Raios cósmicos ajudam a estabelecer a cronologia da superfície terrestre

2005-07-27

Uma supernova como a desta imagem – a SN 1993J – emite fulgurações de raios cósmicos que bombardeiam a Terra e alteram a configuração atómica das rochas à sua superfície. Investigadores apoiados pelo projecto CRONUS irão medir os efeitos dos raios cósmicos para determinarem a cronologia de eventos geológicos passados. A escala de cores da imagem representa o brilho das emissões de rádio detectadas por radiotelescópios do VLA. O azul representa a emissão mais fraca e o vermelho a mais forte. Crédito: NRAO/AUI and N. Bartel, M. Bietenholz, M. Rupen, et al.
A colaboração CRONUS tem como objectivo medir os efeitos dos raios cósmicos provenientes de supernovas
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
distantes, de forma a estabelecer a cronologia das alterações da superfície da Terra. O esforço para atingir este objectivo é de tal forma significativo que dois consórcios decidiram reunir os esforços numa colaboração: o CRONUS-EU, financiado pela Comissão Europeia; e o CRONUS-Earth, financiado pela Fundação Nacional para a Ciência, dos Estados Unidos (NSF).

As explosões de supernovas que ocorrem nas galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
libertam torrentes de partículas atómicas altamente energéticas que constituem os raios cósmicos. Milhares de milhões destes raios cósmicos atingem a Terra em cada ano. As pequenas partículas colidem com átomos
átomo
O átomo é a menor partícula de um dado elemento que tem as propriedades químicas que caracterizam esse mesmo elemento. Os átomos são formados por electrões à volta de um núcleo constituído por protões e neutrões.
da atmosfera terrestre
atmosfera terrestre
A atmosfera terrestre é composta por um conjunto de camadas gasosas que envolvem a Terra. Estas camadas são designadas por Troposfera (da superfície da Terra até cerca de 10 km de altitude), Estratosfera (10 - 50 km), Mesosfera (50 - 100 km), Termosfera (100 - 400 km) e Exosfera (acima dos 400 km).
e de algumas rochas da superfície da Terra e são capazes de os transformar em novos elementos - é um fenómeno de transmutação, em que um átomo de um elemento químico
elemento químico
Elemento composto por um único tipo de átomos. Os elementos químicos constituem a Tabela Periódica.
é transformado num átomo de outro elemento, por variação do número de protões
protão
Partícula que, juntamente com o neutrão, constitui os núcleos atómicos. Todos os átomos têm pelo menos um protão e é o número de protões que determina o elemento químico do átomo. Os protões têm carga eléctrica positiva. Os protões são formados por três quarks (dois u e um d), são bariões (e hadrões), e o seu spin é um número semi-inteiro.
do núcleo atómico
núcleo atómico
O núcleo dum átomo é a parte central do átomo e é formado por protões e neutrões, ligados pela interacção nuclear forte. Os electrões orbitam à volta do núcleo atómico. Quase toda a massa do átomo está no seu núcleo e este tem carga eléctrica positiva.
.

A capacidade de datar as alterações nas paisagens através dos núcleos atómicos produzidos pelos raios cósmicos já revolucionou o entendimento dos processos ocorridos na Terra. O CRONUS pretende desenvolver métodos de detecção destes núcleos atómicos, e assim revelar o grande potencial desta nova técnica.

Todas as áreas das Ciências da Terra benefeciarão dos avanços conseguidos por este projecto. Quer se trate da geomorfologia, da geotectónica, da vulcanologia, da hidrologia, dos riscos geológicos ou da paleoclimatologia, qualquer uma destas áreas necessita de um conhecimento melhorado da geocronologia da superfície terrestre.

As partículas energéticas dos raios cósmicos penetram apenas alguns palmos na superfície terrestre, de forma que as rochas existentes nas camadas mais profundas estão protegidas contra os efeitos de transmutação. O número de átomos novos produzidos pelos raios cósmicos pode assim traduzir a quantidade de tempo passado desde a ocorrência de eventos geológicos, tais como sismos, deslizamentos de terras e glaciares. Pode também revelar com que rapidez a superfície da Terra é alterada devido a fenómenos de erosão, como a erosão dos rios.

Para aplicar as técnicas de geocronologia é necessário saber exactamente de que forma se distribuem os raios cósmicos sobre a superfície do nosso planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
, tendo em conta variáveis como a longitude, a latitude e a altitude, assim como as mudanças ocorridas em escalas de tempo geológicas, tais como os desvios periódicos no campo magnético
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
da Terra.

Os cientistas ligados a esta iniciativa irão trabalhar com vista a compreenderem os fundamentos dos efeitos dos raios cósmicos, para que sirvam de métodos de rotina para a reconstrução e análise das alterações do ambiente. Quando aperfeiçoados, os novos métodos trarão luz sobre os passados ciclos climáticos da Terra, as alterações na erosão dos solos, a frequência
frequência
Num fenómeno periódico, a frequência é o número de ciclos por unidade de tempo.
das cheias e dos deslizamentos de terras, e traduzirão de que modo a erosão das rochas afecta os aquecimentos e arrefecimentos globais.

A NSF atribuiu um fundo de 5,8 milhões de dólares, durante cinco anos, para que os geólogos possam medir, em rochas à superfície da Terra, os resultados acumulados destas transmutações atómicas. Por sua vez, a Comissão Europeia, através das Acções Marie Curie, atribuiu 3,4 milhões de euros, durante quatro anos, para o projecto, que envolve grupos de investigação na França, Alemanha, Holanda, Eslováquia, Suiça e Reino Unido. O braço americano do CRONUS será coordenado por Fred Philips, do Instituto de Minas e Tecnologia do Novo México, enquanto o braço europeu será coordenado, a partir da Universidade de Edimburgo (Reino Unido), por Tibor Dunai.

Os cientistas europeus e americanos trabalharão em conjunto, recolhendo amostras de rochas de várias áreas chave da superfície do globo, expondo elementos a feixes de radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
nucleares em aceleradores de alta energia e contabilizando os impactos dos raios cósmicos através de detectores a bordo de aeronaves a grande altitude. Os resultados serão sintetizados num esforço de larga escala para a compreensão de todos os aspectos do fenómeno cósmico.

Fonte da notícia: http://www.nsf.gov/news/news_summ.jsp?cntn_id=104234&org=OLPA