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O enxame aberto Haffner 18

Ditos

"Os problemas mais importantes não podem ser solucionados com o mesmo nível de pensamento com o qual os criamos."
- Albert Einstein


Feira de Ciência

2005-11-24
Em abril pediram que desse um pequeno discurso a um grupo de estudantes locais que participaram numa feira de ciência. Não sabia muito bem o que lhes dizer, até que vi o telejornal na noite anterior à feira. A notícia era um fait divers tipicamente pouco correcto que dava “igual tempo de antena” quer à ciência quer aos cabeças ocas da anticiência, como se qualquer teoria ridícula devesse ter o mesmo tempo de antena que a verdade.

Sentei-me com um bloco de notas e um lápis, e escrevinhei este discurso. Disse-o praticamente como o escrevi.

"Eu conheço um lugar onde o Sol nunca se põe.

É uma montanha, e é na Lua. Estica-se tão alto, que mesmo à medida que a Lua roda, fica debaixo da luz do dia perpetuamente. A radiação do Sol ilumina-a dia e noite, 24 horas por dia - bom, de facto um dia lunar dura 4 semanas, e por isso a luz do Sol bate lá 708 horas por dia.

Eu conheço um lugar onde o Sol nunca brilha. É no fundo dos oceanos. Uma fenda onde a crosta da Terra expele químicos nocivos e aquece a água até ao ponto de ebulição. Isto mataria imediatamente qualquer humano, mas existem lá criaturas, bactérias que sobrevivem e prosperam. Alimentam-se de enxofre vindo dessa abertura, e excretam ácido sulfúrico.

Eu conheço um lugar onde a temperatura é de 15 milhões de graus. Onde a pressão vos esmagaria até um ponto microscópico. Esse lugar é o núcleo do Sol.

Eu conheço um lugar onde os campos magnéticos despedaçar-vos-iam átomo a átomo: é a superfície de uma estrela de neutrões, um magnetar.

Eu conheço um lugar onde a vida começou há milhares de milhões de anos atrás. Esse lugar é aqui, na Terra.

Eu conheço esses sítios porque sou um cientista.

A ciência é uma maneira de descobrir coisas. É uma maneira de testar o que é real. É o que Richard Feynman chamou "Uma maneira de não nos enganarmos a nós próprios."

Nenhum astrólogo previu a existência de Úrano, Neptuno ou Plutão. Nenhum astrólogo moderno teve pistas acerca do Sedna, uma bola de gelo com metade do tamanho de Plutão que tem uma órbita ainda mais afastada. Nenhum astrólogo previu os mais de 150 planetas que hoje sabemos que orbitam outros sóis.

Mas os cientistas sim.

Nenhum vidente, apesar das alegações, alguma vez ajudou a polícia a solucionar um crime. Mas os cientistas forenses sim, a toda a hora.

Não foi ninguém que praticava homeopatia que encontrou a cura para a varíola ou para a poliomielite. Mas os cientistas sim, médicos investigadores.

Nenhum criacionista alguma vez percebeu o código genético. Os químicos sim. Os biólogos moleculares sim.

Eles usaram a física. Eles usaram a matemática. Eles usaram a química, a biologia, a astronomia, a engenharia.

Eles usaram a ciência.

Estas são todas as coisas que vocês descobriram ao fazer os vossos projectos. Todas as coisas que vos trouxeram hoje até aqui.

Computadores? Telemóveis? Foguetões para Saturno, sondas para o fundo dos oceanos, playstations, gamecubes, gameboys, X-boxes? Tudo por cientistas.

Os lugares dos quais eu falei atrás - vocês também podem vir a conhecer. Podem sentir a admiração de os ver pela primeira vez, a emoção da descoberta, o sentimento visceral e maravilhoso de fazer algo que nunca ninguém fez antes, ver coisas que jamais alguém viu, saber algo que nunca ninguém soube.

Sem bolas de cristal, sem cartas de tarot, sem horóscopos. Apenas vocês, o vosso cérebro e a vossa capacidade de pensar.

Bem-vindos à ciência e boa viagem.



Tradução de José Raeiro
Artigo Original: http://www.badastronomy.com/bablog/?p=26