A missão Cassini: expectativas
O satélite Dione observado sobre o disco de Saturno. É facilmente visível uma variação de brilho ao longo da superfície desta lua gelada. A imagem foi obtida pela Cassini através de um filtro ultravioleta. Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute.
Pode-se fazer a pergunta: mas porquê não enviar uma sonda também para a atmosfera de Saturno? Afinal as sondas que fazem medições in loco dão resultados muito mais interessantes e com muito melhor precisão! A resposta é: Sim, de facto, as medições in loco são extremamente interessantes e permitem medir os parâmetros com uma precisão sem precedentes. No entanto, também têm uma desvantagem. Além de serem muito complexas, caras e de alto risco, são pontuais, tanto no tempo como no espaço. No caso da Huygens, esta mediu os parâmetros da atmosfera de Titã ao longo da trajectória da sua descida que durou umas duas horas e meia. Não se partiu quando aterrou e trabalhou durante mais de uma hora. Depois, terminou. Agora já está congelada a -180 graus Célsius. Talvez uma dia possamos ir lá e recupera-la!
A mesma coisa aconteceu com a sonda que entrou na atmosfera de Júpiter em 7 de Dezembro de 1995. Efectuou medições durante um pouco mais de uma hora e depois perdeu o contacto com a Galileo. Mais tarde apercebe-mo-nos que essa sonda tinha entrado numa zona completamente atípica do planeta e continuamos a não saber bem como é que é o Júpiter típico. Parece que o que a Huygens viu é bastante característico para Titã.
Estas missões in loco são importantes, mas só se fizerem parte de um contexto maior em que temos um projecto de observação remota, a Cassini por exemplo! A Cassini irá passar várias dezenas de vezes perto de Titã nos próximos 4 anos e recolherá uma enorme quantidade de dados. Assim podemos estudar os processos na atmosfera, a sua evolução no tempo e na localização no planeta. Assim, a combinação das análises dos dados de observação remota da Cassini e de medições in loco da Huygens vão-nos permitir um grande avanço no nosso entendimento sobre este satélite de Saturno.
As observações in loco e remotas são portanto complementares.
A atmosfera de Saturno parece ser menos espectacular do que a atmosfera de Júpiter. Mas esta imagem, processada para aumentar o contraste, sugere que processos semelhantes ocorrem nos dois maiores planetas do Sistema Solar. Esta imagem foi obtida num comprimento de onda fortemente absorvido pelo metano, mostrando estruturas situadas na alta atmosfera de Saturno. Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute.
A Cassini está equipada com doze instrumentos científicos que estão a observar o planeta em todos os comprimentos de onda, do ultravioleta até ao infravermelho longínquo e rádio. Pode consultar mais informação sobre os instrumentos no site da NASA dedicado à Cassini.
A luz visível traz informações sobre as nuvens, as partículas e brumas na atmosfera de Saturno. Podemos estudar, em especial, como eles reflectem e difundem a luz do Sol sobre diferentes ângulos de observação. Essa informação dá-nos informação sobre a forma física das partículas, se são redondas (não o são) ou quadrados (também não o são!) ou irregulares(mais provável). Essa informação ensina-nos sobre como e onde estas partículas se podem ter formado na atmosfera.
Além disso, as fotografias no visível e ultravioleta mostram-nos as nuvens e podemos estudar a dinâmica da atmosfera de Saturno.
Mais para o lado infravermelho, nos comprimentos de onda em que o olho já não tem sensibilidade, as moléculas que consistem a atmosfera de Saturno deixam os seus traços no espectro. Podemos estudar a sua quantidade e variabilidade sobre a superfície. Esta última pode ser causada por processos de condensação, no caso da água ou amónio por exemplo, processos fotoquímicos e devido à dinâmica da atmosfera. A parte infravemelha do espectro também traz informação sobre o perfil da temperatura na atmosfera, pelo menos até uma certa profundidade. No entanto essa profundidade não é muito grande.
Este é um primeiro resultado obtidos com dados do instrumento CIRS (Composite InfraRed Spectrometer) sobre a temperatura e intensidade dos ventos na alta atmosfera de Saturno. Crédito: NASA/JPL/GSFC.
Mais informação sobre o perfil térmico na atmosfera é obtido através das experiências de ocultação rádio. Nesta experiência a antena da Cassini, feita pela Agência Espacial Italiana, é apontada para a Terra, enquanto a nave passa por trás do planeta. Nos momentos em que começa a desaparecer, as ondas rádio passam através de cada vez mais atmosfera até o sinal ficar tão fraco que já não se detecta, pois a atmosfera acaba por absorver os sinais rádio. Da maneira como decresce a intensidade do sinal, podemos inferir, entre outros parâmetros, a temperatura da atmosfera a diferentes profundidades.
A órbita da Cassini começou por ser equatorial. Durante o decorrer da missão, gradualmente vai aumentando a sua inclinação. Assim seremos capazes de cada vez ver melhor os pólos do planeta, zonas que nunca se puderam estudar em pormenor.
No fim da sua missão, se correr tudo bem, a missão poderá ser prolongada. Existem muitas possibilidades para o prolongamento da missão, algumas envolvendo algum risco. Por exemplo, deixar a Cassini passar pela separação nos anéis (a divisão de Cassini) ou fazer umas passagens muito perto de um dos satélites, por exemplo Titã ou outro. Ou então deixar a Cassini entrar na atmosfera de Saturno, como foi feito com a Galileo.
Estas decisões dependerão muito dos resultados obtidos da análise dos dados da Cassini e das perguntas que ainda restarão e que surgirão entretanto.
Uma coisa é certa. Não tendo os problemas de comunicação de uma antena defeituosa, como tinha a Galileo, a Cassini já produziu uma enorme quantidade de dados e a missão apenas começou. Vai-se ter de utilizar métodos de estatística para os analisar. Muito trabalho terão os cientistas para frente e ainda bem!
Para aprender mais sobre a Cassini e a Huygens, pode consultar: