Universo jovem era mais fértil do que se suspeitava

2005-09-23

Em cima: pequena região do céu (3 x 3 minutos de arco) observada no âmbito do levantamento VVDS. A imagem, obtida pelo Telescópio Canadá-França-Havai, tem indicada as 13 galáxias distantes descobertas nesta região. Crédito: Megacam/CFHT, ESO. Em baixo: as 970 galáxias distantes descobertas foram divididas em três grupos segundo o seu desvio para o vermelho – [1,4:2,5], [2,5:3,5] e [3,5:5,0] – e em cada grupo, os seus espectros foram combinados. Crédito: VIMOS/VLT, ESO.
Para compreendermos o Universo primitivo é necessário estudar como as galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
se formaram e evoluíram no Universo jovem. Um parâmetro essencial é o número de galáxias que estavam presentes no Universo em diferentes épocas.

Contar o número de galáxias que uma imagem de campo profundo detecta é relativamente fácil; o mais difícil é determinar a que época da história do Universo ela pertence. Para isso, obtêm-se espectros e mede-se o desvio para o vermelho
desvio para o vermelho (z)
Designa-se por desvio para o vermelho (em inglês, redshift) o desvio do espectro de um objecto para comprimentos de onda mais longos. O desvio para o vermelho pode dever-se ao movimento do objecto a afastar-se do observador (desvio de Doppler), ou à expansão do Universo (desvio para o vermelho cósmico, ou gravitacional). O desvio para o vermelho cósmico permite estimar a distância a que o objecto se encontra: quanto maior o desvio, mais distante o objecto. O desvio de Doppler permite calcular a velocidade a que o objecto se desloca.
da galáxia.

As galáxias mais velhas parecem-nos muito pouco brilhantes por estarem muito longe e requerem muito tempo de observação. Por isso, até agora, os levantamentos de galáxias distantes eram restringidos a galáxias já candidatas a elevados desvios para o vermelho, de forma a optimizar o tempo de telescópio.

Uma equipa de astrónomos europeus, liderada por O. Le Fèvre (Laboratório de Astrofísica de Marselha, França) e G. Vettolani (Instituto Nacional de Astrofísica/Instituto de Radioastronomia, Bolonha, Itália), está a levar a cabo um levantamento de zonas seleccionadas do céu utilizando o espectrógrafo multi-objecto VIMOS (Visible Multi-Object Spectrograph), montado no telescópio Melipal (um dos quatro telescópios de 8,2 m que formam o VLT
Very Large Telescope (VLT)
O Very Large Telescope é um observatório operado pelo Observatório Europeu do Sul (ESO) e localizado no Cerro Paranal, no deserto de Atacama, no Chile. O VLT é composto por 4 telescópios de 8,2 m de diâmetro que podem trabalhar simultaneamente, constituindo um interferómetro óptico, ou independentemente.
do ESO
European Southern Observatory (ESO)
O Observatório Europeu do Sul é uma organização europeia de Astronomia para o estudo do céu austral fundada em 1962. Conta actualmente com a participação de 10 países europeus e ainda do Chile. Portugal tornou-se membro do ESO em 1 de Janeiro de 2001, no seguimento de um acordo de cooperação que durou cerca de 10 anos.
). O VIMOS é um instrumento apropriado para este estudo, pois permite obter o espectro de 1000 galáxias numa só imagem.

O levantamento, chamado VVDS (VIMOS VLT Deep Survey), tem como objectivo medir, em certas zonas do céu, o desvio para o vermelho de todas as galáxias mais brilhantes que a magnitude 24 no comprimento de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
do vermelho.

De uma amostra de 8000 galáxias seleccionadas pelo seu brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
no vermelho, foram descobertas cerca de 1000 galáxias com grande actividade de formação de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
que se encontram a uma distâncias entre 9 e 12 mil milhões de anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
; são galáxias que estamos a ver quando o Universo tinha apenas entre 1500 e 4500 milhões de anos de idade.

Este resultado é surpreendente, pois o número de galáxias pertencente a esta época do Universo é entre 2 e 6 vezes superior ao que se esperava! A nossa compreensão do Universo jovem muda assim significativamente.

Em estudos anteriores, estas galáxias escaparam à detecção porque os levantamentos estavam sujeitos a restrições grandes, de forma a optimizar o tempo de telescópio. Só agora, com a capacidade multi-objecto do VIMOS associada a um grande telescópio, foi possível detectar muitas destas galáxias de uma forma eficiente.

Combinando os espectros de todas as galáxias com desvios para o vermelho pertencentes a um determinado intervalo (ou seja, pertencentes a uma determinada época), pode-se estimar o número de estrelas que se formaram nessas galáxias. Os astrónomos chegaram à conclusão que as galáxias no Universo jovem transformavam em estrelas, por ano, uma massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
entre 10 e 100 vezes a massa do nosso Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
– ou seja, as estrelas formaram-se duas a três vezes mais rapidamente do que se estimava.

Cabe agora aos teóricos explicarem como se cria uma população de galáxias tão numerosa, que produzem estrelas a um ritmo acelerado
aceleração
A aceleração é a taxa de variação da velocidade de um corpo com o tempo.
, quando o universo tinha cerca de 10 a 30% da sua idade actual.

Fonte da notícia: http://www.eso.org/outreach/press-rel/pr-2005/pr-24-05_p2.html