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| Telescópio que utilizo para fotografar planetas (Schmidt-Cassegrain; 355mm de diâmetro), e uma vulgar webcam na qual a objectiva está a ser substituida por um adaptador porta-ocular. Crédito: António Cidadão |
A observação do planeta Júpiter é uma actividade fascinante. Pode ser efectuada visualmente, nomeadamente a olho nu, com um binóculo ou através de um telescópio, ou pode centrar-se na obtenção de imagens telescópicas subsequentemente processadas e avaliadas. Em ambos os casos, porém, à beleza e satisfação pessoal que resulta das observações que efectuamos pode adicionar-se uma faceta de real utilidade. Tal sucede quando os documentos que produzimos, sejam eles um desenho ou uma imagem, são canalizados para as diversas bases de dados
1 que sustentam projectos de monitorização do planeta regidos por amadores. Em alguns casos, tais documentos podem mesmo vir a ser solicitados e utilizados em colaborações entre profissionais e amadores.
Há vários factores que tornam Júpiter um objecto celeste de eleição para a observação por parte dos amadores, nomeadamente a sua magnitude e diâmetro aparente, que variam entre –1,3 e –2,7
2 e de 30 a 50 segundos de arco
3 respectivamente, e os longos períodos de visibilidade contínua, cerca de 360 dias em cada uma das suas aparições
4. Além disso, o seu disco apresenta-se cheio de estruturas atmosféricas dinâmicas e coloridas, exibe uma rotação extremamente rápida, que se completa em pouco menos de 10h, e faz-se acompanhar por um grupo de satélites brilhantes e igualmente dinâmicos, caracteristicamente alinhados no seu plano equatorial. Finalmente, e tal como acontece relativamente à análise planetária em geral, a observação de Júpiter é imune à crescente onda de poluição luminosa que, infelizmente, perturba de modo muito acentuado outros campos da astronomia. É pois uma actividade ideal para desenvolver em meio urbano.
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Júpiter, tal como pode ser observado à vista desarmada, à ocular de um pequeno telescópio numa noite de boa estabilidade atmosférica, e numa imagem digital processada. Crédito: António Cidadão |
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| O planeta Júpiter está actualmente posicionado na constelação do Leão e começa a ser visível, perto do horizonte Este, cerca da meia-noite. Crédito: António Cidadão
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Quando observado à vista desarmada, Júpiter apresenta-se como uma “estrela” muito brilhante de cor branca, que não cintila e que se desloca lentamente para Este na esfera celeste, posicionando-se numa diferente constelação zodiacal em cada ano. Anotar periodicamente a posição do planeta, por exemplo mensalmente, ou então regista-la fotograficamente com uma vulgar câmara posicionada num tripé
5, é um exercício interessante e didáctico. Por vezes ocorrem conjunções entre Júpiter e a Lua ou outros planetas brilhantes, nomeadamente Vénus, e tais ocasiões podem ser aproveitadas para obter fotografias interessantes, mais uma vez com vulgares câmaras fotográficas. Devido ao seu grande diâmetro aparente, em média um pouco superior a 40 segundos de arco, o disco de Júpiter já é evidente quando o planeta é observado com um binóculo. Não se deve esperar observar quaisquer pormenores no disco planetário, mas os quatro satélites galileanos
6, Io, Europa, Ganimedes e Calisto, visualizar-se-ão como pequenas “estrelas” alinhadas, brilhando com magnitudes entre 4,5 no caso de Ganimedes e 5,5 para Calisto.
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Marte e Júpiter, fotografados à mesma escala, na sua dimensão aparente máxima quando observados a partir da Terra. Telescópio de 254mm de diâmetro e câmara CCD refrigerada. Crédito: António Cidadão | |
Basta um intervalo de tempo de cerca de uma hora para, com um binóculo, detectar alterações no seu posicionamento relativo, as quais reflectem o seu movimento de translação em torno de Júpiter. A análise comparativa de dois esquemas nos quais foram anotadas as posições relativas dos satélites pode novamente mostrar-se muito didáctica. A observação telescópica do planeta Júpiter é extremamente interessante e gratificante mas, à semelhança do que se passa com o restante trabalho de alta resolução e que potencialmente requer grandes amplificações, os resultados finais estão fundamentalmente dependentes da estabilidade da nossa atmosfera. Em condições favoráveis, o disco de Júpiter apresenta-se muito bem definido e com um nítido escurecimento no limbo
7. Além disso, mostra inequivocamente um achatamento polar, o qual faz com que o diâmetro equatorial Joviano seja cerca de 1/16 maior que o diâmetro polar.
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| Júpiter e o seu satélite Io, fotografados no infravermelho com um telescópio de 254mm de diâmetro e uma câmara CCD refrigerada. Clique na imagem para activar uma animação numa nova janela (cerca de 1 hora de tempo real; 1,5MB). Crédito: António Cidadão
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Uma estrutura em bandas alternadamente mais claras – zonas - e escuras – cinturões - dispõe-se paralelamente ao equador, numa orientação que coincide com o característico alinhamento dos satélites galileanos.
Mesmo o mais modesto telescópio mostrará, junto do equador, dois cinturões e uma zona mais clara entre eles.
Relativamente aos satélites galileanos, alterações no seu posicionamento relativo serão já evidentes num período de 15min, e suas diferenças de brilho e cores características poderão também ser apreciadas. Se as condições de estabilidade atmosférica forem favoráveis e se o disco planetário mostrar alguma estrutura de dimensão, cor ou contraste adequados, como por exemplo a Grande Mancha Vermelha, a rápida rotação do planeta será perceptível em poucos minutos, e mesmo para os iniciados, será inequívoca após cerca de 1 hora.
Com treino de observação, com instrumentos de maior abertura
8 e, nunca é demais insistir, quando a estabilidade da nossa atmosfera o permite, o grande
número de pormenores ou irregularidades existente nas fronteiras entre cinturões e zonas facilitará o acompanhamento da rápida rotação do planeta. Numa única longa noite de Inverno será mesmo possível seguir uma rotação completa de Júpiter, um interessante projecto eventualmente para os mais “resistentes”. Uma atmosfera estável e um telescópio de abertura razoável, nomeadamente 200-250mm, também permitirão ao observador desfrutar
completamente as cores pastel da atmosfera de Júpiter. Equipamento mais modesto, porém, já mostrará cor no disco planetário. Visualmente não se deve esperar encontrar as cores saturadas e o contraste patente nas fotografias, os quais se obtêm por processamento de imagem. Tais ”exageros” metodológicos são muito úteis para cartografar e seguir a profusão de pequenos pormenores atmosféricos ao longo do tempo, mas não traduzem fielmente a realidade. Júpiter é de facto um planeta repleto de pormenores atmosféricos, mas de baixo contraste. Além do branco e amarelado que dominam o disco planetário, deve esperar-se encontrar tons de castanho, salmão ou azul acinzentado. A Grande Mancha Vermelha tem presentemente uma coloração laranja pálida, e os cinturões podem exibir uma tonalidade castanha avermelhada suave.
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Conjunção entre Júpiter e Vénus, fotografada com uma vulgar câmara digital colocada junto à ocular de um telescópio (método afocal). Crédito: António Cidadão | |
Fotografar o planeta Júpiter é uma tarefa fácil, de novo quando a estabilidade da nossa atmosfera colabora. Por um lado, o brilho de Júpiter permite tempos de exposição curtos, muitas vezes fracções de segundo, e o seu grande diâmetro aparente significa que amplificações telescópicas inferiores às requeridas por outros planetas já possibilitam visualizar uma quantidade apreciável de pormenores. Fotografias interessantes de grande campo podem ser realizadas colocando uma banal câmara num tripé, mas é igualmente simples utilizar uma câmara fotográfica ou um “camcorder” em projecção afocal
5 junto à ocular de um telescópio, mesmo modesto. A abordagem mais gratificante, no meu ponto de vista, é porém utilizar uma simples “webcam” a que se retirou a objectiva e coloca-la no foco primário do telescópio,
com ou sem a interposição de um teleconversor fotográfico ou uma lente de Barlow
5. Desta maneira, podem capturar-se pequenos filmes em formato “AVI” directamente para o computador que, além de registarem objectivamente os efeitos deletérios da turbulência atmosférica, irão conter inúmeros fotogramas subsequentemente utilizáveis para preparar excelentes fotografias.
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Planeta Júpiter, fotografado com um telescópio de 254mm de diâmetro e uma webcam, numa noite de estabilidade atmosférica medíocre. Crédito: António Cidadão
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Foi desenvolvido por amadores, e é disponibilizado gratuitamente
9, uma grande diversidade de “software” que possibilita capturar os vídeos, seleccionar automaticamente os melhores fotogramas, alinha-los, obter por média ou adição uma imagem bruta de muito boa qualidade, e efectuar o seu processamento para fazer realçar a cor ou o contraste das estruturas Jovianas a analisar. Como o planeta Júpiter tem um movimento de
rotação muito rápido, cada um dos filmes destinado a obter uma imagem final não deve exceder em duração 3 a 5 minutos. A exploração de comprimentos de onda fora do visível, nomeadamente o infravermelho ou o ultravioleta, necessita equipamento mais especializado, nomeadamente filtros específicos ou câmaras CCD refrigeradas
5. À semelhança das observações visuais, anotar o equipamento utilizado, as
condições atmosféricas quando da observação e,
principalmente, a data e a hora da obtenção das imagens ou desenhos, com uma precisão de pelo menos um minuto, é uma tarefa simples mas essencial para transformar as nossas contribuições em documentos de potencial valor científico.
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Júpiter, observado através de um telescópio de 254mm de diâmetro numa noite de estabilidade atmosférica razoável. A rotação do planeta é demonstrada pelo diferente posicionamento da Grande Mancha Vermelha. Crédito: António Cidadão
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