Tudo se passa a propósito da estrela HD 103095 (a nº 1830 do catálogo de Groombrigde), pertencente à constelação da Ursa Maior, em que a distância determinada por diferentes observadores variava entre 0.4 parsec e 36 parsec*. Isto mesmo pode ser constatado num artigo publicado por M. Otto von Struve em 1850.
Otto van Struve, filho de William Struve - Director do Observatório de Pulkovo -, era um dos interessados nesta controvérsia e responsável pela medição do valor da mais elevado distância.
Um dos outros interessados o astrónomo M. Faye, membro da Academia de Ciências de Paris e autor do valor mais curto para a distância, propôs a 11 de Fevereiro de 1850 que a estrela fosse observada em Lisboa "o único local em todo o continente europeu em que a luneta zenital [inventada pelo próprio M. Faye] pode encontrar a maravilhosa estrela (...)". De facto a referida estrela, no seu movimento aparente fruto da rotação da Terra, passava próximo do Zénite de Lisboa **. Este proposta foi apresentada à Câmara dos Pares por D. Francisco de Almeida Portugal, diplomata e 2º Conde do Lavradio, em 26 de Março de 1850 segundo o qual "seria vergonhoso que elas [as observações] não fossem feitas por astrónomos portugueses, quanto mais que se tal acontecesse podia dar-se como certo que haviam de vir a Lisboa astrónomos de todos os países, franceses, ingleses e russos."
Na altura o Real Observatório da Marinha, criado a 18 de Março de 1798, seria potencialmente a instituição incumbida de realizar essas observações. No entanto com a partida de D. João VI para o Brasil, em 1807, os melhores instrumentos acompanharam família real e o Observatório da Marinha iniciou um período de decadência. Para além disso, o posicionamento do Observatório, quase ao nível das águas do Tejo, não podia garantir as observações de qualidade necessária. Assim parecia óbvia a necessidade da construção de um novo Observatório.
Depois de vários procedimentos, entre eles a constituição de várias comissões e discussão sobre o melhor local, cujos detalhes podem consultados no artigo de A. P. Botelheiro já citado, foi lançada a primeira pedra de um novo Observatório a 11 de Março de 1861. As obras estenderam-se por vários anos com a instalação sucessivas de diferentes instrumentos.
São enúmeros os trabalhos emanados do Observatório Astronómico de Lisboa no final do séc. XIX inícios do séc XX, e alguns deles publicados nas revistas da especialidade como o Monthly Notices of the Royal Astronomy Society e no The Observatory. A sua qualidade era então olhada com respeito. Rudolfo Guimarães (1909) cita uma carta de M. Turner, Director do Observatório da Universidade de Oxford, a Campos Rodrigues, datada de 21 de Julho de 1904, onde o primeiro se refere ao trabalho do segundo como sendo "(...) some of the best work ever done".
Criação do Observatório Astronómico de Lisboa fica indubitavelmente ligado a um período de franco desenvolvimento científico cuja amplitude é proporcional às dificuldades que houve que suplantar para o seu estabelecimento. Folque, Oom e Campos Rodrigues merecem assim figurar na montra dos nomes grandes da Ciência deste País.
* O satélite HIPPARCOS da Agência Espacial Europeia, que determinou as distâncias a milhões de estrelas entre 1989 e 1993, encontrou 9 parsec para esta estrela.
** Procuramos, mas sem exito, traços da (eventual) observação da estrela Groombrigde 1830 feitos em Lisboa. Será que alguma vez chegou a ser feita ? |