O Céu dos Homens do Mar na Época das Descobertas



Astrolábio usado para calcular as posições dos astros no céu.
“Água é vida”. Este lugar-comum, repetido vezes sem conta, é pleno de significado. Foi no mar que teve origem a vida na Terra, podendo-se afirmar que em última análise todos os entes vivos têm antepassados remotos que viveram na água. Todos os seres vivos necessitam de água para sobreviver. As grandes civilizações da Antiguidade desenvolveram-se junto de grandes rios que irrigavam e fertilizavam os campos onde se praticava a agricultura.
Sendo a água tão importante para a Humanidade não é de estranhar que desde tempos imemoriais os espaços aquáticos tenham sido usados como vias de comunicação. Para conduzir as embarcações torna-se necessário dispor de marcas que permitam conhecer a posição. Durante séculos a navegação era feita essencialmente com terra à vista, de modo a ser sempre conhecida a posição do navio.
Embora as viagens fossem geralmente à vista de terra, acontecia muitas vezes que os navios se afastavam, pelos mais diversos motivos, perdendo então essas referências que lhes forneciam informações sobre onde se encontravam e para onde se poderiam dirigir. Perdidos esses sinais de terra firme, esses homens socorriam-se então de outros sinais: características dos ventos, cor das águas, plantas aquáticas, etc. Além destes sinais, existem umas marcas no céu, os astros, que podem ser usadas para fornecer diversas informações a quem conheça o seu comportamento. Neste texto tentar-se-á mostrar que informações os astros podem fornecer aos navegantes.
Até à Idade Média, a bússola era desconhecida. Com a difusão, junto dos marinheiros, deste instrumento passou a ser possível aumentar cada vez mais as distâncias percorridas no mar e os tempos de navegação sem terra à vista, uma vez que passou a existir uma maneira de saber a direcção em que os navios se dirigiam. Os pilotos passaram a saber a sua posição no mar, observando simplesmente as direcções em que o navio tinha navegado e estimando as distâncias percorridas, desde a última posição que tinham observado junto à costa. Este método de navegação ficou conhecido, entre os historiadores da Náutica, pelo nome de método de rumo e estima.
No entanto, conforme as distâncias percorridas, sem avistar terra, se tornavam cada vez maiores, os erros acumulados no percurso cresciam, devido a vários factores: correntes, irregularidades dos instrumentos, avaliação incorrecta das distâncias percorridas...
Tornou-se então necessário “descobrir” novas formas de conhecer a posição dos navios, no alto-mar, com um maior rigor. A solução passou pelo uso de astros, em determinadas condições, para conhecer as coordenadas geográficas do local em que o navegante se encontrava. Os portugueses foram pioneiros no desenvolvimento de processos para conhecimento de uma das coordenadas geográficas: a latitude. Quanto à longitude, a sua determinação é bastante mais complexa, aparecendo soluções práticas para este problema apenas no século XVIII, sendo os Ingleses pioneiros neste processo.
Por outro lado, era também possível, pelo menos desde a Idade Média, conhecer as horas, durante a noite, pela observação do movimento da Estrela Polar. Foram desenvolvidos diversos instrumentos, e tabelas, que permitiam, em função da época do ano, saber as horas pela posição relativa da Estrela Polar e de outra estrela da Ursa Menor, a Kochab.

Ao longo das próximas semanas vamos apresentar os seguintes temas:


Autoria:

António Canas
Subdirector do Planetário Calouste Gulbenkian

Bibliografia

ALBUQUERQUE, Luís de, Introdução à História dos Descobrimentos Portugueses. 4ª ed., Mem Martins, Publicações Europa‑América, 1989.
COSTA, Abel Fontoura da, A Marinharia dos Descobrimentos, 4ª ed., Lisboa, Edições Culturais de Marinha, 1983. MIRANDA, Alberto Pereira de, “A determinação das horas nocturnas na Península Ibérica a partir do século XIII”, Anais do Clube Militar Naval, vol. CXXI, Julho-Setembro 1991, pp. 525-552.