Das horas nacionais ao Tempo Universal



O relógio da estação da estrada de ferro.
Na Europa continental, como as redes ferroviárias se interligavam entre si, o sistema de hora era muito confuso. As companhias férreas utilizavam diversos sistemas: na Holanda, os relógios das gares marcavam a hora de Amsterdã; na Alemanha, utilizavam-se cinco horas (Berlim, Munique, Stuttgart, Karlsruhe e Ludwigshafen), se bem que o pessoal técnico das ferrovias usasse a hora de Berlim.

As necessidades práticas, finalmente, fizeram com que cada Estado utilizasse uma hora única para todo seu território, em geral a do seu principal observatório. Desde 14 de Março de 1891, a hora legal na França era a do tempo médio de Paris. Na Alemanha, um discurso do político e militar prussiano Helmuth Karl Bernhard von Moltke (1800-1891), no Parlamento, em 16 de Março de 1891, fez com que se adotasse uma única hora em lugar das cinco.

Assim, por imposição das estradas de ferro surgiram as horas nacionais.

A adoção das horas nacionais, se bem que resolvesse os problemas das vias férreas, foi uma simplificação que deixou subsistir uma série de anomalias. Assim, nos bordos do lago de Constança, que banha cinco países, contavam-se cinco diferentes horas oficiais ou nacionais: Suíça, Grande-Ducado de Bade, Wurtemberg, Baviera e Áustria. É muito fácil imaginar as confusões entre o horário dos barcos e os das estradas de ferro. Uma outra confusão advinha desse sistema: a situação anacrônica dos países com grande extensão territorial no sentido leste-oeste, como Rússia e Estados Unidos.

Necessidade da padronização

O primeiro homem nos EUA com senso da necessidade de uma padronização no sistema horário foi o astrônomo amador William Lambert (1779-1851), que em 15 de Dezembro de 1809 apresentou no Congresso um memorial para que fosse estabelecido um sistema de fusos horários no seu país. A idéia não foi aceita. Apesar de amador, a sua visão do futuro teria que esperar mais 60 anos.

Com o desenvolvimento da navegação e a instalação dos cabos submarinos, ligando os continentes através dos telégrafos, na segunda metade do século XIX, a necessidade de uma unificação das horas nacionais em escala mundial tornou-se uma imposição.

De fato, em 1866, um cabo transatlântico ligando a Irlanda à Terra Nova foi lançado ao mar com sucesso pelo Great Eastern, o maior navio da época. Uma das primeiras aplicações desses cabos submarinos transatlânticos foi transmitir sinais horários entre os observatórios de Greenwich e de Harvard, naquele mesmo ano.

Atingiu-se assim outro lado do Atlântico, onde a ausência de sistema uniformizado se agravava à medida que a rede ferroviária se expandia: um viajante que saísse de Portland para Nova Iorque encontraria em sua viagem quatro tipos de tempo.

A solução do sistema dos fusos horários até hoje em uso foi sugerida, em 1870 numa brochura publicada pelo educador Charles Dowd (1825-1904), professor de Saratoga Springs, em Nova Iorque. Tratava-se de um sistema que dividia o globo terrestre em zonas de 15 graus de longitude desde o meridiano de Washington. Dois anos mais tarde, mais precisamente em 1872, Dowd reviu a sua proposta. Mais tarde essa idéia, aprovada pelo matemático astrônomo norte-americano Benjamin Pierce (1809-1880), pela Sociedade Meteorológica Americana etc., foi desenvolvida pelo engenheiro civil e ferroviário Sandford Fleming (1827-1915), funcionário das estradas de ferro do Canadá, que, como os EUA, tanto sofria pela sua extensão no sentido das longitudes, ou seja, no sentido leste-oeste, razão pela qual não podia se conformar com uma hora nacional única. Depois de 11 anos da proposição da idéia, em 18 de Novembro de l883, a rede ferroviária dos EUA e do Canadá já estava normalizada em cinco fusos espaçados de 15º, tendo cada um a mesma hora do seu meridiano central. Tal sistema de fusos horários americanos substituiu as 75 horas locais que existiam antes. Com efeito, antes dessa padronização do tempo em time zones (zonas do tempo, expressão inglesa usada para fusos horários), usava-se o tempo local e a maioria das pequenas e grandes cidades usavam uma forma local de tempo solar, mantida pelos bem conhecidos relógios das torres das igrejas.

O novo sistema de tempo padrão não foi aceite por todos. Um exemplo dessa resistência foi a cidade de Detroit que conservou o seu tempo local até 1900, quando o conselho da cidade decretou que os relógios deveriam ser corrigidos de 28 minutos. Metade da cidade obedeceu e a outra metade recusou. Após um considerável debate a decisão foi anulada e a cidade voltou ao tempo solar. Em 1905, o tempo padronizado foi adotado pelo plebiscito popular.

Este sistema consistia em escolher, sobre um mapa da Terra, um meridiano zero, considerado como o meridiano de origem. De um lado e de outro, traçavam-se os meridianos que eram distantes de 7° 30'. Cada um destes, compreendia sobre a superfície do globo um segmento esférico de 15° centrado sobre meridiano zero. Assim, constituindo este primeiro fuso do globo terrestre, constituía o primeiro fuso horário.

Coube a Fleming instigar os esforços que conduziram a adoção da zona de tempo no Canadá e nos EUA, e, em conseqüência, o sistema começou a ser usado nas rodovias a partir de 1883 para padronizar os seus horários. Além do mais Fleming advogou a adoção de um tempo médio e de uma variação horária de acordo com as zonas de tempo. Foi o principal incentivador para que a International Meridian Conference fosse organizada.

Aliás, desde de Novembro de 1883, nos EUA, o uso dos fusos horários aumentou gradualmente, tendo em vista as vantagens que trazia para os usuários dos modernos meios de comunicação e transporte.

O problema da coordenação do tempo e das longitudes já havia sido discutido em sete conferências realizadas na Europa entre 1871 e 1883.