As primeiras questões relativas à formação de estrelas e planetas



Visão do artista do planeta a orbitar a estrela 51 Peg
Finalmente, após vários anos de tentativas e a utilização de diferentes abordagens ao problema, era descoberto um planeta extra-solar! O planeta era um planeta gigante e a sua massa foi estimada como tendo 0,44 vezes a massa de Júpiter. No entanto, havia algo completamente inesperado: o planeta descoberto diferia significativamente dos velhos conhecidos do Sistema Solar. Em vez de se encontrar a uma distância semelhante àquela que Júpiter e Saturno descrevem as suas órbitas no nosso sistema planetário, o planeta apresenta um período de translação em torno da estrela (ou, mais exactamente, em torno do centro de massa do sistema) de apenas 4,2 dias. Encontra-se assim cerca de 20 vezes mais perto da sua estrela-mãe que a Terra se encontra do Sol, ou a uma distância 7 vezes menor que a que separa Mercúrio da nossa estrela.

Esta descoberta constituiu um verdadeiro entrave para as teorias de formação planetária. De acordo com os modelos de formação planetária vigentes em 1995, este planeta nunca se deveria ter formado. Não era considerada possível a formação de planetas gigantes a uma distância tão reduzida da estrela-mãe!

Nos últimos 10 anos foram descobertos mais de 160 planetas e à semelhança do planeta 51 Peg b, as descobertas causaram grande espanto e tumultuosas discussões na comunidade científica. Os astrónomos esperavam encontrar planetas como Júpiter em órbitas quase circulares e longe da sua estrela (de acordo com as teorias tradicionais) e encontraram toda uma variedade de mundos. Foram encontrados planetas com as mais diversas características. Alguns exoplanetas percorrem órbitas quase-circulares enquanto que outros têm trajectórias extremamente excêntricas, semelhantes à órbita de um cometa e as suas massas variam entre 7,5 vezes a massa da Terra e 10 vezes a massa de Júpiter!

Actualmente os nossos limites de detecção permitem aproximar-nos da detecção de planetas telúricos como a Terra. Para tal é necessário a utilização de detectores avançadíssimos como o HARPS, acoplado ao telescópio suíço de 3,6 m existente no observatório de La Silla, no Chile.

Estas descobertas levantaram e levantam ainda múltiplas questões. Como se formaram estes planetas? E como se formam os planetas gigantes de um modo geral?

As teorias aceites há 10 anos foram postas em causa pela introdução dos novos dados provenientes das observações. Temos que ter em conta que toda a informação que tínhamos era proveniente do estudo do Sistema Solar. Apenas dois meses após a descoberta do primeiro planeta surgiram as primeiras teorias explicativas para a existência de um planeta com propriedades tão bizarras.

Hoje, os resultados e conclusões mais recentes começam já a desvendar alguns dos mistérios. Por exemplo, a presença de planetas gigantes próximos das estrelas parece ficar a dever-se aos chamados processos de migração orbital. Um planeta, depois de formado nas regiões exteriores do disco, pode espiralar para mais perto, em consequência de interacções gravitacionais com o disco circum-estelar. Estes planetas são chamados de Júpiteres Quentes (''Hot Jupiters'') por terem massas comparáveis à de Júpiter e se encontrarem a uma distância da estrela-mãe que nos leva a estimar a sua temperatura superficial como compreendida entre os 700 e 1500ºK.

Por outro lado, a existência de planetas em órbitas excêntricas pode ficar a dever-se à interacção entre vários planetas formados ao mesmo tempo, processo que pode também conduzir à queda de alguns deles na estrela. As interacções gravitacionais entre planetas de massa elevada podem levar a que os parâmetros orbitais (período, semieixo maior da órbita, excentricidade) se alterem drasticamente. A natureza caótica deste género de interacções conduz aos mais variados resultados e à ''criação'' de sistemas planetários bastante exóticos em que os planetas pelas suas propriedades tomam o curioso nome de ''Jumping Jupiters''.


Observações realizadas no infravermelho revelam a presença de um disco em torno da estrela Fomalhaut. Esta estrela reúne condições que tornam a formação de planetas é bastante provável. Gentilmente cedido por: David A. Hardy, ROE, ATC, NSF, NASA
Mas nem todos os problemas parecem ainda ter uma resposta clara. O estudo de estrelas jovens mostrou-nos que estrelas com 10 milhões de anos já não possuem disco circum-estelar. Assim os planetas devem formar-se num período de tempo menor. Este foi o factor que levou a que a teoria de “core-accretion” (apresentada na semana anterior) fosse fortemente criticada. Os cálculos numéricos mostravam que a escala temporal que envolvia ultrapassava facilmente os 10 milhões de anos. Assim surgia uma nova teoria tendo como processo de formação dos planetas, a chamada ''disk-instability''. De acordo com esta, a própria gravidade do disco proto-planetário pode dar origem a instabilidades, criando zonas ligeiramente mais densas que o resto do disco. Estas regiões, podem, em determinados casos, desencadear um processo em cadeia em que vão juntando a si mais material e crescendo, dando origem a um planeta gigante. Estes modelos de ''disk-instability'' mostram-nos que a formação de um planeta pode, em certas condições, completar-se em menos de 10 000 anos! Esta é provavelmente a maior vantagem desta abordagem em que o planeta tem a formação ''in-situ''. Felizmente, os resultados mais recentes parecem mostrar que é possível formar um planeta pelo processo de ''core-accretion'' em apenas alguns milhões de anos, o que resolve o dilema. Além disso, descobriram-se fortes evidências que sugerem que os planetas gigantes descobertos possuem um núcleo sólido, algo que não seria possível no caso de um planeta formado pelo processo de ''disk-instability''.

Finalmente, a grande massa de alguns dos novos mundos coloca-os numa posição dúbia: serão planetas gigantes ou estrelas pequenas? Terão uma formação característica de um planeta, como as que apresentámos, ou serão o resultado de um sistema binário falhado? Neste caso o segundo corpo não teria agregado massa suficiente para iniciar a combustão do Hidrogénio. A própria definição de planeta está neste momento em grande discussão no mundo científico.