Astrónomo amador Português colabora na descoberta de dois planetas extrasolares

2008-06-04

Esquema do trânsito de exoplaneta em frente da estrela (em cima). Curva de luz do exoplaneta XO-5b (em baixo). Crédito: João Gregório.
Em 1995, Michel Mayor e Didier Queloz, anunciavam ao mundo a descoberta do primeiro exoplaneta
planeta extra-solar
Um planeta extra-solar é um planeta que não orbita o nosso Sol.
, o 51 Peg-b. Aqueles dois astrónomos do Observatório de Genebra, na Suíça, abriram caminho a uma nova área da ciência astronómica: a detecção de planetas
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
para além do nosso sistema solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
.

No final de 1999 a comunidade de astrónomos amadores entrou nesta corrida quando um planeta, informalmente designado por Osíris, é capturado a transitar em frente da estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
HD 209458, na constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
do Pégaso, a 150 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
de distância. Foi o primeiro planeta extrasolar em que se captou a assinatura fotométrica durante um trânsito
trânsito
Designa-se por trânsito a passagem de um objecto astronómico à frente do disco de um objecto maior e mais longínquo. Por exemplo, o trânsito de Vénus diante do Sol.
em frente da sua estrela. Estava aberta a possibilidade de detecção de planetas extrasolares, com recurso a equipamentos modestos, normalmente utilizados pelos amadores.

O que é um Exoplaneta? Como se consegue detectá-lo?
Estas duas perguntas pertinentes são as primeiras a ser colocadas quando falamos de planetas fora do nosso sistema solar. Um exoplaneta é um planeta que orbita a sua estrela, da mesma forma que a Terra ou Júpiter
Júpiter
Júpiter é o quinto planeta mais próximo do Sol. Com um diâmetro cerca de 11 vezes maior do que a Terra e uma massa mais de 300 vezes superior, é o maior planeta do Sistema Solar e o primeiro dos planetas gigantes gasosos.
orbitam o Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
, a única diferença é que isto acontece fora do nosso sistema solar. Também designados por planetas extrasolares, a maior parte dos que já foram descobertos são gigantes gasosos, do tipo de Júpiter, mas apenas porque os meios de detecção existentes não possuem ainda a sensibilidade necessária para detectar planetas mais pequenos e que induzem variações de pouca amplitude na órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
da estrela em torno da qual orbitam. Existem vários métodos para conseguir detectar exoplanetas: Astrometria; Velocidade radial; Micro-lente gravitacional; Fotometria; Imagem.

De todos estes métodos, o que mais tem contribuído para o actual número de 294 planetas extrasolares é o método da velocidade radial, em que, de uma forma simples, se utiliza o efeito doppler para medir as perturbações do movimento de uma estrela, provocadas pela presença de planetas que a orbitam e que com ela partilham um centro de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
comum.

O método da fotometria, ou como é mais conhecido, do trânsito, é de extrema importância porque permite, em associação com o método de velocidade radial, determinar variados elementos físicos do sistema - a massa, o raio, o período orbital
período orbital
O tempo necessário para que um corpo descreva uma órbita completa e fechada em torno de outro corpo.
e a inclinação da órbita
inclinação de uma órbita
A inclinação da órbita de um astro é definida pelo ângulo entre o plano orbital do astro e outro plano de referência. No caso de um planeta do Sistema Solar, o plano de referência é o plano da órbita terrestre; no caso de um satélite, a referência é geralmente o plano equatorial do planeta.
do planeta. A detecção do exoplaneta é obtida através da medição da diminuta variação de intensidade da luz da estrela, quando o planeta, na sua órbita, passa (transita) em frente da estrela, conforme se ilustra na figura.

É precisamente a utilização deste método que permite aos astrónomos amadores, munidos dos seus modestos equipamentos, participar da busca por novos planetas extrasolares e contribuir para o desenvolvimento do conhecimento científico desta matéria.

A NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
, através do Space Telescope Science Institute, lançou um projecto, liderado por Peter McCullough e designado por "XO Project". Este projecto tem como objectivo a pesquisa fotométrica de planetas em torno de estrelas brilhantes. Numa tentativa de alargar a sua acção, foi criada uma "Extended Team" que disponibiliza aos astrónomos amadores dados sobre potenciais candidatos a exoplanetas, utilizando depois os dados obtidos pelos amadores para confirmar a existência daqueles planetas extrasolares.

Aos 47 anos, João Gregório, astrónomo amador e membro activo do Grupo Atalaia desde 2004, associou-se áquela equipa juntamente com mais dez astrónomos amadores da Europa e EUA. Com recurso ao seu equipamento amador, constituíu-se num dos co-descobridores de dois exoplanetas recentemente confirmados pelo projecto à comunidade científica internacional. Para alcançar estes resultados foram necessárias muitas noites em que realizou milhares de imagens, na esperança de conseguir obter evidências do trânsito do planeta em frente da sua estrela, medindo as ténues variações da curva de luz produzidas por aquele trânsito planetário.

Com muito trabalho e persistência, vê agora a sua dedicação ser reconhecida com a confirmação da existência de dois novos planetas extrasolares, o XO-4b e o XO-5b, ambos localizados na constelação do Lince, a uma distância aproximada de 960 anos-luz. João Gregório foi o primeiro a registar a curva de luz do XO-4b, um planeta 34% maior do que Júpiter com um período orbital de 4,125 dias, demorando 4h24' para transitar em frente da sua estrela.

Este é um excelente exemplo da contribuição séria e científica que os astrónomos amadores podem prestar no avanço do conhecimento da astronomia. Resta esperar que os resultados agora obtidos confirmem a continuidade de uma profícua e continuada participação da comunidade de astrónomos amadores em estreita colaboração com os profissionais, realizando o seu trabalho em prol do desenvolvimento da ciência.

Está pois de parabéns o João Gregório, bem como todos os outros que, junto com ele, participaram neste projecto. Que este seja apenas o primeiro de muitos outros resultados positivos.

Para saber mais sobre estes exoplanetas e o trabalho de João Gregório:

Página pessoal de João Gregório - http://www.atalaia.org/gregorio

Paper oficial do XO-4b - http://fr.arxiv.org/abs/0805.2921

Paper oficial do XO-5b - http://fr.arxiv.org/abs/0805.2399