Alimentando o monstro – imagens do VLT revelam a vizinhança de um gigantesco buraco negro

2005-10-28

Em cima: A região central de NGC 1097 (5500 anos-luz). Imagem obtida pelo sistema de óptica adaptativa NACO do VLT. Mais de 300 zonas de formação de estrelas (pontos brancos) estão distribuídas ao longo do anel de gás e poeira. No centro do anel uma fonte brilhante, onde está localizado o núcleo galáctico activo e o seu gigantesco buraco negro. A imagem foi composta por sobreposição das bandas J – (azul), H – (verde) e Ks (vermelho). Ao centro: A mesma região nas bandas J-Ks. O núcleo é claramente visível, assim como a zona central dos braços em espiral, estendendo-se a 1300 anos-luz do centro, e o anel de formação de estrelas. Em baixo: A mesma região depois de aplicada uma máscara à imagem, de forma a suprimir a forte luz estelar difusa da galáxia. Os braços em espiral são agora vistos como canais escuros, alguns estendendo-se até ao anel de formação estelar. Crédito: ESO.
Imagens da galáxia activa
galáxia activa
Uma galáxia diz-se activa quando emite quantidades excepcionalmente elevadas de energia. São exemplo de galáxias activas as galáxias Seyfert, as radiogaláxias, os quasares e as galáxias com surtos de formação de estrelas (starburst galaxies).
NGC 1097, obtidas no infravermelho próximo
infravermelho próximo
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 5 mícrones. Esta banda permite observar astros ou fenómenos com temperaturas entre 740 e 5200 graus Kelvin.
pelo VLT
Very Large Telescope (VLT)
O Very Large Telescope é um observatório operado pelo Observatório Europeu do Sul (ESO) e localizado no Cerro Paranal, no deserto de Atacama, no Chile. O VLT é composto por 4 telescópios de 8,2 m de diâmetro que podem trabalhar simultaneamente, constituindo um interferómetro óptico, ou independentemente.
(ESO
European Southern Observatory (ESO)
O Observatório Europeu do Sul é uma organização europeia de Astronomia para o estudo do céu austral fundada em 1962. Conta actualmente com a participação de 10 países europeus e ainda do Chile. Portugal tornou-se membro do ESO em 1 de Janeiro de 2001, no seguimento de um acordo de cooperação que durou cerca de 10 anos.
), graças ao instrumento de óptica adaptativa
óptica adaptativa
A técnica de óptica adaptativa é um sistema óptico que se instala nos telescópios terrestres por forma a corrigir, em tempo real, os efeitos da turbulência atmosférica.
NACO, revelaram com um detalhe sem precedentes uma complexa rede de estrutura filamentar em movimento espiral na direcção do centro desta galáxia
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
. Estas observações fornecem, pela primeira vez, uma visão detalhada da forma como os buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
elevadíssima, escondidos no centro das galáxias, se "alimentam", com pormenores do processo de canalização de matéria até ao núcleo galáctico.

Localizada a uma distância de 45 milhões de anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
na constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
de Fornax, NGC 1097 é uma galáxia espiral com barra, relativamente brilhante, observada de frente. Com magnitude 9,5 (25 vezes mais ténue do que o objecto mais ténue que pode ser observado à vista desarmada), aparece nos pequenos telescópios como um pequeno disco brilhante. Trata-se de um exemplo muito moderado de um núcleo galáctico activo (NGA), cuja emissão se julga ser resultante da queda de matéria (gás e estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
) no buraco negro central. No entanto, NGC 1097 possui um núcleo comparativamente imperceptível. O buraco negro no seu centro deve estar a seguir uma "dieta rigorosa", já que apenas uma pequena quantidade de gás e de estrelas parece estar a ser engolida num determinado momento.

Há muito tempo que os astrónomos estão a tentar entender de que forma é a matéria engolida por um buraco negro. A observação directa do processo requer uma resolução espacial muito elevada para o centro das galáxias. Tal resolução pode ser obtida através de interferometria
interferometria
A interferometria é uma técnica de observação baseada em padrões de interferência causados pela combinação de ondas electromagnéticas: quando duas ondas estão em fase, o sinal é mais forte e diz-se que a interferência é construtiva; quando as duas ondas estão exactamente fora de fase, a interferência é destrutiva e não há sinal.
(como já foi feito com o MIDI do VLT para a região central de outro NGA, o NGC 1068), ou então através de óptica adaptativa.

O quarto telescópio do VLT, o Yepun, tem acoplado um sistema de óptica adaptativa, o NACO, que conseguiu obter novas imagens do NGC 1097 com um detalhe sem precedentes. As imagens permitiram investigar a presença e a quantidade de material numa área muito próxima do núcleo. Foi alcançada uma resolução de 0,15 segundos de arco
segundo de arco (")
O segundo de arco (") é uma unidade de medida de ângulos, ou arcos de circunferência, correspondente a 1/60 de minuto de arco, ou seja, 1/3600 de grau.
, correspondente a uma extensão de 30 anos-luz – o que equivale a 8 vezes a distância entre o Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
e a sua estrela mais próxima, Próxima Centauro
Proxima Centauri
A Proxima Centauri, ou Próxima do Centauro, é a estrela mais próxima do Sol, a cerca de 4,22 anos-luz de distância, na direcção do Centauro. Integra um sistema triplo de estrelas com as estrelas α Cen A e &alpha Cen B.
.

Imagens da NGC 1097 mostram uma barra muito forte e um proeminente anel de formação de estrelas. No interior do anel, uma barra secundária cruza o núcleo numa direcção quase perpendicular à da primeira barra. As últimas imagens em infravermelho
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
obtidas pelo NACO mostram mais de 300 regiões de formação de estrelas (4 vezes mais que as mostradas nas imagens anteriormente obtidas pelo Telescópio Espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
)). Estas “regiões HII” são os pontos brancos que se podem ver na primeira das imagens da sequência da direita. No centro do anel localiza-se o núcleo galáctico moderadamente activo, mas os detalhes do núcleo e da sua vizinhanças são eclipsados pela intensa luz estelar da galáxia, a emissão brilhante e difusa que se estende por toda a imagem.

Aplicando uma técnica de máscara, os astrónomos eliminaram a luz estelar, revelando assim o núcleo brilhante, mas principalmente uma complexa rede de estruturas filamentares movendo-se em espiral em direcção ao centro. A rede é semelhante ás que se vêem em modelos de computador e os filamentos nucleares são os rastos da poeira e do gás que estão a ser canalizados para o centro, eventualmente para estimularem o NGA.

Os astrónomos notaram também que o padrão da espiral dentro de uma área mais interior, de 300 anos-luz, parece confirmar a existência de um buraco negro de massa elevadíssima. A presença de um buraco negro deste tipo no centro de NGC 1097 provoca um enrolamento completo da espiral nuclear à medida que ela se vai aproximando do centro, ao contrário do que aconteceria na sua ausência.

Os resultados deste estudo foram publicados no número de Outubro do Astronomical Journal, por Almudena Prieto (Instituto Max-Planck, Heidelberg, Alemanha), Witold Maciejewski (Universidade de Oxford, UK) e Juha Reunanen (ESO, Garching, Alemanha).

Fonte da Notícia: http://www.eso.org/outreach/press-rel/pr-2005/phot-33-05.html