Hubble revela a dança caótica de duas luas de Plutão

2015-06-08

Este conjunto de ilustrações de lua de Plutão Nix mostra como a orientação da lua muda de forma imprevisível, à medida que orbita o sistema Plutão-Caronte. As ilustrações têm por base uma simulação em computador, que calculou o movimento desorganizado das quatro luas mais pequenas do sistema Plutão-Caronte. Os astrónomos usaram esta simulação para tentar compreender as mudanças imprevistas na luz reflectida de Nix. Descobriram ainda que a lua de Plutão Hidra também sofre uma rotação caótica. A forma alongada de ambas as luas contribui para o seu movimento imprevisível. Crédito: NASA, ESA, M. Showalter (SETI Inst.), G. Bacon (STScI).
Se vivêssemos em Nix ou Hidra, duas das luas de Plutão
Plutão
Plutão é, na maior parte do tempo, o nono e último planeta do Sistema Solar a contar do Sol, mas devido à sua órbita excêntrica, durante algum tempo aproxima-se mais do Sol do que Neptuno. É um planeta singular em muitos aspectos: é o mais pequeno (cerca de 1/500 o diâmetro da Terra), tem uma composição muito rica em gelos, possui a órbita mais excêntrica e inclinada em relação à eclíptica, e tem, tal como Úrano, o seu eixo de rotação muito inclinado (122º) em relação à eclíptica.
, nunca saberíamos para que hora acertar o despertador, já que seria difícil determinarmos ao certo quando, ou em que direcção, o Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
nasceria.

Uma análise ampla de todos os dados disponíveis do telescópio espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
mostra que Nix e Hidra estão a oscilar de um modo imprevisível. Os cientistas acreditam que as outras duas pequenas luas de Plutão, Cérbero e Estige, podem estar em situação semelhante, mas aguardam um estudo mais aprofundado.

"O Hubble deu-nos uma nova visão de Plutão e das suas luas, revelando uma dança cósmica a um ritmo caótico", disse John Grunsfeld, administrador associado do Science Mission Directorate da NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
, em Washington DC. "Quando a sonda New Horizons passar pelo sistema de Plutão, em Julho, teremos a oportunidade de ver de perto como são essas luas.”

A oscilação caótica está relacionada com o facto de luas estarem dentro de um campo gravitacional que varia de forma dinâmica, devido ao movimento do sistema formado por Plutão e Caronte, que giram em torno um do outro. O campo gravitacional variável faz com que as luas mais pequenas se movam de forma errática. O efeito é reforçado pela forma alongada e não esférica das luas.

Os resultados surpreendentes desta pesquisa, conduzida por Mark Showalter, do Instituto SETI, em Mountain View, Califórnia, e por Doug Hamilton, da Universidade de Maryland, em College Park, surgem na edição de 4 de Junho da revista Nature.

"Antes das observações do Hubble, ninguém avaliava a dinâmica complexa do sistema de Plutão", disse Showalter. "O nosso estudo fornece novas e importantes restrições sobre a sequência de eventos que levaram à formação do sistema."

Seguindo as quatro luas exteriores de Plutão, o Hubble revelou que três delas, Nix, Estige e Hidra, estão actualmente ligadas em ressonância, havendo uma relação precisa entre os seus períodos orbitais. "Isto liga os seus movimentos de forma semelhante à que acontece com três das grandes luas de Júpiter", observou Hamilton. "Se estivéssemos em Nix, veríamos que Estige orbita Plutão duas vezes para cada três órbitas
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
de Hidra".

O Hubble também forneceu as provas observacionais de que as luas seguem órbitas caóticas. "No entanto, isto não significa necessariamente que o sistema esteja à beira de se separar", acrescentou Showalter. "Precisamos de saber muito mais sobre o sistema antes de podermos determinar o seu destino a longo prazo."

Para surpresa dos astrónomos, os dados do Hubble também revelaram que a lua Cérbero é escura como carvão, enquanto que as restantes são brilhantes como areia branca. Previa-se que a poeira expelida dos satélites pelos impactos de meteoritos
meteorito
Um meteorito é um corpo sólido que entra na atmosfera da Terra (ou de outro planeta), sendo suficientemente grande para não ser totalmente destruído pela fricção com as partículas da atmosfera, e assim atingir o solo. Os meteoritos dividem-se em três categorias, segundo a sua composição: aerolitos (rochosos), sideritos (ferro) e siderolitos (ferro e rochas).
revestisse todas as luas, dando às suas superfícies um aspecto homogéneo, mas a cor de Cérbero é inesperada.

A sonda New Horizons da NASA, que passará pelo sistema de Plutão em Julho de 2015, poderá ajudar a resolver a questão da lua escura, bem como outras questões estranhas descobertas pelo Hubble. Estas novas descobertas estão a ser usadas para planear as observações científicas da New Horizons.

A oscilação caótica no sistema Plutão-Caronte dá-nos pistas sobre o comportamento dos planetas
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
que orbitam sistemas binários. "Estamos a descobrir que o caos pode ser um traço comum em sistemas binários", disse Hamilton. "Pode até ter consequências para a vida em planetas nesses sistemas." O Observatório Espacial Kepler da NASA descobriu vários sistemas planetários que orbitam sistemas binários.

As pistas para este caos em Plutão surgiram quando os astrónomos mediram variações imprevistas na luz reflectida por Nix e Hidra. "Os dados eram confusos; não faziam sentido. Tivemos um pressentimento de que algo estava errado", disse Showalter. A sua equipa analisou imagens de Plutão tiradas pelo Hubble entre 2005 e 2012 e comparou as mudanças imprevistas na luz reflectida das luas a modelos dinâmicos de corpos a girar em campos gravitacionais complexos.

Em termos virtuais, todas as grandes luas, bem como as pequenas, em órbitas próximas, mantêm um hemisfério voltado para o planeta principal. Isto significa que a rotação do satélite é perfeitamente compatível com o período orbital
período orbital
O tempo necessário para que um corpo descreva uma órbita completa e fechada em torno de outro corpo.
. Isto não é uma coincidência, mas sim a consequência das marés gravitacionais entre a lua e o planeta. (Hiperião, que orbita Saturno
Saturno
Saturno é o sexto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 10 vezes o da Terra, é o segundo maior planeta do Sistema Solar. A sua característica mais marcante são os belos anéis que o rodeiam.
, é o único outro exemplo de rotação caótica do Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
, que se deve às forças gravitacionais combinadas do planeta e da sua a maior lua, Titã).

Julga-se que as luas de Plutão se formaram devido a uma colisão entre o planeta anão e outro corpo de porte semelhante, no início da história do Sistema Solar. O material arremessado consolidou-se para formar a família de satélites que hoje se observam em torno de Plutão. Caronte, o seu companheiro, foi descoberto em 1978 e tem quase metade do tamanho de Plutão. O Hubble descobriu Nix e Hidra em 2005, Cérbero em 2011, e Estige em 2012. Estas pequenas luas, medindo apenas dezenas de quilómetros de diâmetro, foram encontradas pelo Hubble quando procurava potenciais perigos para a passagem da New Horizons.

Plutão e Caronte são um sistema duplo porque orbitam um centro de gravidade comum que está localizado no espaço entre os dois corpos.

Os investigadores dizem que a combinação de dados de monitorização do Hubble com o olhar breve mas de perto da New Horizons e eventuais observações com o Telescópio Espacial James Webb irão ajudar a resolver muitos mistérios do sistema Plutão-Caronte. Até agora, nenhum telescópio terrestre foi capaz de detectar as luas mais pequenas.

"Plutão vai continuar a surpreender-nos quando a New Horizons passar por lá, em Julho" disse Showalter. "O nosso trabalho com o telescópio Hubble apenas nos dá uma amostra do que aí pode vir."

Fonte da notícia: http://hubblesite.org/newscenter/archive/releases/2015/24/full/