorífica e que, mesmo em pequenas quantidades, estes gases absorvem esta radiação de uma forma muito mais eficaz que a própria atmosfera como um todo. Posteriormente, Tyndall fez a ligação destes fenómenos à possibilidade da ocorrência de alterações do clima terrestre, tendo ainda tentado explicar uma relação entre estas alterações e o avanço e recuo dos glaciares.8

Muita coisa se alterou no planeta terra desde que estes cientistas primeiro analisaram a relação entre a composição da nossa atmosfera e o clima que experimentamos à superfície. As nossas sociedades mudaram e em poucas gerações a humanidade assistiu a desenvolvimentos tecnológicos espantosos (e por vezes assustadores). Como consequência a nossa atmosfera também se alterou e, nesta questão, tanto defensores como críticos do potencial efeito antropogénico sobre o clima aceitam que o nosso desenvolvimento como sociedade introduziu no planeta quantidades antes inimagináveis de substâncias que, para o bem ou para o mal, algum efeito irão produzir.


Anomalia da temperatura média global relativamente à média 1961-1990. Fonte: Global Warming Art
Obviamente é extremamente difícil conseguir introduzir um tema tão abrangente como as Alterações Climáticas globais sem produzir dezenas de gráficos e explicações detalhadas sobre os mais variados assuntos desde a Química e Física atmosférica 9, passando pelas áreas da política climática global (e.g. Protocolo de Quioto, IPCC) 10, dos modelos climáticos 11 e ainda dos potenciais impactos destas alterações sobre o nosso planeta. Se a isto acrescentarmos áreas de investigação de emergente interesse como a Paleoclimatologia 12, a Climatologia e Meteorologia 13, e a própria política ambiental e climática, começamos a perceber um pouco melhor a enorme complexidade 14 que o estudo da atmosfera terrestre, da nossa influência sobre a mesma e ainda dos potenciais impactos que a combinação dessa influência com fenómenos naturais conhecidos pode vir a representar em termos de Alterações Climáticas globais.

Desta forma espero que os textos aqui apresentados, bem como referências disponibilizadas, possam contribuir para uma melhor compreensão deste tema que a partir da próxima semana iremos analisar numa perspectiva bem mais próxima de nós e da nossa realidade: os potenciais cenários e impactos das Alterações Climáticas em Portugal.

Referências

1 http://dn.sapo.pt/2007/03/31/sociedade/alteracoes_climaticas_agravar_a_fome.html

2 http://visao.clix.pt/default.asp?CpContentId=333112

3 http://tsf.sapo.pt/online/internacional/interior.asp?id_artigo=TSF178428

4 http://sic.sapo.pt/online/noticias/vida/especiais/alteracoes+climaticas/

5 Fourier, J.-B.J. (1827). Mémoires de l'Académie Royale des Sciences de l'Institut de France, VII. 570-604

6 Svante Arrhenius (1896). On the Influence of Carbonic Acid in the Air upon the Temperature of the Ground, London, Edinburgh, and Dublin Philosophical Magazine and Journal of Science (fifth series), April 1896. vol 41, pages 237-275.

7 http://www.ipcc.ch/SPM2feb07.pdf

8 http://www.tyndall.ac.uk/general/history/john_tyndall_biography.shtml

9 http://www.grida.no/climate/ipcc_tar/wg1/index.htm

10 http://www.ipcc.ch

11 http://www.metoffice.gov.uk/research/hadleycentre/models/modeltypes.html

12 http://www.ncdc.noaa.gov/paleo/paleo.html

13 http://www.wmo.int/index-en.html

14 http://www.begbroke.ox.ac.uk/climate/interface.html