Princípios Fundamentais da detecção de Planetas



Gentilmente cedida por Gabi Perez (Instituto de Astrofísica de Canarias).
Desde a Grécia Antiga que a ideia da existência de planetas semelhantes ao nosso em sistemas longínquos povoa a imaginação do Homem. Epicuro (341-270 A.C.) foi dos atomistas que mais acerrimamente defendeu a existência de planetas extra-solares. Acreditava que existia um planeta em torno de cada estrela afirmando numa famosa carta a Heródoto que "Existe um número infinito de mundos semelhantes e diferentes deste nosso mundo (...)”.

Ao longo dos tempos muitos foram os defensores da existência de vários mundos, uma ideia que surge associada a uma descentralização do poder na Terra, no Sol e no Sistema Solar. O primeiro astrónomo a procurar realizar uma abordagem científica ao tema foi Christian Huygens (1629-1695) em 1698 com a publicação do livro "The Celestial Worlds Discovered: or, Conjectures Concerning the Inhabitants, Plants and Productions of the Worlds in the Planets". Nele discutia a possibilidade da existência de vida noutros planetas usando um raciocínio bastante semelhante ao usado pelos cientistas modernos. A maior parte das suas conjecturas refere-se à existência de vida nos planetas do Sistema Solar mas também considera a hipótese da existência de vida em planetas fora do nosso sistema planetário.

Para compreendermos as dificuldades e vitórias deste ramo da Astronomia é necessário ter presente alguns conceitos relativos à formação de estrelas e às Leis da Física que as regem.

As estrelas são formadas pela contracção de uma nuvem de gás e poeiras. Neste processo, por conservação do momento angular, forma-se em torno da proto-estrela (estrutura que evoluirá formando eventualmente uma estrela) um disco achatado de matéria. Com o decorrer do tempo, e por um processo que ainda suscita algum debate no seio da comunidade científica, os grãos de poeira do disco aglomeram-se, dando origem a corpos de maiores dimensões e maior massa. Nas regiões do disco mais afastadas da jovem estrela, a grande quantidade de gelos existentes permite que estes aglomerados cresçam em apenas algumas dezenas de milhões de anos. Quando um desses núcleos atinge uma massa suficiente (equivalente a cerca de 10 vezes a massa da Terra) começa a atrair e juntar gás à sua volta, formando um planeta gigante como Júpiter. É por um processo como este, denominado de "core-acrection" que se pensa que se terão formado os planetas gigantes do Sistema Solar.

É muito frequente encontrar discos em torno de estrelas jovens pelo que se pode esperar que a formação de planetas seja um processo comum. No entanto a sua detecção directa a grandes distâncias é muito difícil por duas razões:

  • a luz reflectida pelo planeta para a Terra é muito menor que a emitida pela estrela-mãe. A título de exemplo, Júpiter é mil milhões de vezes menos brilhante que o Sol.
  • a proximidade do planeta à estrela mãe não permite identificar os dois corpos como independentes. Este é o problema associado a uma propriedade dos telescópios denominada de "resolução". A "resolução" ou "poder resolvente" é uma medida da capacidade de distinguir dois objectos muito próximos no céu como entidades independentes. Se os dois objectos se encontrarem a um distância inferior à capacidade resolvente do telescópio, são identificados como uma só fonte.


A acção conjunta destes dois factores fez com que fosse impraticável detectar planetas pelos métodos mais directos. Assim, foram apontados vários métodos alternativos para a sua detecção.

Pelas leis da física sabemos que, do mesmo modo que a estrela atrai um planeta, o planeta também atrai a estrela. Ambos os corpos vão rodar em torno de um ponto denominado centro-de-massa do sistema. Este é basicamente um ponto médio (pesado consoante a massa dos dois corpos) mas que se encontra normalmente muito mais perto do centro da estrela que do centro do planeta. Assim acontece porque a massa da estrela é, frequentemente, várias ordens de grandeza maior que a do planeta. A título de exemplo, quando dizemos que os planetas no Sistema Solar orbitam em torno do Sol estamos a negligenciar o efeito da massa dos planetas para o cálculo do centro de massa do sistema.

Usando este princípio os astrónomos tentaram, durante muitos anos, detectar o movimento astrométrico periódico no céu de algumas estrelas próximas, o qual indicaria a presença de um corpo em órbita à sua volta.

O holandês Peter van de Kamp foi dos primeiros a estudar o movimento de oscilação de uma estrela em torno do seu centro de massa. A partir de 1938 e ao longo de mais de 4 décadas, analisou exaustivamente mais de 2000 placas fotográficas para caracterizar o movimento de uma única estrela no céu, a Estrela de Barnard. O seu estudo não foi, apesar de tudo, conclusivo, devido à dificuldade em estabelecer um grau de precisão tal que tornasse os dados dignos de confiança. Os resultados e conclusões a que chegou, em como haviam vários planetas a orbitar a Estrela de Barnard, foram bastante criticados pela comunidade científica. No final, chegou-se mesmo à triste conclusão de que os “planetas” detectados por van de Kamp não eram mais do que erros sistemáticos causados pelo instrumento que ele utilizara.

Assim os anos de busca terminaram em grande decepção pois mais uma vez a precisão obtida pelos telescópios não era suficiente para o estabelecimento de conclusões.

Então um grupo de astrónomos tentou uma abordagem diferente ao problema. Para tal usaram a oscilação da estrela de uma maneira engenhosa.


A variação do comprimento de onda da radiação emitida por uma estrela em torno da qual orbita um planeta permite-nos inferir a sua presença.
O movimento da estrela em torno do centro de massa estrela-planeta traduz-se igualmente por uma variação periódica na velocidade da estrela: umas vezes esta está a aproximar-se de nós e outras está a afastar-se, desde que a sua órbita não se encontre exactamente no plano do céu. Assim se formos capazes de medir a velocidade de uma estrela com uma grande precisão (da ordem de alguns metros por segundo) poderemos detectar o movimento desta, provocado pela eventual presença de um planeta. Tomando mais uma vez como exemplo o planeta mais de maior massa do Sistema Solar, Júpiter, este induz no Sol um movimento com uma amplitude da ordem de 13 m/s.

De acordo com o chamado Efeito de Doppler, se uma fonte de radiação electromagnética apresenta movimento radial em relação a dado observador (segundo a direcção definida pela linha de visão), então este recebe a radiação electromagnética como possuindo um comprimento de onda diferente do emitido pela fonte em repouso. Este efeito é quantificado pela fórmula:

Δ λ / λ = v r / c


em que Δ λ é a variação em comprimento de onda da radiação electromagnética de comprimento de onda &lambda emitida por uma fonte com velocidade radial vr. c é o valor da velocidade da luz no vácuo, 3x108 m/s.

As estrelas que oscilam em torno do centro de massa de modo a que ao longo da sua órbita apresentem movimento radial relativamente à Terra podem assim ser detectadas pelo efeito do seu movimento na luz da estrela recebida por nós! Foi exactamente esta técnica que permitiu detectar planetas extra-solares em torno de estrelas semelhantes ao Sol. Assim a 6 de Outubro de 1995, o Prof. Michel Mayor (Observatório de Genebra) anunciou a detecção do primeiro destes corpos, a orbitar a estrela 51 da constelação do Pégaso (51 Peg).

No entanto este planeta apresentava propriedades bastante peculiares...