Enxames de galáxias podem ajudar a explicar a energia escura do Universo

2002-05-02
Os enxames de galáxias
enxame de galáxias
Um enxame, ou aglomerado, de galáxias é um conjunto de galáxias gravitacionalmente ligadas. A Via Láctea pertence ao aglomerado chamado Grupo Local de galáxias. O enxame de galáxias mais próximo de nós é o Enxame da Virgem.
consistem em milhares de galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
gravitacionalmente ligadas entre si em enormes estruturas. Devido à expansão do Universo, os enxames a maiores desvios para o vermelho
desvio para o vermelho (z)
Designa-se por desvio para o vermelho (em inglês, redshift) o desvio do espectro de um objecto para comprimentos de onda mais longos. O desvio para o vermelho pode dever-se ao movimento do objecto a afastar-se do observador (desvio de Doppler), ou à expansão do Universo (desvio para o vermelho cósmico, ou gravitacional). O desvio para o vermelho cósmico permite estimar a distância a que o objecto se encontra: quanto maior o desvio, mais distante o objecto. O desvio de Doppler permite calcular a velocidade a que o objecto se desloca.
, quando o Universo era mais jovem e mais denso, aparentam ser mais densos. Segundo Joseph Mohr, professor na Universidade do Illinois (EUA), os levantamentos de enxames de galáxias que examinam o Universo a grandes desvios para o vermelho podem potencialmente fornecer informação sobre a quantidade e a natureza tanto da matéria escura
matéria escura
A matéria escura é matéria que não emite luz e por isso não pode ser observada directamente, mas cuja existência é inferida pela sua influência gravitacional na matéria luminosa, ou prevista por certas teorias. Por exemplo, os astrónomos acreditam que as regiões mais exteriores das galáxias, incluindo a Via Láctea, têm de possuir matéria escura devido às observações do movimento das estrelas. A Teoria Inflacionária do Universo prevê que o Universo tem uma densidade elevada, o que só pode ser verdade se existir matéria escura. Não se sabe ao certo o que constitui a matéria escura: poderão ser partículas subatómicas, buracos negros, estrelas de muito baixa luminosidade, ou mesmo uma combinação de vários destes ou outros objectos.
como da energia escura.

"Até agora, os enxames de galáxias apenas foram usados para estudar a componente de matéria escura do Universo", salientou Mohr. "Nós medíamos a massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
total de um enxame de galáxias e determinavamos qual a fracção dessa massa que era constituída por matéria vulgar ou bariónica". Estas medições mostraram que a matéria bariónica
matéria bariónica
Matéria constituída por bariões - essencialmente, protões e neutrões. É a matéria "normal" que conhecemos, em oposição à matéria formada por eventuais partículas desconhecidas. Por exemplo, a Terra e o Sol são feitos de matéria bariónica.
e a matéria escura não são suficientes para justificar a geometria do Universo. Acredita-se agora que o Universo está a expandir-se a uma velocidade cada vez maior, e é dominado por uma misteriosa energia escura que é responsável por essa expansão.

Mohr propõe caracterizar a energia escura através da sua equação de estado, deduzindo-a com base no mapeamento da distribuição dos desvios para o vermelho dos enxames de galáxias. Utilizando dados recolhidos pelo observatório de raios-X Chandra
Chandra X-ray Observatory
O observatório de raios-X Chandra, lançado em 1999, faz parte do projecto dos Grandes Observatórios Espaciais da NASA. O seu nome homenageia Subrahmanyan Chandrasekhar, Prémio Nobel da Física em 1983. O Chandra detecta fontes de raios-X a milhares de milhões de anos-luz de nós. Observar em raios-X é a única forma de observar matéria muito quente, a milhões de graus Célsius. O Chandra detecta raios-X de regiões de alta energia, como por exemplo remanescentes de supernovas.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
), espera deduzir relações de proporcionalidade, tais como a relação entre massa e luminosidade
luminosidade
A luminosidade (L) é a quantidade de energia que um objecto celeste emite por unidade de tempo e em determinado comprimento de onda, ou em determinada banda de comprimentos de onda.
ou tamanho, de enxames de galáxias, e a forma como estas relações evoluem com o desvio para o vermelho, reflectindo a densidade
densidade
Em Astrofísica, densidade é o mesmo que massa volúmica: é a massa por unidade de volume.
crescente do Universo em tempos mais recuados.

Em particular, Mohr e os seus colaboradores estudam o efeito que os electrões
electrão
Partícula elementar pertencente à família dos leptões - partículas sujeitas à interacção nuclear fraca, electromagnética e gravitacional. Os electrões possuem carga eléctrica negativa e encontram-se nos átomos de todos os elementos químicos, orbitando à volta do núcleo atómico, que possui carga eléctrica positiva.
quentes, presentes no interior dos enxames de galáxias, têm sobre a radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
de fundo de microondas
microondas
A região do espectro electromagnético, no domínio do rádio, com comprimento de onda entre aproximadamente 1 mm e 30 cm (equivalente ao intervalo de frequências entre 300 GHz e 1 GHz) é a região das microondas.
- a impressão digital do Big Bang. Os enxames de galáxias são constituídos por matéria escura, galáxias e gás quente. Os electrões presentes nesse gás dispersam os protões
protão
Partícula que, juntamente com o neutrão, constitui os núcleos atómicos. Todos os átomos têm pelo menos um protão e é o número de protões que determina o elemento químico do átomo. Os protões têm carga eléctrica positiva. Os protões são formados por três quarks (dois u e um d), são bariões (e hadrões), e o seu spin é um número semi-inteiro.
produzindo raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
. A emissão de raios-X diminui a maiores desvios para o vermelho devido às maiores distâncias envolvidas. "Existe também uma tendência para os electrões cederem alguma da sua energia aos fotões
fotão
O fotão, muitas vezes referido como a partícula de luz, é o quantum do campo electromagnético e é a partícula elementar da radiação electromagnética.
da radiação de fundo de microondas, causando um ligeiro desvio no espectro do corpo negro", disse Mohr. "Esta distorção resultante - chamada efeito de Sunyaev-Zeldovich - surge, em certas frequências
frequência
Num fenómeno periódico, a frequência é o número de ciclos por unidade de tempo.
, como um ponto frio na radiação de fundo de microondas. Sendo uma distorção no espectro, no entanto, o efeito não depende da distância, como acontece com os raios-X".

Ao comparar a emissão de raios-X com o efeito de Sunyaev-Zeldovich, Mohr pode estudar enxames de galáxias mais obscurecidos, com maior desvio para o vermelho, que são actualmente inacessíveis através de outros meios. Estas medições, que relacionam a distribuição do desvio para o vermelho dos enxames de galáxias com a estrutura e a distribuição espacial, deverão determinar a equação de estado da energia escura e, dessa forma, ajudar a definir a essência da energia escura.

"No contexto do cenário padrão de formação de estruturas, os levantamentos de galáxias fornecem medições da geometria do Universo e a natureza da matéria escura e da energia escura", disse Mohr. "Mas para interpretarmos correctamente estes levantamentos, é preciso, primeiro, compreender a forma como a estrutura dos enxames de galáxias muda à medida que olhamos para trás no tempo".

Mohr e os seus colaboradores apresentaram os seus resultados durante um encontro da Sociedade Americana de Física, em Abril de 2002.

Notícia original: http://www.news.uiuc.edu/scitips/02/0422darkenergy.html