Vulcanismo

A extrusão de lavas basálticas (na Figura 1 este material forma a zona mais escura e circundada pelas paredes das crateras maiores) na superfície lunar foi contemporâneo ao plutonismo nas terras-altas, mas por um período mais extensivo entre ~4.3 e~1.0 Ga (consultar tabela no fundo da página). As lavas iniciais foram expelidas durante o período de elevado bombardeamento da superfície lunar (~4.3 - 4.0 Ga, vulcanismo dos maria e formação das bacias), a partir de material remanescente do período de formação do sistema solar. Durante o período de elevado bombardeamento, as grandes bacias (crateras com anéis concêntricos) formaram-se e os seus interiores com um nível topográfico menor foi preenchido posteriormente com basaltos de mare (~3.9 – ~1.0 Ga, vulcanismo de maria pós formação de bacias). Estes dois tipos de lavas mostram características de composição químicas distintas, o que, com a diferença de idade, permitem o estudo da evolução, caracterização estrutural, e composição química do manto.


Vulcanismo Pré-Bacias (~4.3 – 4.0 Ga)

O vulcanismo anterior à formação das bacias é reforçado por dados obtidos por detecção remota e de fragmentos líticos encontrados em amostras de regolito (“solo” lunar) e brechas das terras-altas da colecção das missões Apollo e Luna (Shearer e Papike, 1999 e referências ai listadas). Existem dois tipos principais de rochas lunares extrusivas deste período inicial de actividade vulcânica: rochas basalto-KREEP e basaltos com elevado teor de Al.
Os basaltos-KREEP mostram um teor de Al e elementos incompatíveis relativamente alto e a sua idade de cristalização é de 4.10 a 3.85 Ga (Nyquist and Shih, 1992). Outros dados analíticos obtidos para este tipo de basaltos sugerem que este tipo de basalto mostra afinidades com as rochas do Grupo-Mg (Nyquist and Shih, 1992).
Os basaltos com elevado teor de Al têm composição química e textura semelhantes aos basaltos dos maria. Estes basaltos mostram uma grande variabilidade no teor de LREE (elementos terras-raras leves; Shearer e Papike, 1999 e referências ai listadas). As suas idades variam entre 4.3 e 4.0 Ga (Nyquist and Shih, 1992) e sugerem que estas rochas têm uma idade até 200 Ma superior aos basaltos-KREEP, no entanto a existência destes basaltos na formação geológica Fra Mauro da missão Apollo 14, sugerem que a origem e período extrusivo dos basaltos-KREEP e basaltos com elevado teor de Al ocorreu durante o mesmo período (Nyquist and Shih, 1992).
Durante as últimas três décadas vários modelos para geração destes dois tipos de basaltos têm vindo a ser desenvolvidos. Estes modelos são complexos e consistem em variáveis geoquímicas que são para além deste texto, mas se o leitor desejar mais informação relativa ao assunto, sugere-se a leitura de Shearer e Papike (1999) e das referências ai listadas.


Vulcanismo pós formação de bacias (~4.0 – ~1.0 Ga)

Os basaltos que constituem os maria cobrem aproximadamente ~17% da superfície lunar e representam cerca de 1% do volume da crosta lunar. A sua distribuição concentra-se no lado visível da Lua a preencherem o interior das grandes crateras de impacto com multi-anéis e depressões irregulares. Esta distribuição é, de uma maneira simplista, devido à existência de uma crosta fina no lado visível da Lua e a atracão gravitacional da Terra. A espessura das lavas que constituem os maria varia entre 0.5 km e 1.3 km, sendo as mais espessas encontradas nas zonas centrais das bacias mais jovens (~4.5 km). O modo típico de erupção é caracterizado por grandes volumes de lavas oriundas de uma região profunda, e por taxas de difusão elevadas (Head e Wilson [1992] e Head et al. [1997]). Há também evidência de erupções do tipo “jactos de fogo”. Devido à existência de esferas de vidro (Meyer et al. [1975], Delano [1979, 1980, 1986], e referências mencionadas por estes autores), que representam o congelamento imediato de lavas pós-erupção, e da existência de zonas na superfície lunar que mostram uma cobertura escura constituída de depósitos vulcânicos (Head [1974], Heiken et al. [1974], Coombs [1990], Coombs e McKay [1991], Head e Wilson [1992], e Weitz e Head [1998]).
As erupções dos basaltos dos maria abrangem um vasto período desde ~4.0 Ga até tão recentemente como ~1.0 Ga, um período que começa com os últimos eventos relacionados com a formação da bacias de multi-aneis e que continuou por quase 3000 milhões de anos. Este tipo de informação relativa ao período de extrusão de basaltos na superfície lunar foi, até há pouco tempo, só reconhecido através de dados obtidos por detecção remota. No entanto, os últimos dados isotópicos obtidos por Fernandes et al. (2003a e 2003b) começam a mostrar a existência de amostras com idades que correspondem a um alargamento do período de vulcanismo previamente determinado. A determinação de idades de amostras de basaltos tem sido feita usando vários sistemas de isótopos (chamados relógios isotópicos) e em vários casos as amostras mostram mais do que uma idade. Este tipo de disparidade sugere que as amostras tiveram uma história complexa desde o momento da sua formação.
Mapa da concentração de Titânio no solo da superfície lunar. Crédito: Lunar and Planetary Institute
Apesar das idades determinadas até recentemente, das amostras na colecção, e usando vários métodos de datação, estas mostram um período de vulcanismo na Lua mais restrito (~4.0 to ~3.2 Ga, Nyquist and Shih, 1992). Dados de detecção remota já tinham sugerido indícios de que o período eruptivo foi mais extenso do que aquele que as amostras mostravam, e principalmente indicando que erupções na Lua devem ter ocorrido tão recentemente como há 1000 milhões de anos (Boyce e Johnson [1977], Shanin et al. [1982], Wihlems [1987], Burgess e Turner [1998], e Hiesinger et al. [2000]).
Os basaltos dos maria exibem uma grande variedade não só de idades mas também da composição mineralógica e química, e a sua divisão é estabelecida por Shearer e Papike (1999) do seguinte modo:
  1. grande variação no teor de TiO2
  2. assinaturas mineralógicas e químicas de Fe, Ti and Cr reduzidos sugerem um restrito teor de oxigénio (fugacidade [fO2] normalmente designada por Fe-wüstite buffer)
  3. baixo teor de voláteis, elementos alcalinos e siderófilos
  4. ausência de água e minerais hidratados
  5. uma anomalia negativa de Eu em todos os basaltos cristalinos e vidros picríticos
Mapa da concentração de Ferro no solo da superfície lunar. Crédito: Lunar and Planetary Institute
Usando o teor de Ti como parâmetro para distinguir diferentes basaltos, três grupos são obtidos: Ti-elevado (TiO2 = 9 – 14 wt%), Ti-baixo a intermédio (TiO2 = 1 – 5 wt%) e Ti muito baixo (TiO2 < 1 wt%). Dados de detecção remota sugerem que a não existência de amostras de basaltos com teor de 5 a 9 wt% ser o resultado de um problema na obtenção de amostras (Pieters [1978 and 1990] and Giguerre et al. [1999 and 2000]), e que existe na realidade um contínuo no teor de Ti nos basaltos da superfície lunar. Vidros vulcânicos picríticos mostram uma variação ainda maior no teor de Ti do que os basaltos, entre ~0.2 a 16.4 wt% (Delano, 1986). A razão para este grande intervalo observado não é ainda muito bem compreendido. Modelos inicialmente desenvolvidos para desvendar este mistério ligavam o teor de Ti com a profundidade de onde o magma se tinha originado (as camadas bem definidas que resultaram do arrefecimento e diferenciação do LMO), no entanto resultados experimentais sugerem que na mesma pressão (equivalente à profundidade) diferentes basaltos, com diferente teor de Ti se formaram (ex. Delano [1980], Chen et al. [1983], Wagner and Grove [1997], Elkins-Tanton et al. [2000]). A maioria dos modelos concordam com o facto de que os basaltos dos maria são o produto de magmatismo tardio e que se formaram devido à fundição de um manto diferenciado (evoluído e não primitivo) e que possivelmente envolveu a mistura de magmas no interior lunar. Um estudo alternativo ou complementar por Delano e Fernandes (1998) sugere que as características químicas dos vidros vulcânicos picríticos verdes dos tipos A e B com baixo teor de Ti encontrados pela missão Apollo 14, aso devidas a processos nas zonas profundas onde os magmas foram formados (ex. Fundição dinâmica da região de origem). A profundidade da região de origem dos basaltos que compõe os maria pensa-se que tenha sido menor que a dos vidros basálticos picríticos. Finalmente, o vulcanismos dos maria após a formação das grandes crateras de impacto não mostra um fluxo continuo, mas sim a sua maior intensidade ocorreu durante 3.8 e 3.2 Ga. Mais detalhes à cerca deste período e modo de erupção podem ser encontrados em Shearer e Papike (1999) e Wieczorek et al. (2001).


Resumo das idades determinadas para rochas basálticas dos maria (Stöffler e Ryder [2001] e referências ai listadas).
Tipo de Rocha Idade (Ga) Missões
Rochas alcalinas4.03-4.34A14, A16
Basaltos KREEP
quartzo-monzodiorite
3.82-3.86
3.93-4.08
4.30±0.04
A15
A17
A15
Basaltos Elevado-K3.58±0.01A11
Basaltos elevado-Ti (B1-3)3.70±0.02
Basaltos High-Ti basalt (B2)3.80±0.02
Basalto elevado-Ti (D)3.85±0.01
Olivine basalt3.22±0.04A12
Basalto de Pigeonite3.15±0.04
Basalto de Ilmenite3.17±0.02
Basalto Feldspático3.20±0.08
Basalto Ol-norm3.30±0.02A15
Basalto Qz-norm3.35±0.01
Basalto Picritico3.25±0.05
Basalto Ilmenite3.35±0.04
Vidro verde3.3-3.4
Vidro amarelo3.62±0.07
Basalto feldspático3.74±0.05A16
Elevado-Ti (A)3.75±0.01A17
Elevado -Ti (B1/2)3.70±0.02
Elevado -Ti (C)3.75±0.07
Elevado -Ti (D)3.85±0.04
Vidro laranja3.5-3.6
Basalto Aluminouso3.41±0.04L16
Basalto muito baixo-Ti3.22±0.02L24