Tempestade de granizo galáctica no Universo jovem

2015-01-16

Em cima: ilustração do fluxo de saída (vermelho) e do gás que flui para o quasar no centro (azul). Os aglomerados frios que aparecem nas inserções são expelidos da galáxia numa tempestade de granizo galáctica. Crédito: Tiago Costa. Em baixo: comparação do fluxo de saída – observação de telescópio (esquerda) e simulação de computador (direita). Crédito: Tiago Costa.
Duas equipas de astrónomos, lideradas por investigadores da Universidade de Cambridge, lançaram um olhar para trás no tempo, recuando aproximadamente 13 mil milhões de anos até à época em que o Universo tinha menos de 10% da sua idade actual, para determinarem de que forma os quasares
quasar
Os quasares são objectos extragalácticos extremamente brilhantes e compactos. Hoje acredita-se que são o centro de galáxias muito energéticas ainda num estado inicial da sua evolução (são, pois, núcleos galácticos activos - NGAs) e a sua energia provém de um buraco negro de massa muito elevada. Os seus desvios para o vermelho indicam que se encontram a distâncias cosmológicas. O seu nome, quasar, vem do inglês quasi-stellar object, ou seja, objecto quase estelar, devido à semelhança da sua imagem em placas fotográficas com a imagem de uma estrela.
- objectos extremamente luminosos alimentados por buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
gigantescos com massas
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
de um milhar de milhões de sóis - regulam a formação de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
e a construção das galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
de maior massa.

Usando uma combinação de dados recolhidos a partir de poderosos telescópios de rádio
rádio
O rádio é a banda do espectro electromagnético de maior comprimento de onda (menor frequência) e cobre a gama de comprimentos de onda superiores a 0,85 milímetros. O domínio do rádio divide-se no submilímetro, milímetro, microondas e rádio.
e também simulações realizadas em supercomputadores, as equipas descobriram que um quasar cospe gás frio a velocidades que podem chegar aos 2000 km/s e a distâncias de aproximadamente 200 mil anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
- muito superiores às que já tinham sido observadas.

O modo como este gás frio - matéria-prima para a formação de estrelas nas galáxias – pode ser acelerado
aceleração
A aceleração é a taxa de variação da velocidade de um corpo com o tempo.
até velocidades tão elevadas permanecia, até agora, um mistério. Mas comparações detalhadas das novas observações e simulações em supercomputadores levaram a que os investigadores entendessem finalmente o processo: o gás é primeiro aquecido a temperaturas de dezenas de milhões de graus pela energia libertada pelo buraco negro de grande massa que alimenta o quasar. Este enorme aumento de pressão acelera o gás quente e empurra-o para a periferia da galáxia.

As simulações em supercomputadores mostram que, no trajecto de saída da galáxia, há tempo suficiente para uma parte do gás quente arrefecer até temperaturas relativamente baixas que permitem a sua observação através de telescópios de rádio.

Os resultados desta pesquisa deram origem a dois artigos diferentes, publicados a 16 de Janeiro nas revistas Monthly Notices da Royal Astronomical Society e Astronomy & Astrophysics.

Os quasares estão entre os objectos mais luminosos do Universo, e os mais distantes estão tão longe que nos permitem recuar milhares de milhões de anos no tempo. São alimentados por buracos negros de enorme massa no centro de galáxias, cercados por uma região em forma de disco contendo gás que gira rapidamente. À medida que o buraco negro arrebata a matéria que se encontra na sua vizinhança, são libertadas enormes quantidades de energia.

"É a primeira vez que observamos o gás frio que se escoa a mover-se a estas velocidades enormes e a distâncias tão grandes do buraco negro de grande massa", disse Claudia Cicone, estudante de doutoramento do Laboratório Cavendish de Cambridge e do Instituto Kavli de Cosmologia, principal autora do primeiro dos dois artigos. "É muito difícil vermos matéria a temperaturas tão baixas a mover-se tão depressa."

As observações de Cicone permitiram à segunda equipa de investigadores, especializada em simulações em supercomputadores, desenvolver um modelo teórico detalhado do gás escoado em torno de um quasar brilhante.

"Descobrimos que, enquanto o gás vai sendo cuspido pelo quasar a temperaturas muito elevadas, há tempo suficiente para uma parte arrefecer por radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
– um arrefecimento semelhante ao da Terra numa noite sem nuvens", disse Tiago Costa, estudante de doutoramento do Instituto de Astronomia e do Instituto Kavli de Cosmologia, principal autor do segundo artigo publicado. "O mais surpreendente é as condições nesta galáxia distante do Universo jovem serem exactamente as certas para que uma parte suficiente do gás quente em movimento rápido arrefeça até às baixas temperaturas descobertas pela Claudia e pela sua equipa."

Trabalhando no interferómetro IRAM Plateau De Bure, nos Alpes franceses, os investigadores reuniram dados na banda milimétrica, que permite a observação da emissão do gás frio, o principal combustível para a formação de estrelas e o principal componente das galáxias, e que é quase invisível em outros comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
.

A investigação foi apoiada pelo STFC (Science and Technology Facilities Council) do Reino Unido, pelo Isaac Newton Trust e pelo Conselho Europeu de Investigação (ERC). As simulações computacionais foram executadas com o supercomputador DARWIN Cluster, operado pelo High Performance Computing Service da Universidade de Cambridge.

Fonte da notícia: http://www.cam.ac.uk/research/news/galactic-hailstorm-in-the-early-universe