Figura 1. Andreas Cellarius, Harmonia Macrocosmica, Amsterdam, 1660. O modelo geocêntrico de Ptolomeu.
A natureza dá-nos três ciclos primários: os dias como rotação da Terra em torno de si própria, os meses como revoluções da Lua à volta da Terra, os anos como revoluções da Terra em volta do Sol. A existência de dois solstícios e dois equinócios leva ainda à divisão do ano em quatro períodos iguais, as estações do ano. A existência de tais ciclos aliada ao movimento aparente dos céus sempre intrigou e interessou o Homem.

O movimento da Lua e a explicação para as suas fases foram muito cedo compreendidos (cf. figura na página anterior). Quanto ao movimento do Sol, pelo contrário, vários foram os modelos apresentados por astrólogos, filósofos e teólogos ao longo da história para o representar.

Aristarco de Samos (310-230 a. C.), astrónomo e matemático grego, foi o primeiro a afirmar que a Terra gira em torno do Sol ao mesmo tempo que gira em torno de si mesma. No entanto, o sistema geocêntrico proposto por Ptolomeu (c. 85- c. 160 d.C.), também astrónomo e matemático grego, foi adoptado pela religião e pela filosofia, dominou durante toda a Idade Média e só foi deposto no Séc. XVI com Nicolau Copérnico (1473-1543), Galileu Galilei (1564-1642), Giordano Bruno (1548-1600) e Johannes Kepler (1571-1630).

Debaxo deste grande firmamento
Vês o ceo de Saturno, Deos antigo;
Jupiter logo faz o movimento,
E Marte abaxo, bellico inimigo;
O claro olho do ceo no quarto assento,
E Venus, que os amores traz consigo;
Mercurio, de eloquencia soberana;
Com tres rostos debaxo vai Diana.
Os Lusíadas, Canto Décimo, 89, Camões (c. de 1524-1580).
A deusa Tétis mostra o universo a Vasco da Gama. O modelo descrito é o de Ptolomeu, visto de fora para dentro.

Figura 2. Michelangelo Cactani, La Materia della Divina Comedia di Dante Aliguieri, 1855. Na Divina Comédia de Dante (1265-1321), o Inferno encontra-se no interior da Terra. A alma, no seu caminho para Deus, deve subir através do Purgatório, das nove esferas dos planetas, das estrelas e da esfera de cristal, até chegar ao Paraíso.
No modelo geocêntrico de Ptolomeu, a Terra estava situada no centro do Universo e os astros giravam em torno dela, em movimento circular, presos a esferas transparentes de centro na Terra. Estas esferas etéreas de Ptolomeu, que na Idade Média se julgava serem feitas de cristal, são a razão por que ainda falamos na música das esferas e no sétimo céu. Existiam uma esfera ou céu para a Lua, outras para Mercúrio, para Vénus, para o Sol, para Marte, para Júpiter e para Saturno. A esfera mais excêntrica era a das estrelas, chamada "Primum Mobile" (a primeira que se move) porque, impelida pelo amor divino, era ela a origem do movimento de todas as outras esferas.

O modelo geocêntrico tornou-se muito popular. Foi adoptado pela religião cristã e publicitado por teólogos, filósofos, escritores e muitas foram as fantasias criadas a partir dele.

Apoiado pela Igreja durante toda a Idade Média, o modelo de Ptolomeu impediu o progresso da astronomia durante mais de um milénio. Somente em 1543, 1800 anos depois de Aristarco, o Sol voltou ao centro do universo. Nicolau Copérnico, um clérigo polaco, publicou uma nova hipótese explicativa do movimento aparente dos planetas: no centro do universo passava a estar o Sol, enquanto a Terra passava a ser apenas mais um dos planetas, o terceiro a contar do Sol, movendo-se numa órbita circular. Copérnico apresentou esta teoria na sua obra De Revolutionibus Orbium Coelestium em 1543, o ano da sua morte. Anos mais tarde, Galileu e Bruno viriam a ter graves problemas com a Inquisição precisamente por também adoptarem este modelo heliocêntrico.





Figura 3. Athanasius Kircher, Iter extaticum, Roma, 1671.

I: O sistema de Ptolomeu (c.85-160 d. C.) com a Terra no centro, cercada pelas sete esferas etéreas da Lua, Mercúrio, Vénus, Sol, Marte, Júpiter e Saturno. No plano superior fica a superfície imóvel das estrelas e dos signos do Zodíaco.
II: Platão (427-374 a. C.) colocava o Sol imediatamente a seguir à Lua.
III: No sistema pseudo-egípcio de Vitruvius, Mercúrio e Vénus descreviam um círculo à volta do Sol e este, por sua vez, tal como os restantes planetas, girava em torno da Terra.
IV+V: O sistema proposto em 1580 por Tycho Brahe (1546-1601) parte de dois centros: à volta da Terra, vista como um centro fixo, gira o Sol que por seu turno é o centro de outros planetas.
VI: Em 1543, 1800 anos após Aristarco, Copérnico (1473-1543) voltou a colocar o Sol no centro do universo [3].