Os maiores mapas 3D do Universo

2006-05-23

Ilustração esquemática dos novos mapas 3D do SDSS, que incluem galáxias regulares (pontos pretos) e galáxias vermelhas luminosas (pontos vermelhos). A luz da galáxia mais distante leva 5,6 mil milhões de anos a chegar até nós; o Universo visível está a 13,7 mil milhões de anos-luz. Isto quer dizer que os mapas estendem-se até 5,6 mil milhões de anos-luz, ou seja, cerca de 40% da distância ao bordo do Universo visível. Os novos mapas do Universo permitiram aos astrónomos detectarem estruturas na distribuição de galáxias com mais de mil milhões de anos-luz de extensão. Crédito: Hogg, N. Padmanabhan (Princeton), SDSS-II collaboration.
Na semana passada, duas equipas independentes apresentaram os maiores mapas tridimensionais do Universo até agora construídos. Ambas chegaram a conclusões semelhantes através da análise dum conjunto de dados semelhantes do Sloan Digital Sky Survey
Sloan Digital Sky Survey (SDSS)
O levantamento do céu SDSS é um projecto que tem por objectivo mapear detalhadamente um quarto de todo o céu, determinando posições e magnitudes absolutas de 100 milhões de objectos celestes, e determinando ainda a distância a mais de 1 milhão de galáxias e quasares. Os telescópios que participam neste projecto estão situados no Observatório de Apache Point (EUA). O SDSS é um projecto conjunto de instituições norte-americanas, alemãs e japonesas.
- SDSS, mas não iguais. A teoria que o Universo é constituído essencialmente por energia escura e o restante é maioritariamente matéria escura
matéria escura
A matéria escura é matéria que não emite luz e por isso não pode ser observada directamente, mas cuja existência é inferida pela sua influência gravitacional na matéria luminosa, ou prevista por certas teorias. Por exemplo, os astrónomos acreditam que as regiões mais exteriores das galáxias, incluindo a Via Láctea, têm de possuir matéria escura devido às observações do movimento das estrelas. A Teoria Inflacionária do Universo prevê que o Universo tem uma densidade elevada, o que só pode ser verdade se existir matéria escura. Não se sabe ao certo o que constitui a matéria escura: poderão ser partículas subatómicas, buracos negros, estrelas de muito baixa luminosidade, ou mesmo uma combinação de vários destes ou outros objectos.
sai reforçada nas conclusões destes trabalhos.

Os mapas 3D de larga escala são essenciais para compreendermos a distribuição de matéria no Universo. Desde os anos 70 que os astrónomos constroem mapas com estruturas tridimensionais de galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
, mas os novos mapas cobrem distâncias muito maiores que os anteriores, permitindo, pela primeira vez, ver estruturas com uma extensão de mil milhões de anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
.

As variações na distribuição de galáxias que formam as estruturas de larga escala derivam directamente das variações em temperatura da radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
cósmica de fundo em microondas
microondas
A região do espectro electromagnético, no domínio do rádio, com comprimento de onda entre aproximadamente 1 mm e 30 cm (equivalente ao intervalo de frequências entre 300 GHz e 1 GHz) é a região das microondas.
. Isso quer dizer que ao comparar os novos mapas, que mostram o Universo com cerca de 8 mil milhões de anos, com os dados de microondas do satélite WMAP (por exemplo, ver notícia de 29/03/2006 ), que mostram o Universo com apenas algumas centenas de milhares de anos, os astrónomos podem testar a taxa de crescimento destas estruturas cósmicas.

Esta medição permite verificar se as estimativas teóricas da quantidade de energia escura estão correctas – pensa-se que a energia escura, responsável pela aceleração
aceleração
A aceleração é a taxa de variação da velocidade de um corpo com o tempo.
do Universo, dá conta de 3/4 da densidade
densidade
Em Astrofísica, densidade é o mesmo que massa volúmica: é a massa por unidade de volume.
do Universo, a matéria escura de 20%, e só menos de 5% do Universo é matéria dita normal.

De facto, os novos mapas mostram que as estruturas de larga escala estão distribuídas segundo as teorias mais correntes sobre a expansão acelerada do Universo e sobre a distribuiçâo de matéria escura.

Estes mapas revelam ainda a marca de ondas sonoras cósmicas do Universo jovem sob a forma de um padrão de picos na distribuição das galáxias, intervalados de 450 milhões de anos-luz. Estas ondas sonoras foram previstas em 1970 e detectadas pela primeira vez em 1999 como flutuações no fundo cósmico de microondas. No ano passado, foram detectadas pela primeira vez na distribuição de galáxias.

Para se construírem mapas 3D do Universo é necessária informação sobre a distância a que as galáxias se encontram. Este parâmetro é geralmente estimado medindo a alteração de cor causada pela expansão do Universo – o desvio para o vermelho
desvio para o vermelho (z)
Designa-se por desvio para o vermelho (em inglês, redshift) o desvio do espectro de um objecto para comprimentos de onda mais longos. O desvio para o vermelho pode dever-se ao movimento do objecto a afastar-se do observador (desvio de Doppler), ou à expansão do Universo (desvio para o vermelho cósmico, ou gravitacional). O desvio para o vermelho cósmico permite estimar a distância a que o objecto se encontra: quanto maior o desvio, mais distante o objecto. O desvio de Doppler permite calcular a velocidade a que o objecto se desloca.
– o que requer espectros das galáxias e a sua análise individual. É um método que toma demasiado tempo para que se constitua uma base de dados com um número significativo de galáxias para a construção de mapas de larga escala do Universo.

O grande salto nos novos mapas foi o facto das equipas utilizarem métodos automatizados para estimar distâncias, o que permitiu aumentar consideravelmente o número de galáxias com este parâmetro.

Os mapas foram apresentados por duas equipas independentes: uma pertence ao projecto Sloan Digital Sky Survey - SDSS e é liderada por N. Padmanabhan (Laboratório Nacional de Berkeley, EUA); a outra é formada por astrónomos do Canadá e do Reino Unido e é liderada pelo investigador da Universidade da British Columbia (Canadá), C. Blake.

Ambas as equipas focaram numa classe especial de galáxias, as galáxias vermelhas luminosas, que possuem cores intrínsecas muito regulares e bem compreendidas. As cores do SDSS-II para estas galáxias são extremamente precisas, o que permite efectuar uma boa calibração entre a cor e a distância deste tipo de galáxias.

A equipa de Padmanabhan baseou a sua calibração nas cores do SDSS-II e nas distâncias medidas através de espectros para cerca de 10 000 galáxias e contou com a colaboração da equipa anglo-australiana do 2dF. A observação precisa destas 10 000 galáxias permitiu obter distâncias para cerca de 600 000 galáxias! A perda de precisão inerente ao método é compensada pelo número de galáxias que podem utilizar. O mapa construído por esta equipa cobre cerca de um décimo do céu do norte e estende-se a 5,6 mil milhões de anos-luz de profundidade no espaço, equivalente a 40% para trás no tempo até ao Big Bang.

Por sua vez, a equipa de Blake treinou um algoritmo computacional via redes neuronais baseado em distâncias precisas, medidas através de espectros, para cerca de 13 000 galáxias vermelhas luminosas. O mapa desta equipa contém cerca de um milhão de galáxias, espalhadas por mais de 5 mil milhões de anos-luz.

Estas novas técnicas são extremamente importantes para projectos astronómicos de larga escala e prometem grandes avanços num futuro próximo.

Fontes da notícia:
http://www.ras.org.uk/index.php?option=com_content&task=view&id=1014&Itemid=2
http://www.sdss.org/news/releases/20060515.structure.html
http://www.lbl.gov/Science-Articles/Archive/Phys-universe-ruler.html