De uma estrela em colapso nascem e fundem-se dois buracos negros

2013-11-07

Em cima: Dois buracos negros que surgem pelo colapso de uma estrela super gigante, a partir de uma simulação por Christian Reisswig. Crédito: Christian Reisswig (Caltech). Em baixo: As várias etapas do colapso de uma estrela de enorme massa fragmentada. Cada painel mostra a distribuição da densidade em relação ao plano equatorial. A estrela gira tão rapidamente que a configuração no início do colapso (painel superior esquerdo) é quase toroidal (a densidade máxima é descentrada produzindo assim um anel de densidade máxima). A simulação termina após o buraco negro se te formado (painel inferior direito). Crédito: Christian Reisswig/Caltech.
Os buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
, os objectos mais densos do Universo com forças gravitacionais tão fortes que nem mesmo a luz pode escapar delas, podem ter vários tamanhos. Na extremidade inferior da escala ficam os buracos negros de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
estelar que são formados durante a morte de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
. Na extremidade superior, ficam os buracos negros gigantescos que contêm até mil milhões de vezes de vezes a massa do Sol
massa solar
Massa solar é a quantidade de massa existente no Sol e, simultaneamente, a unidade na qual os astrónomos exprimem as massas das estrelas, nebulosas e galáxias. Uma massa solar é igual a 1,989x1030 kg.
. Ao longo de milhares de milhões de anos, os pequenos buracos negros podem crescer lentamente até se tornarem enormes, assimilando a massa em seu redor e também fundindo-se com outros buracos negros. Mas este lento processo não consegue explicar o enigma de existirem buracos negros gigantes no início do Universo, que se terão formado mil milhões de anos após o Big Bang.

Agora, novas descobertas realizadas por investigadores do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) podem ajudar a testar um modelo para resolver este enigma.

Alguns modelos de crescimento de buracos negros de massa gigantesca exigem a presença de buracos negros originais que resultam da morte precoce de estrelas. Estes buracos negros originais ganham massa e aumentam de tamanho recolhendo matéria em seu redor, um processo chamado acreção
acreção
Designa-se por acreção a acumulação de matéria (gás e poeira) para um astro central, como por exemplo um buraco negro, uma estrela, uma galáxia, ou um planeta.
, ou através da fusão
fusão
1- passagem do estado sólido ao líquido, por efeito do calor; 2- junção, união.
com outros buracos negros. "Mas nestes modelos prévios não havia tempo suficiente para que um buraco negro chegasse a tornar-se super gigante logo após o nascimento do Universo", diz Christian Reisswig, pós-doutorando Einstein em Astrofísica na Caltech e principal autor do estudo. "O crescimento de buracos negros até à categoria dos super gigantes na fase inicial do Universo só parece ser possível se a massa do objecto que colapsa já for suficientemente grande", diz ele.

Para investigar as origens dos buracos negros primordiais de massa gigantesca, Reisswig, em colaboração com Christian Ott, professor assistente de astrofísica teórica, e seus colegas, virou-se para um modelo que envolve estrelas de enorme massa. Existe a hipótese de estas estrelas gigantes
estrela gigante
Uma estrela gigante é uma estrela que terminou o processo de fusão de hidrogénio no seu núcleo e, por isso, arrefeceu e expandiu-se. As estrelas gigantes são o estado evoluído das estrelas anãs. Terminada a fusão de hidrogénio em hélio no núcleo, pode ocorrer um dos seguintes processos, ou os dois: a fusão de hidrogénio em hélio numa camada à volta do núcleo, ou a fusão de hélio em carbono e oxigénio no núcleo. As estrelas gigantes são muito luminosas: num diagrama Hertzsprung-Russell, o ramo das estrelas gigantes é mais luminoso do que a sequência principal. Exemplo de estrelas gigantes próximas de nós: Aldebarã, Arturus e Capela.
, um tanto exóticas, terem existido durante apenas um breve período de tempo no início do Universo. Ao contrário das estrelas comuns, as estrelas de enorme massa são estabilizadas em devido à sua própria radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
de fotões
fotão
O fotão, muitas vezes referido como a partícula de luz, é o quantum do campo electromagnético e é a partícula elementar da radiação electromagnética.
. Numa estrela com muita massa, a radiação de fotões – o fluxo de fotões que é gerado devido às altas temperaturas no interior da estrela - empurra gás para fora da estrela opondo-se à força gravitacional que puxa o gás para dentro. Quando as duas forças são iguais é atingido o equilíbrio hidrostático.

Segundo Reisswig, uma estrela de enorme massa vai arrefecendo lentamente ao longo da vida por perda de energia devida à emissão de fotões. À medida que a estrela arrefece, a sua densidade
densidade
Em Astrofísica, densidade é o mesmo que massa volúmica: é a massa por unidade de volume.
central aumenta lentamente tornando-se mais compacta. Este processo dura um par de milhões de anos até a estrela atingir densidade suficiente para se tornar gravitacionalmente instável e começar a entrar em colapso.

Estudos anteriores previram que quando estrelas de massa gigantesca colapsam mantêm a forma esférica, que provavelmente se torna achatada devido à rápida rotação (uma configuração de simetria axial). Associando a isto o facto de as estrelas que giram muito rapidamente tenderem a sofrer pequenas perturbações, Reisswig e os seus colegas previram que, durante o colapso, estas perturbações podem provocar desvios na configuração das estrelas para formas sem simetria axial. Tais perturbações, inicialmente pequenas, irão crescer rapidamente fazendo, em última análise, com que o gás no interior da estrela em colapso se aglutine e forme fragmentos de alta densidade.

Estes fragmentos irão orbitar o centro de gravidade da estrela e tornar-se cada vez mais densos à medida que forem recolhendo mais matéria durante o colapso; a sua temperatura irá também aumentar. E então ocorre um efeito interessante: a temperaturas suficientemente altas haverá energia disponível para se formarem pares electrão-positrão (partícula – antipartícula
antipartícula
Uma antipartícula é uma partícula elementar com a mesma massa que uma partícula comum, mas com todas as outras propriedades, tais como a carga eléctrica, ou o momento magnético, de sinal oposto. No caso do fotão, a partícula é a sua própria antipartícula.
). A criação destes pares irá causar perda de pressão, acelerando ainda mais o colapso; como resultado, os dois fragmentos em órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
acabarão por se tornar tão densos que um buraco negro se poderá formar em cada um deles. Os buracos negros poderão, então, entrar em movimento espiral em torno de um outro, antes de se fundirem para se tornarem num buraco negro maior. "Esta é uma nova descoberta", diz Reisswig. "Ninguém antes previu que uma única estrela em colapso poderia produzir um par de buracos negros que se fundem em seguida."

Reisswig e os seus colegas usaram super computadores para simularem uma estrela de massa gigantesca à beira do colapso. A simulação foi visualizada através de um vídeo, realizado pela combinação de milhões de pontos representando valores numéricos sobre a densidade, campos gravitacionais e outras propriedades dos gases que constituem as estrelas em colapso.

O vídeo pode ser visto aqui: http://www.youtube.com/watch?v=eTlF_0rJF8Y

Embora o estudo tenha envolvido simulações por computador e seja, desta forma, puramente teórico, na prática, a formação e fusão de pares de buracos negros pode dar origem a ondas gravitacionais tremendamente poderosas - ondas no tecido do espaço-tempo
espaço-tempo
O espaço-tempo é um conceito único introduzido por Albert Einstein no âmbito da Teoria da Relatividade Geral, que reconhece a união do espaço e do tempo.
, viajando à velocidade da luz
velocidade da luz
A velocidade da luz é a rapidez com que se propagam as ondas luminosas (ou radiação electromagnética). No vácuo, é igual a 299 790 km/s, sendo independente do referencial considerado.
– um fenómeno que, segundo Reisswig, provavelmente será visível nos limites do Universo. Observatórios terrestres, como o Laser
Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation (LASER)
A palavra LASER designa uma amplificação de luz por emissão estimulada de radiação. O princípio físico por trás deste fenómeno é a emissão estimulada: sob certas condições, um fotão atinge um átomo excitado e provoca a emissão de um fotão. O átomo emite dois fotões: o fotão estimulador, que passa incólume, e o fotão estimulado, que tem o mesmo comprimento de onda, a mesma fase, a mesma polarização e a mesma direcção de propagação que o fotão estimulador. Se cada um destes fotões estimular mais átomos, o feixe inicial de fotões é assim amplificado.
Interferometer Gravitational-Wave Observatory
(LIGO), dirigido pela Caltech, estão à procura de sinais destas ondas gravitacionais, que foram pela primeira vez previstas por Albert Einstein
Albert Einstein
(1879-1955). Albert Einstein nasceu em Ulm, na Alemanha. Como físico teórico, revolucionou a nossa compreensão do Universo. A sua contribuição para o avanço da Física Moderna foi única. Doutorou-se em 1905 pela Universidade de Zurique (Suíça), no mesmo ano em que interpretou o efeito fotoeléctrico, o movimento browniano, e lançou a Teoria da Relatividade Restrita. Publicou em 1916 a sua Teoria da Relatividade Geral e foi galardoado com o Prémio Nobel da Física em 1921.
na sua Teoria da Relatividade Geral
Teoria da Relatividade Geral
A Teoria da Relatividade Geral foi formulada por Albert Einstein em 1916 como expansão da Teoria da Relatividade Restrita (formulada em 1905) de forma a incluir o efeito da gravitação no espaço-tempo. Esta teoria propõe que o espaço-tempo é uma estrutura quadri-dimensional cuja curvatura é determinada pela presença de matéria. Neste sentido, a gravitação manifesta-se como curvatura do espaço-tempo, e não como uma força entre duas massas.
. Serão necessários, no futuro, observatórios espaciais especializados em fenómenos desta natureza para detectarem o tipo de ondas gravitacionais que irão confirmar estas descobertas recentes, diz Reisswig.

Para Ott, estes resultados têm implicações importantes em cosmologia, e explica: "O sinal emitido das ondas gravitacionais e a sua potencial detecção irá informar os investigadores sobre o processo de formação dos primeiros buracos negros super densos num ainda muito jovem Universo, e poderá vir a resolver algumas questões importantes (e a levantar outras) da história do Universo."

Estes resultados foram publicados na Physical Review Letters de 11 de Outubro, num artigo intitulado Formation and Coalescence of Cosmological Supermassive-Black-Hole Binaries in Supermassive-Star Collapse. Os autores e co-autores da Caltech no estudo incluem: Ernazar Abdikamalov, Roland Haas, Philipp Mosta. Outro dos co-autores do estudo, Erik Schnetter, é do Perimeter Institute for Theoretical Physics, no Canadá. O trabalho foi financiado pela NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
, pela Fundação Alfred P. Sloan, e pela Fundação Sherman Fairchild.

Fonte da notícia: http://www.caltech.edu/content/one-collapsing-star-two-black-holes-form-and-fuse