Eta Carinae tem uma companheira quente

2005-11-07

Em cima: imagem da nuvem bipolar de gás e poeira que envolve Eta Carinae, obtida pelo Hubble. Crédito: NASA e Jon Morse, Universidade do Colorado. Em baixo: visão artística do satélite FUSE. Crédito: JHU FUSE Project.
O satélite FUSE (NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
) permitiu aos cientistas detectarem, pela primeira vez, a companheira de Eta Carinae, uma das estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
de maior massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
e das mais invulgares da Via Láctea
Via Láctea
A Via Láctea é a galáxia de que faz parte o nosso Sistema Solar. Trata-se de uma galáxia espiral gigante, com um diâmetro de cerca de 160 mil anos-luz e uma massa da ordem de 100 mil milhões de vezes a massa do Sol.
. A detecção foi possível graças à sensibilidade incrível deste satélite aos comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
mais curtos do ultravioleta
ultravioleta
O ultravioleta á a banda do espectro electromagnético que cobre a gama de comprimentos de onda entre os 91,2 e os 350 nanómetros. Esta radiação é largamente bloqueada pela atmosfera terrestre.
, e porque a estrela companheira, tendo uma temperatura muito elevada, emite nesta região do espectro electromagnético
espectro electromagnético
O espectro electromagnético é a gama completa de comprimentos de onda da radiação electromagnética. Divide-se usualmente nas bandas dos raios gama, raios-X, ultravioleta, visível, infravermelho, submilímetro, milímetro, microondas (comprimentos de onda da ordem do centímetro) e rádio (comprimentos de onda superiores ao metro).
.

Eta Carinae é uma estrela variável irregular que está localizada a cerca de 7500 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
da Terra, na constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
da Quilha. Claramente visível a partir do hemisfério sul, pensa-se que esta estrela se está a aproximar rapidamente da fase final da sua vida e por isso tem sido objecto de um estudo intenso, durante décadas. Os cientistas suspeitavam que algumas das estranhas propriedades desta estrela poderiam ser explicadas pela existência de uma estrela companheira orbitando em seu torno, mas nunca encontraram evidências directas da sua existência.

Um forte argumento a favor de Eta Carina ser um sistema duplo de estrelas vem da variação cíclica da sua luz em diferentes comprimentos de onda (visível, raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
, rádio
rádio
O rádio é a banda do espectro electromagnético de maior comprimento de onda (menor frequência) e cobre a gama de comprimentos de onda superiores a 0,85 milímetros. O domínio do rádio divide-se no submilímetro, milímetro, microondas e rádio.
e infravermelho
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
), com um período de aproximadamente 5,5 anos. Uma segunda estrela, definindo uma órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
de 5,5 anos em torno de Eta Carinae, poderia ser a causa destas variações repetitivas.

A prova indirecta mais forte que sustenta a teoria de um sistema binário tem sido a de que, uma vez em cada 5,5 anos, a emissão de raios-X desaparece durante 3 meses. Sabe-se que Eta Carinae é demasiado fria para produzir raios-X, mas envia continuamente para o espaço uma torrente de gás, como um vento estelar, a 482,79 km/s. Se a sua companheira tiver um vento similar, os ventos estelares colidirão com uma força suficiente para produzir raios-X, numa região que deverá situar-se algures entre as duas estrelas. Ora, em determinada altura, durante a sua órbita, Eta Carinae passa em frente à região em que os ventos estelares colidem, quando vistos da Terra. Então, uma vez em cada 5,5 anos, Eta Carina eclipsa a emissão de raios-X. O último eclipse
eclipse
Um eclipse é uma ocultação total ou parcial de um corpo celeste, quando outro corpo passa entre este e o observador.
dos raios-X começou a 29 de Junho de 2003.

A órbita de 5,5 anos situa a estrela companheira a uma distância de Eta Carinae que é apenas dez vezes superior à distância Terra-Sol. O sistema está demasiado longínquo para que os telescópios possam distinguir as duas estrelas numa órbita tão próxima.

Uma forma mais directa de provar que se trata de um sistema duplo seria detectar a luz da segunda estrela, que neste caso é muito mais ténue do que Eta Carinae. Alguns cientistas procuraram a luz da estrela companheira usando telescópios em Terra, mas as tentativas não tiveram sucesso. Uma vez que se pensa que a companheira é muito mais quente do que Eta Carinae, os astrónomos calcularam que ela seria mais brilhante em comprimentos de onda menores, como os da luz ultravioleta. Contudo, nem mesmo as capacidades do Telescópio Espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
(NASA/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
) para a detecção da radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
ultravioleta foram bem sucedidas.

O satélite FUSE pôde, no entanto, realizar observações em comprimentos de onda do ultravioleta mais curtos do que os alcançados pelo Hubble – no ultravioleta longínquo. Uma equipa de cientistas, liderada por Rosina Iping, da Universidade Católica da América, em Washington, realizou observações com este satélite a 10, 17 e 27 de Junho de 2003, mesmo antes do esperado eclipse dos raios-X. E, com efeito, a luz no ultravioleta longínquo, observada a 10 e a 17, dissipou-se a 27, dois dias antes do eclipse de raios-X.

O desaparecimento da luz do ultravioleta longínquo tão perto da ocorrência do eclipse implica que, quando Eta Carinae oculta os raios-X, também oculta a sua estrela companheira. A emissão no ultravioleta longínquo é então, com certeza, proveniente da companheira de Eta Carinae, que deverá ser uma estrela bem mais quente, que emitir nestes comprimentos de onda. Esta é, portanto, a primeira evidência directa de que a estrela companheira realmente existe.

Esta descoberta foi publicada a 1 de Novembro de 2005 no Astrophysical Journal Letters, por Rosina Iping, George Sonneborn e Ted Gull do Centro Goddard para o Voo Espacial (NASA), Derck Massa do SGT Inc. e John Hiller da Universidade de Pittsburgh.

Fonte da notícia: http://www.nasa.gov/vision/universe/starsgalaxies/companion_star.html