Chandra regista grande explosão em buraco negro "velho"

2012-05-02

À esquerda: uma imagem de M83, obtida pelo VLT, no Chile, operado pelo ESO. À direita: uma imagem composta mostrando, em cor-de-rosa, dados de raios-X do Chandra, e, em azul e amarelo, dados do Hubble no visível. A ULX está localizada perto da parte inferior da imagem. Crédito: ESO/VLT/Nasa/CXC/Curtin University/R.Soria et al./STScI/Middlebury College/F.Winkler et al. University/R. Soria et al., Optical: NASA/STScI/Middlebury College/F. Winkler et al.
Uma explosão extraordinária, produzida por um buraco negro
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
numa galáxia
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
próxima, forneceu provas directas de uma população de buracos negros estelares velhos e voláteis. A descoberta, feita por astrónomos através do Observatório Chandra
Chandra X-ray Observatory
O observatório de raios-X Chandra, lançado em 1999, faz parte do projecto dos Grandes Observatórios Espaciais da NASA. O seu nome homenageia Subrahmanyan Chandrasekhar, Prémio Nobel da Física em 1983. O Chandra detecta fontes de raios-X a milhares de milhões de anos-luz de nós. Observar em raios-X é a única forma de observar matéria muito quente, a milhões de graus Célsius. O Chandra detecta raios-X de regiões de alta energia, como por exemplo remanescentes de supernovas.
de Raios-X, lança um novo olhar sobre a natureza de uma classe misteriosa de buracos negros que podem produzir tanta energia em raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
como milhões de sóis irradiando em todos os comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
.

Usando o Chandra, os investigadores descobriram uma nova fonte de raios-X ultra-luminosos - ULX. As fontes ULX são objectos que emitem mais raios-X do que a maioria dos sistemas binários em que a estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
companheira orbita o que resta de uma outra que sofreu colapso (estrela de neutrões
estrela de neutrões
Uma estrela de neutrões é o remanescente de uma estrela de massa elevada que explodiu como supernova. Trata-se de um objecto muito compacto constituído essencialmente por neutrões, com apenas cerca de 10 a 20 km de diâmetro, uma densidade média entre 1013 e 1015 g/cm3, uma temperatura central de 109 graus e um intenso campo magnético de 1012 gauss.
ou buraco negro). A emissão extra de raios-X sugere à partida que as ULXs devem conter buracos negros com muito mais massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
do que os encontrados em outras partes da nossa galáxia.

As estrelas companheiras nas ULXs têm sido geralmente identificadas como estrelas jovens e de grande massa, o que implica que os seus buracos negros também deverão ser jovens. A última pesquisa indica, no entanto, que as ULXs podem conter buracos negros bem mais velhos e que algumas fontes poderão ter sido erradamente identificadas como jovens.

A nova e intrigante ULX está localizada em M83, uma galáxia espiral situada a cerca de 15 milhões de anos luz da Terra, e foi descoberta com o Chandra em 2010. Os astrónomos compararam os novos dados com imagens do Chandra obtidas em 2000 e 2001 e perceberam que a fonte tinha aumentado o seu brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
em raios-X pelo menos 3000 vezes, tornando-se, desde então, a mais brilhante fonte de raios-X em M83.

O aumento repentino do brilho da ULX de M83 é uma das maiores alterações de brilho em raios-X alguma vez observadas para este tipo de objectos, que geralmente não apresentam períodos de baixa actividade. Não foi encontrado qualquer sinal da ULX no histórico das imagens em raios-X feitas com Observatório Einstein em 1980, com o ROSAT
ROentgen SATellite (ROSAT)
O observatório espacial de raios-X ROSAT foi uma missão internacional entre a Alemanha, os Estados Unidos da América e o Reino Unido, lançada em 1990 e terminada em 1999. Dois instrumentos principais foram a bordo do satélite: um telescópio de raios-X e uma câmara de campo largo com o seu próprio sistema de espelhos.
em 1994, com o XMM-Newton
X-ray Spectroscopy Multi-Mirror Mission (XMM-Newton)
Satélite de raios-X da Agência Espacial Europeia colocado em órbita no dia 10 de Dezembro de 1999, com a ajuda de um foguetão Ariane 5. Este satélite é o segundo de uma série de missões no âmbito do programa espacial europeu de longo termo Horizon 2000.
da Agência Espacial Europeia
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
em 2003 e 2008, ou com observatório Swift
Swift Gamma-ray Burst Explorer
O observatório espacial Swift é uma missão da NASA em colaboração com outros países, lançada em Novembro de 2004 e com uma duração prevista de 2 anos. O objectivo é estudar as fulgurações de raios gama em vários comprimentos de onda. Para tal, conta com três instrumentos: o Burst Alert Telescope (BAT), que monitoriza o céu em raios gama à procura das fulgurações, o telescópio de raios-X XRT e o telescópio óptico e ultravioleta UVOT.
da NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
em 2005.

"A fulguração
fulguração
Uma fulguração é uma libertação de energia de forma explosiva da qual resulta um aumento rápido do brilho do astro no qual ocorre. São exemplo deste tipo de fenómenos as fulgurações solares, associadas às manchas solares, bem como as fulgurações de raios-X, que ocorrem em estrelas de neutrões, e de raios gama, que se sabe estarem relacionadas com as explosões de supernova.
desta ULX apanhou-nos de surpresa e foi o sinal concreto de que havíamos descoberto algo de novo sobre como crescem os buracos negros", disse Roberto Soria da Curtin University, na Austrália, que liderou o novo estudo. De acordo com os investigadores, o salto dramático no brilho em raios-X ocorreu provavelmente devido a um aumento súbito na quantidade de material que cai dentro do buraco negro.

Em 2011, Soria e os seus colegas usaram imagens no visível, do Observatório Gemini
Observatório Gemini
O Observatório Gemini é constituído por dois telescópios idênticos de 8,1 metros, um no Observatório de Mauna Kea, no Havai (Gemini Norte) e outro no Cerro Pachón, no Chile (Gemini Sul). As localizações estratégicas dos telescópios providenciam uma cobertura total do céu do Norte e do Sul. O Gemini é um consórcio internacional entre os Estados Unidos da América, o Reino Unido, o Canadá, o Chile, a Austrália, a Argentina e o Brasil, e é operado pela AURA.
e do Telescópio Espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
, onde descobriram uma fonte azul brilhante na posição da fonte de raios-X. O objecto não fora detectado previamente numa imagem do telescópio Magellan, obtida em Abril de 2009, nem numa imagem do Hubble, obtida em Agosto de 2009. A falta de uma fonte azul nas imagens anteriores indica que a estrela companheira do buraco negro é mais fraca, mais vermelha e tem uma massa muito menor do que a maioria dos companheiros que anteriormente foram directamente ligados a ULXs. A emissão brilhante e azul no visível observada em 2011 deve ter sido causada por uma acumulação dramática de material vindo da estrela companheira.

"Se a ULX apenas tivesse sido observada durante o seu pico de emissão de raios X, em 2010, o sistema poderia facilmente ter sido confundido com o de um buraco negro com um companheiro estelar de grande massa e muito mais jovem, de 10 a 20 milhões de anos", disse o co-autor William Blair, da Johns Hopkins University, em Baltimore.

O companheiro do buraco negro em M83 é provavelmente uma estrela gigante vermelha
estrela gigante vermelha
As estrelas gigantes vermelhas são estrelas gigantes com temperaturas à superfície entre 2500 e 3500°C, do tipo espectral M ou K. As estrelas gigantes são um estado evoluído de estrelas anãs, como o Sol - as estrelas anãs, ao terminarem o processo de fusão de hidrogénio no seu núcleo, arrefecem e expandem-se, evoluindo para estrelas gigantes. Um dos seguintes processos, ou os dois, ocorre agora: a fusão de hidrogénio em hélio numa camada à volta do núcleo; a fusão de hélio em carbono e oxigénio no núcleo. As estrelas gigantes são muito luminosas: num diagrama Hertzsprung-Russell, o ramo das estrelas gigantes é mais luminoso do que a sequência principal.
com, pelo menos, 500 milhões de anos e uma massa inferior a quatro vezes a do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
. Os modelos teóricos para a evolução das estrelas sugerem que o buraco negro deve ser quase tão antigo como a sua companheira.

Outra ULX contendo um volátil e velho buraco negro foi recentemente descoberta na galáxia de Andrómeda
M31 (NGC 224) - Galáxia de Andrómeda
M31 é a galáxia de Andrómeda, a maior galáxia do chamado Grupo Local de galáxias. É uma galáxia espiral gigante, situada a uma distância de 2,4 milhões de anos-luz.
por Amanpreet Kaur, da Clemson University, e colegas, resultado publicado na edição de Fevereiro de 2012 de Astronomy and Astrophysics. Matthew Middleton e os seus colegas da Universidade de Durham divulgaram mais informações na edição de Março de 2012 da Monthly Notices da Royal Astronomical Society. Usaram dados do XMM-Newton do Chandra e do Hubble para mostrarem que a ULX é altamente variável e o seu companheiro uma velha estrela vermelha.

"Com estes dois objectos, começa a ser claro que existem duas classes de ULXs, uma contendo buracos negros jovens, crescendo persistentemente, e a outra contendo buracos negros velhos que crescem de forma irregular", disse Kip Kuntz, um co-autor do artigo, também da Johns Hopkins University. "Tivemos a sorte de observar o objecto da M83 no momento certo para podermos comparar o antes e o depois."

O artigo descrevendo os resultados será publicado na edição de 10 de Maio de The Astrophysical Journal.

Fonte da notícia: http://www.nasa.gov/mission_pages/chandra/news/H-12-139.html