O objectivo da estratigrafia lunar, como a terrestre, é de integrar unidades geológicas numa coluna estratigráfica aplicável a todo o planeta e correlar esta coluna com idades absolutas (idades obtidas de amostras por métodos isotópicos) assim que vão ficando disponíveis por estudos laboratoriais. A base para a construção desta coluna estratigráfica é o conceito da superposição. No caso lunar este termo refere-se a superposição de crateras (Wilhelms, 1987) estando a cratera mais nova sobre a mais velha. Cada unidade (intervalo) estratigráfica de crateras é caracterizada por uma certa especificação de distribuição de tamanho-frequência (DL) de crateras. Pares de crateras, bacias ou unidades de maria adjacentes podem normalmente ser datados através de observações directas de superposição e transecções com base no simples conceito que a unidade mais nova modifica a mais velha (Wilhelms, 1987). Em alguns casos, a correlação pode cobrir áreas vastas devido a existência de crateras de impacto secundárias (crateras formadas a partir do material de grandes dimensões que foi removido e ejectado devido a um impacto grande, por isso este tipo de crateras tem a mesma idade que a cratera principal).
Presentemente, a coluna estratigráfica lunar é dividida em quatro sequências principais: pré-Nectariano (o mais antigo), Nectariano, Imbrium Inferior, e Imbrium superior até ao Copernicano (mais recente) (Wilhelms, 1987). A definição destas sequências é baseada nos depósitos das bacias de Nectaris, Imbrium e Orientale que são extensivos lateralmente. Esta sequência é subdividida em seis unidades com a seguinte ordem da mais recente até à mais velha:
- unidades de crateras Copernicanas são datadas pela frequência e morfologia de crateras muito pequenas que só são visíveis nas fotografias de melhor qualidade de resolução;
- unidades de crateras do Eratosteniano são também identificadas usando o método de distribuição de tamanho-frequência. Por outro lado, as unidades dos maria do Eratosteniano e algumas das lentes de vidro de impacto são datadas pelo modelo teórico de determinação de DL baseado no critério de erosão operando em steady-state (Wilhelms, 1987);
- as unidades de maria do Imbrium Superior são fáceis de identificar usando o modelo DL;
- apenas algumas das crateras do Imbrium Inferior e Superior são suficientemente grandes para validade estatística de identificação de idade usando o método tamanho-frequencia. Estas crateras são normalmente datadas a partir da avaliação da degradação das subunidades;
- os materiais das bacias do Imbrium Inferior, Orientale e Imbrium, são suficientemente extensivos e jovens, e existe uma elevada quantidade de fotografias que permite a datação pelo método de superposição de crateras;
- como o ‘steady state’ aumenta para unidades mais velhas e crateras com mais do que 20 km de diâmetro são consideradas válidas como indicadores para todos os períodos Nectariano e pré-Nectariano (as duas unidades estratigráficas mais velhas).
Crateras maiores que 20 km de diâmetro são suplementadas por identificação usando o método tamanho-frequência.
Terras-Altas
Os efeitos dos impactos no processo de formação das bacias no inicio da historia da Lua são encontrados por toda a Lua e visíveis a níveis diferentes. Estes eventos não são responsáveis pela formação das crateras de multi-aneis com > 1000 km de diâmetro, mas também pela formação das grandes variações em topografia (i.e. as montanhas formadas a partir dos anéis e dos mantos de ejecta assim como as despressões na crosta original que foram posteriormente preenchidas com os basaltos dos maria). Mais, estes impactos foram responsáveis pelo quebrar e triturar da superfície lunar (um tipo de “erosão”) até profundidades de 20 km no processo de formação da camada de regolito (solo lunar) que tem em média cerca de 4-5 m cobrindo toda a superfície da Lua. Apesar do grande número de rochas das terras-altas na colecção Apollo e Luna não preservarem a sua idade de cristalização original, e mostrarem em vez disso, a idade em que os isótopos foram reiniciados e a idade obtida corresponder a esse evento, varias rochas lunares datadas dão idades superiores a 3.9 Ga. A maioria destas rochas de idade superior são rochas ígneas plutónicas que foram formadas ou durante o período de diferenciação lunar (anortosites ferricas) ou foram formadas por processos mais tardios como por exemplo o revirar do manto (troctolites, norites, grabronorites, granitos, granodiorites).
Na tabela abaixo encontra-se um resumo das idades até agora determinadas das amostras obtidas pelas missões Apollo e Luna. Para um estudo mais compreensivo, sugere-se que o leitor consulte Papike et al. (1998). O intervalo de idades sugere que o “segundo período de magmatismo” na Lua começou apenas 100 Ma após a sua formação. Este período durou pelo menos 650 Ma, mas é provável que tenha durado mais (até há 1000 milhões de anos)
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Resumo das idades determinadas para rochas das terras-altas (Papike et al. [1998] e referências ai listadas). |
Tipo de Rocha |
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Idade (Ga) |
Método |
Missões |
Anortosite Ferrica |
|
4.33-4.56 |
Ar-Ar, Sm-Nd, U-Pb, Pb-Pb |
Apollo 16, Luna 20 |
Rochas ricas em Mg |
Troctolites |
4.19-4.27 |
Ar-Ar, Rb-Sr, Sm-Nd, U-Pb, Pb-Pb |
Apollo 14, Apollo 17 |
| Dunites |
4.47 0.10 |
Rb-Sr |
Apollo 17 |
| Norites |
4.11-4.46 |
Ar-Ar, Rb-Sr, Sm-Nd, U-Pb, Pb-Pb |
Apollo 14, Apollo 15, Apollo 17 |
| Gabronorites |
4.18-4.23 |
Sm-Nd |
Apollo 16, Apollo 17 |
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Maria
O vulcanismo na Lua, como mencionado anteriormente, teve inícios contemporâneos ao plutonismo nas terras-altas. Os basaltos-KREEP e basaltos com elevado teor de Al foram expelidos antes da formação das bacias grandes.
Na tabela seguinte encontra-se um resumo das idades para rochas basálticas obtidas nas missões Apollo e Luna. Para uma apreciação mais completa das idades e tipo de amostras, sugere-se a consulta de Stöffler and Ryder (2001) e referências ai listadas.
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Resumo das idades determinadas para rochas basálticas dos maria (Stöffler e Ryder [2001] e referências ai listadas). |
Tipo de Rocha |
Idade (Ga) |
Missões |
Rochas alcalinas | 4.03-4.34 | A14, A16 |
Basaltos KREEP quartzo-monzodiorite | 3.82-3.86 3.93-4.08 4.30±0.04 | A15 A17 A15 |
Basaltos Elevado-K | 3.58±0.01 | A11 |
Basaltos elevado-Ti (B1-3) | 3.70±0.02 | |
Basaltos High-Ti basalt (B2) | 3.80±0.02 | |
Basalto elevado-Ti (D) | 3.85±0.01 | |
Olivine basalt | 3.22±0.04 | A12 |
Basalto de Pigeonite | 3.15±0.04 | |
Basalto de Ilmenite | 3.17±0.02 | |
Basalto Feldspático | 3.20±0.08 | |
Basalto Ol-norm | 3.30±0.02 | A15 |
Basalto Qz-norm | 3.35±0.01 | |
Basalto Picritico | 3.25±0.05 | |
Basalto Ilmenite | 3.35±0.04 | |
Vidro verde | 3.3-3.4 | |
Vidro amarelo | 3.62±0.07 | |
Basalto feldspático | 3.74±0.05 | A16 |
Elevado-Ti (A) | 3.75±0.01 | A17 |
Elevado -Ti (B1/2) | 3.70±0.02 | |
Elevado -Ti (C) | 3.75±0.07 | |
Elevado -Ti (D) | 3.85±0.04 | |
Vidro laranja | 3.5-3.6 | |
Basalto Aluminouso | 3.41±0.04 | L16 |
Basalto muito baixo-Ti | 3.22±0.02 | L24 |
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Meteoritos Lunares (Lunatites)
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| Meteorito basáltico lunar Northwest Africa 032 (NWA032). |
Desde meados dos anos oitenta, meteoritos lunares encontrados nos desertos quentes e gelados da Terra têm vindo a suplementar a colecção de amostras obtidas pelas missões Apollo e Luna. Este tipo de amostras não só aumenta a quantidade de material disponível, mas também aumneta a representatividade da amostragem. As missões Apollo e Luna não visitaram mais do que 5% da superfície lunar, e os locais onde “lunaram” estavam restritos à região equatorial do lado visível. Por outro lado, os meteoritos lunares podem ter tido origem em qualquer parte da superfície da Lua, até mesmo do lado não-visível. Portanto, este tipo de entrega de material lunar incrementa a área da superfície da Lua de onde se tem amostras. Presentemente, cerca de 27 meteoritos lunares foram reconhecidos e na maioria são exemplos das terras-altas em forma do que se denomina brecha, mas também há 4 basaltos de maria. As amostras de onde a determinação de idade é mais simples são aquelas constituídas apenas por uma única litologia (tipo de rocha), por isso brechas de regolito polimictas (com mais do que um tipo de rocha), com os seus diversos componentes, composição química e historia podem dar mais do que uma idade e os dados obtidos são difíceis de interpretar. Por outro lado, as idades obtidas de meteoritos basálticos, com uma só litologia são normalmente de interpretação directa assim como mais informativos relativo ao estudo da evolução domanto pois a idade obtida é representativa de algum evento magnático na Lua.
Na tabela abaixo encontra-se o resumo das idades determinadas para meteoritos basálticos encontrados nos desertos terrestres. De momento, o número de idades determinadas para este tipo de meteoritos e limitada, mas quantos mais meteoritos forem encontrados, maior será a possibilidade de encontrar alguns que sejam de composição basáltica, o que aumentará o numero de idades determinadas para este tipo de rocha.
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Com a lista das 51 pedras de meteoritos lunares encontrados. Na verdade, só existem 27 amostras de 27 meteoritos diferentes porque varias das pedras encontradas são parte de uma mesma massa inicial. Esta lista pode ser encontrada no Website da Washington Univ. at St. Louis, WUSL. |
Nome |
Ano de Recolha |
Local de Recolha |
Massa (g) |
Tipo de Rocha |
Provável Origem na Lua |
Dhofar 303 |
2001 |
Oman |
4,15 |
Brecha de impacto feldspatica |
Terras Altas |
Dhofar 305 |
2001 |
Oman |
34 |
Brecha de impacto feldspatica |
Terras Altas |
Dhofar 306 |
2001 |
Oman |
12.9 |
Brecha de vidro feldspatico de impacto? |
Terras Altas |
Dhofar 307 |
2001 |
Oman |
50 |
Brecha de vidro feldspatico de impacto? |
Terras Altas |
Dhofar 309 |
2002 |
Oman |
81.3 |
Brecha de vidro feldspatico de impacto? |
Terras Altas |
Dhofar 310 |
2002 |
Oman |
10.8 |
Brecha de vidro feldspatico de impacto? |
|
Dhofar 311 |
2002 |
Oman |
4 |
Brecha de vidro feldspatico de impacto? |
|
Dhofar 730 |
2002 |
Oman |
108 |
Brecha de vidro feldspatico de impacto? |
|
1153 |
? |
Antartida |
? |
Brecha de impacto feldspatica |
Terras Altas |
Allan Hills 81005 |
1982 |
Antartida |
31.4 |
Brecha de impacto feldspatica |
|
Yamato 791197 |
1979 |
Antárctida |
52.4 |
Brecha de regolito feldspatico |
Lado Visível |
Yamato 983885 |
1999 |
Antárctida |
290 |
Brecha de regolito feldspatico/mare |
Lado Visível |
Calcalong Creek |
1990 |
Austrália |
19 |
Brecha de regolito feldspatico com basalto |
|
Queen Alexadra Range 94281 |
1994 |
Antárctida |
23 |
Brecha de regolito feldspatico/mare |
Regolito de mare do Lado Visível |
Sayh al Uhaymir 169 |
2002 |
Oman |
206 |
Brecha de vidro de impacto mafico rico em KREEP e regolito aderente |
|
Yamato 793274/981031 |
1980/99 |
Antárctida |
8.7+186 |
Brecha de regolito feldspatico/mare |
Regolito de mare do Lado Visível |
Elephant Moraine 87521/96008 |
1987/96 |
Antárctida |
31+52 |
Brecha de regolito de babrl de mare |
Lado Visível |
Yamato 793169 |
1979 |
Antárctida |
6.1 |
Basalto de mare |
Lado invisível |
Asuka 881757 |
1988 |
Antárctida |
442 |
Basalto mare |
Lado invisível |
Northwest Africa 032/479 |
1999/2001 |
Marrocos |
~300+156 |
Basalto mare |
|
Dhofar 287 |
2001 |
Oman |
154 |
Basalto mare |
Mare do lado visível, longe das terras-altas |
Northwest Africa 773 |
2000 |
Sara Ocidental |
633 |
Brecha de regolito basaltico com clastos de gabro de olivine de cumulus |
Lado Visível |
|
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Resumo das idades determinadas para meteoritos das terras-altas. |
Amostra |
Tipo de Rocha |
Material Analisado |
40Ar/39Ar
(Ga) |
Allan Hills 81005 |
Brechas de regolito feldsp. |
Bulk |
4.3±0.9 |
Dar Al Gani 262 |
Brechas de regolito feldsp. |
Vidro de impacto |
2.43-4.12 |
Dar Al Gani 400 |
Felds. Impact melt or regolith breccia |
Vidro de impacto |
2.92-3.47 |
Dhofar 025 |
Felds. Impact melt breccia |
Vidro de impacto |
0.564-4.012 |
Dhofar 026 |
Felds. Granulitic or impact melt breccia |
Vidro de impacto |
0.569±0.11 |
Dhofar 081 |
Felds.fragmental/ breccia |
Bulk |
- |
MacAlpine Hills 88104/88105 |
Brechas de regolito feldsp. |
Vidro de impacto |
3.01-4.04
3.55 0.40 |
Queen Alexander Range 93069 |
Felds.fragmental/ regolith breccia |
Vidro de impacto |
3.02-4.04 |
Yamato 791197 |
Felds. regolith breccia |
Bulk |
4.07±0.18 |
Yamato 86032 |
Felds.fragmental/ regolith breccia |
Bulk |
3.70-4.0 |
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Resumo das idades determinadas para meteoritos basálticos (Thalmann et al. [1996] e Fernandes et al. 2003a e 2003b). |
Meteorito |
Idade (Ga) |
Tipo de Rocha |
Asuka 881757 |
3.87+-0.06 |
Basalto (Gabroico) |
Yamato 793169 |
3.30-3.80* |
Basalto |
NWA032 |
2.80 |
Basalto |
NWA773 |
2.91 |
Cúmulo de olivina
+
Basalto com baixo-Ti |
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Como acima referido, a composição complexa dos meteoritos com material das terras-altas (na maioria são compostos de regolito e mais do que uma litologia) faz com que as idades determinadas não sejam únicas. Várias tentativas têm sido feitas por diferentes grupos de investigação em amostras representativas de todo o meteorito (incluíram porções de todas as litologias que possam compor cada um dos meteoritos (Eugster et al. [1986 e 1989] e Kaneoka e Takaoka [1986]), ou só vidros cristalinos de impacto dentro de meteoritos (Cohen et al. [2000] e Fernandes et al. 2000). Na Tabela 8 em baixo, encontra-se uma lista de idades obtidas usando o método de datação Ar-Ar (mais propriamente escrito como 40Ar/39Ar) para alguns meteoritos compostos de brechas de material das terras-altas.
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