Detecção de ondas gravitacionais I (Barras Ressonantes)
Tendo discutido nas últimas três semanas as fontes de ondas
gravitacionais que gostaríamos de poder detectar no futuro próximo,
vou hoje analisar algumas das técnicas utilizadas na detecção
de ondas gravitacionais bem como alguns dos principais detectores em funcionamento e algumas das ideias mais interessantes que poderão eventualmente conduzir a grandes progressos nesta área.
Existem essencialmente dois tipos de detectores: barras ressonantes e
interferómetros. Embora os detalhes de construção e as suas
propriedades sejam bastante diferentes, o princípio usado para a
detecção é essencialmente o mesmo: ao interagir com o detector, uma
onda gravitacional vai induzir uma alteração dl na dimensão do
detector. Como vimos anteriormente, a sensibilidade de um detector é
dada aproximadamente por dh=dl/l onde l é a dimensão do detector. Quanto
mais pequeno for o número dh
mais sensível será o detector. A diferença entre os dois tipos de
detectores consiste fundamentalmente na maneira como dl é medido, e na
gama de frequências a que o detector é sensível.
Um pioneiro
Em 1969 Weber
dispunha de vários detectores que atingiam sensibilidades da ordem de
10-16. Dada a fraca intensidade do efeito que se pretendia
observar, o sinal era dominado por ruído. Se uma correlação fosse
observada entre o sinal de vários detectores, uma vez que o ruído
nos vários instrumentos não deveria estar correlacionado, a explicação mais
provável seria a detecção de uma onda gravitacional. A certa altura
Weber anunciou que uma tal correlação tinha de facto sido observada e
a primeira detecção de ondas gravitacionais tinha ocorrido. Na altura este
anúncio gerou grande excitação na comunidade que se dedicava ao estudo das
ondas gravitacionais e vários grupos apressaram-se a construir detectores
semelhantes aos de Weber.
Infelizmente nenhum conseguiu reproduzir a sua observação de forma que
a detecção não foi confirmada embora Weber tenha continuado convencido que
o sinal por ele observado era causado por uma onda gravitacional.
Apesar de todos os progressos nesta área,
a situação mantém-se inalterada, mas como veremos em breve, é
altamente provável que a primeira detecção ocorra muito em breve. Os
detectores deste tipo que se encontram hoje em operação
sofreram várias modificações que permitiram melhorar em muito a sua
sensibilidade e eliminar a maior parte do ruído causado por
fontes externas. Em particular, as barras passaram a ser arrefecidas
a temperaturas da ordem de alguns Kelvin, novas suspensões foram
desenvolvidas de modo a melhorar o isolamento das barras de vibrações
exteriores e por fim foi introduzido um transdutor ressonante que não
só amplifica as vibrações do modo fundamental da barra, como amortece
as vibrações de baixa frequência que constituem uma parte importante
do ruído que afecta estes detectores.
Embora a estrutura do detector
em si continue mais ou menos a mesma, os vários grupos que operam
barras ressonantes têm efectuado melhoramentos impressionantes que se
traduzem em instrumentos com sensibilidades da ordem de 10-20 para
uma banda estreita (alguns Hz) à volta de 1 KHz. Se pensarmos que
os deslocamentos que pretendemos medir (à volta de 10-20 m) são da
ordem de grandeza da incerteza quântica na posição da barra no
estado fundamental, vemos que os desafios que se põem à detecção de
ondas gravitacionais são de facto imensos.
Uma das características que limita as possibilidades destes detectores
é a variação da sua sensibilidade em função da direcção da fonte. Se a
direcção da fonte e o eixo do cilindro estiverem separados por um
ângulo θ, a sensibilidade do detector varia com sin 2θ. Por
outro lado se ψ for o ângulo de polarização no plano da frente de
onda medido em relação à projecção do eixo do detector, a
sensibilidade à polarização é dada por cos 2ψ. Desta forma a
orientação do detector em relação à fonte que se pretende observar
deve ser cuidadosamente ponderada de forma a maximizar o sinal
recebido no detector.
A actualidade
Para atingir sensibilidades varias ordens de grandeza superiores aos
detectores de Webber o AURIGA é arrefecido a uma temperatura de ordem
de 0.1 K! O detector encerrou a primeira fase de operações em 1999, e
após a introdução de vários melhoramentos no sistema criogénico e na
suspensão da barra, uma nova configuração do detector encontra-se
actualmente em testes e uma segunda fase de operação deverá ter inicio
muito em breve.
Outro exemplo interessante é o NIOBE operado pela Universidade do Oeste
da Austrália. Neste caso a temperatura de operação do detector é
mais elevada, 5 K, mas ao contrário do AURIGA que é uma barra de
alumínio, O NIOBE é feito de Nióbio, um material com um factor de
qualidade mecânica mais elevado que o Alumínio a 5 K.
O que aprendemos então com o AURIGA? Infelizmente nenhuma detecção de
ondas gravitacionais foi confirmada, mas isto não quer dizer que a
experiência tenha sido uma completa perda de tempo. Operando numa rede, a
International Gravitational Event Collaboration ou IGEC (Fig. 3), que inclui
além do AURIGA mais 4 detectores em vários continentes (o ALLEGRO na
Louisiana nos EUA, o EXPLORER em Genebra, o NAUTILUS em Roma e o
NIOBE em Perth) foi possível impor limites à probabilidade de
observar uma falsa coincidência em vários detectores e optimizar
os métodos que procuram os sinais característicos das ondas
gravitacionais. Neste caso os detectores em questão foram orientados
com os eixos paralelos de maneira a optimizar a busca de ondas
gravitacionais em fontes na direcção do centro da nossa galáxia. O
processamento dos sinais dos vários detectores é feito de forma
independente e os possíveis eventos observados por cada um dos
detectores são então comparados. É encorajador verificar que os
resultados obtidos por esta colaboração mostram que a probabilidade
de ter uma falsa coincidência é desprezável quando usamos pelo menos
três detectores.
Detectores esféricos
Embora a sensibilidade das barras ressonantes tenha atingido valores
verdadeiramente impressionantes, é óbvio que não é ainda suficiente
para conseguir observar ondas gravitacionais. Para além de uma maior
sensibilidade, as propriedades direccionais das barras ressonantes
tornam complicado determinar a direcção da fonte ou a polarização da onda emitida.
Para além da identificação exacta de uma fonte ser
importante, é quando conjugada com observações no espectro
electromagnético que se torna óbvia a necessidade de uma melhor
localização das fontes. Podemos por exemplo imaginar uma situação
em que um sinal característico da fase final da coalescência num
sistema binário é
observado. Sabendo a direcção em que a fonte se encontra, os
astrónomos de ondas gravitacionais podem imediatamente notificar os
seus colegas que trabalham em astronomia convencional que um fenómeno
interessante está a ocorrer numa determinada direcção. Na
posse desta informação será muito mais fácil seguir a fase final da
coalescência com telescópios convencionais.
Na próxima semana falarei sobre aquela que é neste momento a técnica
mais promissora para conseguir uma detecção de ondas gravitacionais
nos próximos anos: a interferometria.
|