Mars Express. Crédito: ESA
A missão Mars Express/Beagle 2, da Agência Espacial Europeia (ESA), partiu do cosmódromo de Baikonur às 18:45, hora de Lisboa, do dia 2 de Junho de 2003 e está a caminho de Marte, onde chegará em Dezembro.

A comunidade científica em geral conta com esta missão para esclarecer alguns dos problemas que temos vindo a levantar, sobre a atmosfera, a geologia e a existência de água e de vida em Marte.

Os veículos da missão são dois: o módulo orbital Mars Express e o módulo de pouso Beagle 2.

O módulo orbital vai obter imagens de Marte numa gama de comprimentos de onda até hoje nunca atingida: infravermelhos, destinados a analisar a atmosfera e as rochas, visível, com que se obterão as primeiras imagens tridimensionais a cores de Marte, com uma resolução da ordem de 1,8 m, ultravioletas, também para analisar a atmosfera e micro-ondas. Este instrumento de micro-ondas (radar MARSIS) é verdadeiramente inovador na exploração marciana. Quando se encontrar em órbita de Marte, a Mars Express estenderá duas antenas com um comprimento total de 40 metros, que enviarão impulsos radar sobre o planeta e receberão os seus reflexos. O comprimento de onda escolhido é tal que se espera que estes impulsos possam atingir profundidades maiores que 2000 metros na crosta marciana, revelando-nos, assim, a sua estrutura geológica e a distribuição dos gelos sub-superficiais.

Beagle 2. Crédito: ESA
O Beagle 2 é o maior concentrado de tecnologia alguma vez enviado a um planeta. Tem apenas 85 cm de diâmetro (fechado), e pesa pouco mais de 60 kg. Apesar disso, inclui câmaras, um microscópio, dois espectroscópios, uma estação meteorológica e ... uma "toupeira" que poderá afastar-se poucos metros da sonda, enterrar-se alguns centímetros sob as rochas e recolher amostras para serem analisadas in situ.

Um conjunto de 17 investigadores portugueses, de 6 instituições (Instituto Geofísico da Universidade de Coimbra, Centro de Geossistemas do Instituto Superior Técnico, Centro de Astronomia e Astrofísica da Universidade de Lisboa, Universidade Nova de Lisboa, Instituto do Ambiente e Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) vão colaborar com as equipas internacionais na análise dos dados da missão Mars Express/Beagle 2.

É o projecto MAGIC - Mars Atmospheric, Geophysical and Exobiological Characterisation - Caracterização Atmosférica, Geofísica e Exobiológica de Marte.

Como resultado deste projecto, esperamos apresentar, até 2006, pelo menos oito produtos:
  1. Cartografia tridimensional da superfície marciana, visualisável por imersão num ambiente de realidade virtual.
  2. Um perfil pressão-temperatura-densidade deduzido da trajectória de entrada do B2.
  3. Cartografia da inércia térmica aparente de Marte.
  4. Cartografia litoestrutural de Marte.
  5. Cartografia do potencial hidrogeológico e exobiológico de Marte.
  6. Cartografia da distribuição horizontal do vapor de água atmosférico a baixa altitude.
  7. Avaliação do potencial biológico no local de pouso do B2.
  8. Cartografia geológica de Marte.

Várias outras missões de exploração de Marte estão a ser planeadas, ou já em curso. O ano presente é crítico pois, para além da Mars Express, deverão chegar a missão japonesa Nozomi e os dois Mars Exploration Rovers, da NASA, chegarão em Janeiro de 2004.

A sonda Nozomi. Crédito: Agência Espacial Japonesa
A missão Nozomi ("esperança"), inicialmente chamada Planet-B, foi lançada em 1998 mas vários problemas técnicos atrasaram-na, esperando-se que chegue a Marte quase ao mesmo tempo que a Mars Express. Os seus principais objectivos prendem-se com o estudo da estrutura e composição da atmosfera de Marte, e também do campo magnético planetário, incluindo a composição, estrutura temperatura e ondas de plasma na ionosfera. Uma pequena câmara a bordo obterá imagens do planeta e dos seus dois satélites, que têm sido um pouco esquecidos pelas missões mais recentes.

Os Mars Exploration Rovers foram lançados em Julho de 2003, como a Mars Express, e chegarão a Marte em Janeiro de 2004, pousando em locais diferentes com uma técnica semelhante à que foi bem sucedida com a Mars Pathfinder (pára-quedas e airbags).

Cada um pesa cerca de 180 kg e está preparado para fazer um percurso de cerca de 4 km, obtendo imagens da superfície e analisando rochas e solos. Ao contrário do que é habitual, nesta missão todo o equipamento científico estará no solo, servindo os orbitadores apenas como veículos de transporte e para reemitir os dados da superfície para a Terra.

Mars Exploration Rover. Crédito: NASA
A NASA tem outras missões a Marte em estudo. Para 2005 prevêem o lançamento do Mars Reconnaissance Orbiter, que obterá imagens da superfície com muito alta resolução (da ordem dos 30 cm) e servirá como elo de ligação para as comunicações de futuras missões. Também estão previstos um rover de longo curso, para 2009, e uma missão de retorno de amostras geológicas para a Terra, depois de 2014.

Mas os planos da ESA para a exploração de Marte não se esgotam com a missão Mars Express/Beagle 2, longe disso. O programa mais ambicioso tem o nome de código Aurora e tem como fim último a colocação de um astronauta europeu na superfície de Marte até ao ano 2025. O projecto Melissa já está em curso, desde 2001, com o fim de estudar o ecossistema a bordo, incluindo a reciclagem de detritos e a produção de oxigénio e alimentos. A primeira missão espacial do programa Aurora - a ExoMars - está agora em estudo e deverá partir em 2009, levando a bordo um veículo que fará um percurso de pelo menos 30 km na superfície marciana, com dois objectivos bem definidos: procurar traços de vida passada ou presente e avaliar os riscos para os primeiros astronautas em Marte.

Esquema do rover ExoMars. Crédito: ESA
Como se viu ao longo das últimas semanas, a maioria dos problemas que Marte nos levanta tem uma componente geológica. Por isso é certo que entre os primeiros astronautas a pousar em Marte terá que estar um geólogo.

Quase todos nós sonhámos poder ser um dia astronautas. Para a maior parte dos que tiveram esse sonho, ele era inalcançável. Hoje já não o é. Com a adesão de Portugal como membro pleno da ESA é possível que o muito restrito corpo de astronautas europeus (doze homens e mulheres, seleccionados de entre trinta mil candidatos) venha a contar com portugueses. E, já que estamos a falar de sonhos alcançáveis, por que não ser um geólogo português um dos primeiros seres humanos em Marte?