Europa


Europa, o segundo dos quatro grandes satélites de Júpiter, é também o segundo local mais citado quando se menciona a possibilidade de vida extraterrestre no Sistema Solar, logo a seguir ao planeta Marte. Porquê? As pistas conduzem-nos ao suspeito habitual: a água.


Esta imagem, obtida por uma das Voyager, mostra a face "suja" de Europa, na qual o gelo se apresenta coberto por materiais que lhe dão um aspecto avermelhado. Crédito: NASA.
Europa é um satélite com as dimensões aproximadas da Lua terrestre. A sua densidade é também semelhante, mas ligeiramente inferior. De facto, o valor da densidade aponta para a presença, na composição deste mundo distante, de cerca de cinco por cento de água - que, naturalmente, se apresenta à superfície do satélite sob a forma de gelo. Este facto era já bem conhecido antes das passagens das sondas automáticas Pioneer e Voyager pelo sistema joviano, através de estudos conduzidos a partir da Terra.

A especulação sobre a presença de um oceano nesta lua de Júpiter tem já várias décadas. Tal como Io, também Europa se vê sob a acção da tremenda gravidade de Júpiter e das ressonâncias orbitais com os outros satélites, que provocam marés de grande amplitude. Está encontrada a fonte de energia que permite imaginar a presença de água líquida sob a capa de gelo, nesta lua praticamente sem atmosfera (ela existe de facto, mas é muito ténue). E neste oceano, alguns imaginaram uma verdadeira ecosfera, completa com uma cadeia alimentar complexa...

Mas onde está a evidência para esse novo oceano dos confins do Sistema Solar? Poderemos encontrar na face visível de Europa as provas da presença de água líquida no seu interior?


Como se torna claro nesta imagem (a de melhor resolução obtida pela sonda Galileo), a superfície de Europa é ocupada em grandes extensões por sucessões de cristas e vales que resultam das relações entre as fracturas da superfície e dos movimentos relativos dos blocos. Crédito: NASA.
As primeiras observações com algum detalhe da superfície gelada desta lua foram realizadas pelas Voyager. As melhores imagens tinham uma resolução de alguns quilómetros, e permitiram constatar a existência de alguns tipos de terreno distintos: as planícies, claras e brilhantes, onde impera o gelo quase puro, o terreno manchado, com uma composição mais diversificada (provavelmente devida à presença de sais depositados na superfície do gelo), e as grandes estruturas lineares, geralmente escuras, mas com dimensões e morfologias variadas, por vezes cruzando-se, o que dá indicações preciosas sobre as suas idades relativas. Duas outras descobertas muito interessantes foram a escassez de crateras de impacto de dimensões razoáveis, e a topografia muito suave, quase plana.


A região de Conamara Chaos é ideal para quem gosta de puzzles. Os blocos parecem encaixar-se com alguma facilidade, e as bandas podem ser reconstituídas. Crédito: NASA.
Com a chegada da Galileo ao sistema joviano, a superfície de Europa foi investigada com muito maior detalhe, em várias passagens próximas da sonda que se encontrava em órbita de Júpiter. Embora se tenha confirmado o pequeno número de crateras, o que denuncia uma superfície jovem, é difícil atribuir-lhe uma idade, já que a dinâmica do craterismo nesta zona do Sistema Solar ainda não é bem compreendida. Ao contrário de Io, onde a actividade geológica e a renovação da superfície foram testemunhadas à medida em que ocorriam, não se conseguiram imagens dos processos geológicos em acção em Europa (o facto de a antena principal da sonda não se encontrar em condições de funcionamento limitou fortemente o número de imagens obtidas).

Porém, as estruturas existentes na superfície de Europa contam uma história complexa. De facto, encontrar uma zona verdadeiramente plana na face deste satélite é difícil, já que aquilo que, a baixa resolução, parecia liso como uma bola de bilhar, se revelou na realidade uma justaposição de cristas e vales delimitados por fracturas. Além disso, existem regiões que são conhecidas como zonas caóticas e que fazem lembrar o aspecto de um mar gelado, tal e qual a recente descoberta em Marte. Estas regiões são geralmente apresentadas como locais de actividade mais recente, devida à subida de material quente do interior.

Entre as estruturas lineares, fracturas, faixas e bandas de material escuro, sobressaem outras, de aspecto brilhante, tipicamente curvas e encadeadas, que receberam a designação de ciclóides. Para muitos autores estas fracturas são a tradução superficial das poderosas marés que afectam este corpo planetário, propagando-se pela sua face a uma velocidade que poderia ser acompanhada por um homem a caminhar e à medida que Europa evolui em torno de Júpiter.

Uma prova indirecta da presença de um oceano em Europa veio da descoberta que o satélite possui um campo magnético. As características deste variam ao longo da órbita, o que leva a maior parte dos cientistas planetários a considerar que a sua origem está relacionada com o magnetismo de Júpiter e próxima da superfície de Europa; e o candidato mais provável é mesmo uma grande massa de água líquida, salgada e portanto condutora, respondendo à magnetosfera do gigante gasoso próximo.


Estas fracturas em arco, com o seu aspecto cíclico, parecem dever-se às marés que afectam Europa. Crédito: NASA.
Uma outra indicação tem a ver com outra descoberta, no mínimo curiosa: a superfície de Europa não possui uma rotação síncrona. Embora o processo seja muito lento, da ordem dos milhares de anos, a verdade é que o satélite não mostra sempre a mesma face a Júpiter. Isso só se pode explicar pela presença, sob a superfície gelada, de um oceano global, responsável pelo desligamento da superfície em relação à maior parte do volume da lua, rochoso e, esse sim, em rotação síncrona.

As incógnitas sobre este oceano são, porém, ainda muito grandes. A que profundidade se encontra sob o gelo? Qual a sua química? Poderão existir nas suas profundezas processos semelhantes aos que ocorrem nas cristas oceânicas na Terra? E, claro, a maior das perguntas: albergará este oceano alguma forma de vida? Um dia talvez venhamos a saber as respostas, mas esse dia está ainda vários anos no futuro...