Os segredos revelados pela Stardust

2006-12-22

Pormenor de partículas da amostra de poeira do cometa Wild 2, trazida para a Terra pela missão Stardust. Crédito: NASA.
Há onze meses, a missão Stardust (NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
) regressou à Terra trazendo as primeiras amostras de um cometa
cometa
Os cometas são pequenos corpos irregulares, compostos por gelos (de água e outros) e poeiras. Os cometas têm órbitas de grande excentricidade à volta do Sol. As estruturas mais importantes dos cometas são o núcleo, a cabeleira e as caudas.
recolhidas no espaço (ver notícia de 19/01/2006 e de 13/01/2006). Desde essa altura, quase 200 investigadores de todo o mundo estudam os minúsculos grãos à procura de pistas sobre a história física e química do nosso Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
. Ainda são necessários muitos anos de trabalho para decifrar os segredos do cometa Wild 2, mas alguns resultados preliminares já foram publicados, num conjunto de 7 artigos que aparecem na edição de 15 de Dezembro da revista científica Science.

O objectivo geral é responder às grandes questões sobre a natureza das amostras do cometa, incluindo a determinação das estruturas minerais, a composição química, e a química dos compostos orgânicos.

Os cientistas têm admitido que os cometas se formaram no início da formação do Sistema Solar, na região mais exterior e fria, e por isso consistem essencialmente do material primitivo, formado a temperaturas frias. Segundo esta hipótese, os cometas não sofreram influência da região mais interna e quente do Sistema Solar, onde a temperatura tornou-se muito elevada e onde se formou o Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
e os planetas terrestres
planeta terrestre
Designa-se por planeta terrestre um planeta com densidade e tamanho comparável ao da Terra. No Sistema Solar são considerados planetas terrestres (ou telúricos) Mercúrio, Vénus, Terra, Marte e Plutão, e ainda se incluem os satélites naturais como a Lua, os satélites galileanos de Júpiter, Titã e Tritão, por exemplo.
.

Segundo o registo contido nos grãos recolhidos pela Stardust, este quadro está apenas 90% correcto. Os rácios de certos isótopos
isótopo
Chamam-se isótopos aos átomos cujos núcleos têm o mesmo número de protões (por isso, são o mesmo elemento químico), mas têm um número diferente de neutrões. O número atómico dos isótopos é igual, mas o número de massa é diferente.
sugerem que até 10% do material formou-se no interior da nebulosa solar
nebulosa Solar
A nebulosa Solar é a nuvem de gás e poeira a partir da qual o nosso Sistema Solar se formou.
, a temperaturas elevadas, e foi transportado para a região mais exterior e fria, onde o cometa se formou. A pista mais forte para esta conclusão vem dos rácios dos isótopos de oxigénio, que se assemelham aos que se encontram nos meteoritos
meteorito
Um meteorito é um corpo sólido que entra na atmosfera da Terra (ou de outro planeta), sendo suficientemente grande para não ser totalmente destruído pela fricção com as partículas da atmosfera, e assim atingir o solo. Os meteoritos dividem-se em três categorias, segundo a sua composição: aerolitos (rochosos), sideritos (ferro) e siderolitos (ferro e rochas).
que se formaram no interior do Sistema Solar.

Por outro lado, as medições de hidrogénio e azoto dizem-nos que a presença de isótopos mais pesados - o deutério
deutério (D)
O deutério, também chamado de hidrogénio pesado, é o isótopo do hidrogénio com número de massa igual a dois (2H), cujo núcleo é constituído por um protão e um neutrão.
e o azoto 15 - são uma forte indicação de que a poeira do cometa já existia antes do Sol se formar.

As estruturas das moléculas
molécula
Uma molécula é a unidade mais pequena de um composto químico, sendo constituída por um ou mais átomos, ligados entre si pelas interacções dos seus electrões.
orgânicas contam-nos a mesma história. O material orgânico do cometa é muito diferente do que se conhece de outras fontes de material extraterrestre (meteoritos, poeira interstelar
poeira interestelar
A poeira interestelar é constituído por minúsculas partículas sólidas, com diâmetros da ordem dos mícrones, existentes no meio interestelar.
), mas algumas semelhanças importantes dizem-nos que não é material totalmente estranho ao nosso Sistema Solar.

As amostras contêm muito poucas estruturas aromáticas de carbono, que são comuns na Terra e nos meteoritos. Por sua vez, encontram-se muitas estruturas frágeis de carbono, que não teriam sobrevivido às condições mais duras na nebulosa
nebulosa
Uma nebulosa é uma nuvem de gás e poeira interestelares.
solar. Estas moléculas também contêm mais oxigénio e azoto que nos meteoritos e existem em formas que nunca se viram em meteoritos.

Várias análises indicam a presença de PAHs - hidrocarbonetos aromáticos policíclicos comuns no espaço interstelar (e na Terra). Certas variedades de PAHs contêm oxigénio e azoto. Alguns cientistas acreditam que estas variantes também existem no espaço interstelar, mas há ainda muito para descobrir sobre este assunto. Apesar de algum material orgânico do cometa se assemelhar à orgânica estável que se encontra nos meteoritos, encontraram-se compostos muito voláteis, incluindo álcools.

O estudo da mineralogia revelou uma grande variedade na composição e tamanho das partículas da amostra trazida pela Stardust, encontrou minerais de alta temperatura e minerais de baixa temperatura, e uma grande diversidade de densidade
densidade
Em Astrofísica, densidade é o mesmo que massa volúmica: é a massa por unidade de volume.
de partículas. Tudo indica que partes do material do cometa formaram-se em condições diferentes, provavelmente em locais diferentes. Por exemplo, os minerais de alta temperatura devem ter sido ejectados da região interna do Sistema Solar para a região mais exterior e fria, onde o cometa se formou.

A natureza da poeira dos cometas é ainda um grande enigma. Os estudos preliminares indicam que se trata de uma mistura de partículas que claramente se formaram em locais diferentes, talvez em alturas diferentes, e certamente em condições muito distintas.

Fonte da notícia: http://www.nasa.gov/centers/ames/research/2006/stardust_feature.html