O Quadrado Vermelho - simetria nos céus

2007-04-25

A nebulosa do Quadrado Vermelho. Composição de imagens obtidas com o telescópio Hale, de 5 m, no Observatório Palomar (Califórnia), e com o telescópio Keck II, de 10m, em Mauna Kea (Havai). Crédito: P. Tuthill/Palomar/Keck.
No dia 11 de Abril, um grupo de astrónomos anunciou em Pasadena, na Califórnia, a descoberta de um novo membro para o panteão de bonitos e exóticos objectos celestes. Baptizado de "Quadrado Vermelho" por Peter Tuthill, responsável da equipa, a imagem foi compilada a partir de dados obtidos com o telescópio Hale de 5 m do Observatório Palomar e com o telescópio Keck II
W. M. Keck Observatory
O Observatório W. M. Keck é operado pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e pela NASA, e encontra-se localizado em Mauna Kea, no Havai. O observatório é constituído por dois telescópios gémeos de 10 metros, o Keck I e o Keck II.
, de 10m, situado no topo de Mauna Kea, no Havai.

A descoberta foi publicada na edição da Science de dia 13 de Abril, sob o título "Uma nebulosa
nebulosa
Uma nebulosa é uma nuvem de gás e poeira interestelares.
bipolar simétrica em torno de MWC 922", artigo escrito por Tuthill, da Universidade de Sydney, e por James Lloyd, da Universidade de Cornell.

Segundo Tuthill, "Uma descoberta tão bonita e interessante como esta não surge com muita regularidade em astronomia. Foi necessário utilizar em simultâneo alguns dos mais avançados telescópios do mundo e juntar uma dose de sorte, para conseguir encontrar esta jóia escondida por entre a miríade de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
da galáxia
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
."

"A chave para encontrar a nebulosa está na nova e revolucionária técnica de imagem com recurso à óptica adaptativa
óptica adaptativa
A técnica de óptica adaptativa é um sistema óptico que se instala nos telescópios terrestres por forma a corrigir, em tempo real, os efeitos da turbulência atmosférica.
, que actua como uma espécie de cura para a miopia de um telescópio," concorda Lloyd. "Imagens inicialmente com pouca resolução, conseguem agora revelar, distintamente, objectos como este."

O par de astrónomos estava a estudar um estrela quente, MWC 922, localizada na constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
da Serpente. A imagem apresentada é uma combinação de dados obtidos no infravermelho próximo
infravermelho próximo
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 5 mícrones. Esta banda permite observar astros ou fenómenos com temperaturas entre 740 e 5200 graus Kelvin.
(1,6 microns
mícron (µm)
O mícron (µm), ou micrómetro, é uma unidade de comprimento que corresponde à milésima parte do milímetro: 1µm = 10-3mm = 10-6 m.
) e mostra uma região com a dimensão de 30,8 segundos de arco
segundo de arco (")
O segundo de arco (") é uma unidade de medida de ângulos, ou arcos de circunferência, correspondente a 1/60 de minuto de arco, ou seja, 1/3600 de grau.
de cada lado, em torno da estrela MWC 922. Uma vez que, comparativamente ao núcleo, a periferia exterior da nebulosa é demasiado esbatida, a imagem teve de ser processada e focada digitalmente de forma a mostrar toda a panóplia de detalhes e estruturas.

"O que realmente nos corta a respiração é o extraordinário grau de simetria apresentado pelas intrincadas formas lineares," disse Tuthill. "Se dobrarmos a imagem ao longo do eixo diagonal principal, obtemos uma reflexão simétrica quase perfeita. Quando comparado com objectos de idêntica complexidade, este facto torna a nebulosa do Quadrado Vermelho o objecto mais simétrico alguma vez
observado."

Toda a arquitectura de ambas as cavidades cónicas opostas entre si (normalmente conhecidas em astronomia como "nebulosa bipolar"), é vista como estando adornada de uma notória sequência de barras lineares bem definidas. Esta série de barras e superfícies cónicas ficam aninhadas, cada uma dentro de outra, até ao interior do coração do sistema, onde as superfícies bicónicas hiperbólicas são atravessadas por uma faixa negra, ao longo do eixo principal.

Um detalhe particularmente fascinante nesta imagem são as séries de raios radiais, tal como os dentes de um pente, que apontam para fora a partir do centro.

"Estruturas como estas são raramente observadas em nebulosas e, o elevado grau de regularidade deste caso, pode apontar-nos a intrigante possibilidade de que aquelas bandas possam ser sombras
projectadas por ondas na superfície de um disco interior, próximo da estrela, junto ao coração do sistema," diz James Lloyd.

No entanto, o mais compulsivo e importante facto para a astronomia, decorre da estrutura tridimensional implicada nas imagens do Quadrado Vermelho. "Se visualizarmos mentalmente a geometria tridimensional implicada nesta imagem," continua Tunhill, "vale a pena volta a olhar para uma das mais famosas imagens astronómicas de todos os tempos: a da supernova
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
SN1987A. Não se pretende com isto dizer que a estrela MWC 922, no centro do Quadrado Vermelho, esteja quase a explodir como uma supernova, mas é uma hipótese a considerar e, se assim acontecer, deverá produzir certamente um espectáculo fenomenal, à medida que for iluminando cada a regiões mais exteriores da nebulosa."

Seja qual for o destino da estrela central, a notória série de barras observada no Quadrado Vermelho, torna este objecto no melhor laboratório de astrofísica descoberto até à data no que respeita à física
envolvida na criação dos misteriosos sistemas em forma de anel, como os observados em torno da supernova SN 1987A.

Ainda segundo Tuthill, "Isto é apenas o início, pois um sistema tão fascinante e complexo como este, está certamente vocacionado para nos manter ocupados por muitos anos."

Fonte da notícia: http://www.keckobservatory.org/article.php?id=104