A origem do metano na atmosfera de Titã

2006-03-03

Em cima: a alta atmosfera de Titã, onde as moléculas de metano são destruídas pela luz ultravioleta. A Cassini obteve várias exposições com os filtros vermelho, verde e azul, que, combinadas, criam esta fotografia de cor natural. Crédito: NASA/JPL/Space Science Institute. Em baixo: detalhe da superfície de Titã, onde se vêem estruturas que parecem canais de rios. Mosaico de três imagens obtidas pela Huygens. Crédito: ESA/NASA/JPL/University of Arizona.
Titã, o maior satélite de Saturno
Saturno
Saturno é o sexto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 10 vezes o da Terra, é o segundo maior planeta do Sistema Solar. A sua característica mais marcante são os belos anéis que o rodeiam.
, tem uma atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
rica em azoto que contém até 5% de metano (perto da superfície). Sabe-se que a fotoquímica na estratosfera, através de reacções químicas induzidas pela luz, consegue remover o metano que se encontra na atmosfera de Titã numa escala de tempo de algumas dezenas de milhões de anos. Como o metano permanece na atmosfera de Titã até hoje, em quantidade significativa, é porque existe uma fonte de metano que reabastece a atmosfera.

Antes da missão da Cassini-Huygens
Cassini-Huygens (NASA/ESA)
A missão Cassini-Huygens é uma missão conjunta da NASA e da ESA dedicada a Saturno que foi lançada no dia 13 de Outubro de 1997. Esta missão é composta por duas sondas: a sonda Cassini cujo objectivo principal é o estudo de Saturno, da sua atmosfera e do seu campo magnético, e a sonda Huygens cujo objectivo é o estudo da atmosfera do maior satélite de Saturno, Titã. O ponto alto desta missão será sem dúvida o pouso da sonda Huygens na superfície de Titã.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
) ter chegado a Saturno, o melhor candidato a fonte de metano era a existência de mares de hidrocarbonetos líquidos, com centenas de metros de profundidade, a servirem de reservatório de metano para a atmosfera.

As observações de Titã realizadas pela Cassini, a partir do espaço, e pela Huygens, que pousou na sua superfície em Janeiro do ano passado (ver notícia de 17/01/2005) mostraram que afinal não há uma grande quantidade de metano líquido na superfície do satélite, eliminando assim a hipótese da presença de corpos extensos de hidrocarbonetos líquidos. Os investigadores começaram então a procurar outros candidatos a fonte de metano da atmosfera.

Uma equipa de investigadores, liderada por G. Tobie e contando com colaboradores da Universidade de Nantes (França) e da Universidade do Arizona (EUA), baseou-se nos dados da Cassini-Huygens para desenvolver um modelo de evolução para Titã.

Num recente estudo publicado na revista Nature de 2 de Março, esta equipa defende que a melhor explicação para o metano presente na atmosfera de Titã é a libertação episódica de metano guardado em hidratos de gás, chamados clatratos, numa camada de gelo acima de um oceano de água enriquecida em amónia.

O metano terá sido libertado para a atmosfera durante três episódios. O primeiro ocorreu logo a seguir ao período de acreção
acreção
Designa-se por acreção a acumulação de matéria (gás e poeira) para um astro central, como por exemplo um buraco negro, uma estrela, uma galáxia, ou um planeta.
e diferenciação (separação do manto-crosta) do satélite. A maior parte do metano terá sido reabsorvido para o interior de Titã, e o pouco que ficou na atmosfera terá sido destruído pela fotoquímica am mil milhões de anos.

O segundo episódio, há cerca de 2000 milhões de anos, deveu-se ao início da convexão no núcleo de silicato de Titã. O núcleo rochoso continuou a aquecer, pois contém elementos radioactivos naturais, como urânio, potássio e tório, até que se torna suficientemente mole
mole (mol)
A mole (mol) é a unidade fundamental SI de quantidade de matéria e é equivalente à quantidade de matéria que contém tantas entidades elementares quantos os átomos que existem em 0,012 kg de carbono-12.
para haver convexão. A convexão levou ao aquecimento da manto, e a crosta de gelo tornou-se mais fina de forma que o metano conseguiu libertar-se para a superfície.

Por fim, o último episódio teve início há apenas 500 milhões de anos, com o arrefecimento do satélite pela convexão na crosta de gelo, e os investigadores acreditam que ainda não terminou. Embora a taxa de libertação deva decair, a libertação do metano através de erupções criovulcânicas deve ainda estar a ocorrer em Titã. Estas erupções podem produzir fluxos temporários de metano líquido na superfície, o que poderá explicar as marcas de "rios" que se vêem na superfície do satélite. O criovulcanismo em Titã envolve o derreter do gelo e a libertação de gases, duma forma análoga ao que se passa no vulcanismo de silicatos na Terra, apenas com materiais diferentes.

Os investigadores defendem esta teoria em detrimento de outras porque as outras falham ao não conseguirem explicar a ausência de reservatórios líquidos na superfície e/ou o estado de baixa dissipação do interior.

Com base neste novo modelo, a equipa prevê que, em breve, as observações pela Cassini revelem mais evidências de criovulcanismo, talvez mesmo uma erupção de metano, e, num futuro próximo, detectem a presença de uma subsuperfície de oceano de água rica em amónia e um núcleo rochoso.

Fonte da notícia: http://www.esa.int/esaSC/SEM4BQMVGJE_index_0.html