Spitzer descobre quasares escondidos

2005-08-13

Esta imagem, em cor falsa, é o resultado de uma sobreposição de duas: uma, em infravermelho, obtida pelo Telescópio Spitzer, e outra, no rádio, obtida pelo VLA. Ao centro, em amarelo, uma galáxia distante que alberga um quasar rodeado por um disco de gás e poeira. Os pontos azuis e verdes representam galáxias que não possuem quasares - dados do infravermelho. Os pontos vermelhos são dados de rádio. Crédito: NASA/JPL-Caltech/A. Martinez-Sansigre (Oxford University).
O Telescópio Espacial Spitzer
Spitzer Space Telescope
O Telescópio Espacial Spitzer é um telescópio de infravermelhos colocado em órbita pela NASA a 25 de Agosto de 2003. Este telescópio, anteriormente designado por Space InfraRed Telescope Facility (SIRTF), foi re-baptizado em homenagem a Lyman Spitzer, Jr. (1914-1997), um dos grandes astrofísicos norte-americanos do século XX. Espera-se que este observatório espacial contribua grandemente em diversos campos da Astrofísica, como por exemplo na procura de anãs castanhas e planetas gigantes, na descoberta e estudo de discos protoplanetários à volta de estrelas próximas, no estudo de galáxias ultraluminosas no infravermelho e de núcleos de galáxias activas, e no estudo do Universo primitivo.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
) conseguiu, pela primeira vez, mostrar-nos o que se passa para lá das barreiras de poeira galáctica que encobrem os gigantescos buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
existentes no coração de algumas galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
distantes. Os sensores de infravermelho
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
deste telescópio podem ter dado início à descoberta de uma população de buracos negros, enormes e devoradores, conhecidos como quasares
quasar
Os quasares são objectos extragalácticos extremamente brilhantes e compactos. Hoje acredita-se que são o centro de galáxias muito energéticas ainda num estado inicial da sua evolução (são, pois, núcleos galácticos activos - NGAs) e a sua energia provém de um buraco negro de massa muito elevada. Os seus desvios para o vermelho indicam que se encontram a distâncias cosmológicas. O seu nome, quasar, vem do inglês quasi-stellar object, ou seja, objecto quase estelar, devido à semelhança da sua imagem em placas fotográficas com a imagem de uma estrela.
e que os astrónomos há muito procuravam.

Os investigadores já previam a existência de um grande número de quasares escondidos, como resultado dos estudos realizados em raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
, no entanto nunca tinha sido possível encontrá-los. Foi necessário esperar pelas potencialidades do Spitzer, que conseguiu encontrar uma população inteira destes objectos obscurecidos pela poeira.

Os quasares, núcleos galácticos activos (NGAs) muito distantes, com buracos negros de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
elevadíssima rodeados por um disco gigantesco de gás e poeira, podem consumir uma massa equivalente à de um milhar de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
num único dia. À medida que os buracos negros engolem o material dos discos, esse material vai emitindo luz em muitos comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
, incluindo os raios-X, o visível e o infravermelho. A luz emitida é tão brilhante que faz dos quasares os objectos mais brilhantes do Universo.

Há anos que os astrónomos se questionam sobre o número de quasares que existirão no Universo. Um método standard para estimar esse número consiste em medir a radiação X cósmica de fundo. Em raios-X, os quasares ofuscam quase tudo o resto que existe no Universo. Avaliando o ruído de fundo dos raios-X, é possível fazer uma previsão do número total de quasares.

Mas esta estimativa não tem correspondido ao número de quasares previamente descobertos em observações de raios-X e de luz visível
radiação visível
A radiação visível é a região do espectro electromagnético que os nossos olhos detectam, compreendida entre os comprimentos de onda de 350 e 700 nm (frequências entre 4,3 e 7,5x1014Hz). Os nossos olhos distinguem luz visível de frequências diferentes, desde a luz violeta (radiação com comprimentos de onda ~ 400 nm), até à luz vermelha (com comprimentos de onda ~ 700 nm), passando pelo azul, anil, verde, amarelo e laranja.
, número que tem sido bem menor que o esperado. Os astrónomos pensaram que isto acontecia porque a maior parte dos quasares se encontra oculta por gás e poeira, fora do alcance dessas observações. Alguns quasares deverão estar posicionados de tal forma que os seus discos de poeira escondem a luz emitida, enquanto outros estarão sepultados em galáxias imersas em poeira.

O Spitzer parece ter conseguido encontrar os dois tipos de quasares desaparecidos, realizando observações no infravermelho. Ao contrário dos raios-X e da luz visível, a radiação infravermelha consegue penetrar através do gás e da poeira.

Os investigadores detectaram 21 exemplos destes quasares numa pequena área do céu. Todos eles foram confirmados como sendo quasares pelo radiointerferómetro VLA
Very Large Array (VLA)
O VLA é um radiointerferómetro composto por 27 antenas de 25 m de diâmetro, dispostas em três braços (em forma de Y) com 9 antenas cada, localizado no Novo México (EUA). O VLA é operado pelo NRAO (National Radio Astronomy Observatory).
e pelo Telescópio Herschel
William Herschel Telescope (WHT)
O telescópio William Herschel (WHT), com 4,2 m de diâmetro, pertence ao Grupo de Telescópios de Isaac Newton (ING), no observatório de Roque de Los Muchachos, em La Palma (Canárias). O WHT é o maior telescópio nos observatórios das Canárias e possui instrumentos que permitem uma grande variedade de observações astronómicas, desde câmaras de imagem a espectrógrafos, tanto de radiação visível como infravermelha, e ainda, um sistema de óptica adaptativa.
. Extrapolando para todo o céu o número de quasares detectados nesta área, chega-se a um número elevado. Isto significa que, tal como se suspeitava, os buracos negros gigantescos, na sua maior parte, crescem encobertos pela poeira.

Graças a esta descoberta, os astrónomos poderão, a partir de agora, esboçar uma imagem mais completa de como e quando os quasares se formaram no nosso universo. Dos 21 quasares descobertos pelo Spitzer, crê-se que 10 estão em galáxias elípticas gigantes, já muito desenvolvidas. Pensa-se que os restantes estão enclausurados em galáxias de poeira densa e ainda em formação.

Os resultados desta pesquisa foram publicados na revista Nature, no início deste mês, por uma equipa de investigadores liderada por Alejo Martinez-Sansigre, da Universidade de Oxford (Reino Unido), e da qual fazem parte outros cientistas da mesma universidade, do Spitzer Science Center da Universidade de Durham (Reino Unido) e do National Research Council do Canada.

Uma equipa da Universidade do Arizona em Tucson (EUA), descobriu um conjunto de quasares semelhantes, também através do Spitzer. Os resultados da sua pesquisa podem ser consultados em http://uanews.org/science.

Fonte da notícia: http://www.jpl.nasa.gov/news/news.cfm?release=2005-128