Um planeta com três sóis põe em causa teoria de formação dos Júpiteres quentes

2005-07-20

Em cima: concepção artística do sistema triplo de estrelas e da órbita do planeta HD 188753 Ab. Em baixo: variação da velocidade radial da estrela HD 188753 A, indicando a presença de um planeta à sua volta. Crédito: NASA/JPL-Caltech.
Maciej Konacki, do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech), é o responsável pela descoberta de um mundo com três sóis, com a ajuda do Telescópio Keck I
W. M. Keck Observatory
O Observatório W. M. Keck é operado pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e pela NASA, e encontra-se localizado em Mauna Kea, no Havai. O observatório é constituído por dois telescópios gémeos de 10 metros, o Keck I e o Keck II.
(Caltech/NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
), no Havai. Trata-se de um planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
denominado HD 188753 Ab e localizado na constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
do Cisne, a 149 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
. Segundo o cientista, o céu deste planeta deve ser espectacular, onde ocasionalmente ocorre um pôr-do-sol triplo. Até agora, os astrónomos não tinham quaisquer provas de poder haver formação de planetas em sistemas gravitacionalmente tão complexos.

Os sistemas de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
múltiplos estão espalhados pelo Universo e representam mais de metade das estrelas existentes. A estrela mais próxima do nosso Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
, Alfa Centauro
Alfa Centauri
Alfa Centauri é um sistema triplo de estrelas constituído por 2 estrelas muito semelhantes ao Sol (α Cen A e α Cen B) e uma terceira estrela bem menor (Proxima Centauri, ou Próxima do Centauro), que é a estrela mais próxima do Sol.
, por exemplo, faz parte de um sistema triplo. No entanto, para os caçadores de planetas os sistemas múltiplos não têm sido muito populares, pois são difíceis de observar e até agora pensava-se que eram maus hospedeiros de planetas.

O novo planeta pertence a uma classe comum de planetas extra-solares
planeta extra-solar
Um planeta extra-solar é um planeta que não orbita o nosso Sol.
, os denominados planetas “Júpiteres quentes”, que são planetas gigantes gasosos
planeta joviano
Designam-se por planetas jovianos aqueles que se assemelham a Júpiter, ou seja, planetas gigantes com superfícies gasosas. No Sistema Solar, são planetas jovianos Júpiter, Saturno, Úrano e Neptuno.
que se movem em torno das suas estrelas a uma distância muito próxima. Neste caso, o planeta completa uma volta em torno da estrela principal (HD 188753) em cada 3,3 dias; por sua vez, esta é circundada cada 25,7 anos por um par de estrelas, que rodam à volta uma da outra em 156 dias. A massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
das três estrelas situa-se entre os dois terços da massa do Sol
massa solar
Massa solar é a quantidade de massa existente no Sol e, simultaneamente, a unidade na qual os astrónomos exprimem as massas das estrelas, nebulosas e galáxias. Uma massa solar é igual a 1,989x1030 kg.
e uma massa solar. O planeta tem ligeiramente mais massa do que Júpiter
Júpiter
Júpiter é o quinto planeta mais próximo do Sol. Com um diâmetro cerca de 11 vezes maior do que a Terra e uma massa mais de 300 vezes superior, é o maior planeta do Sistema Solar e o primeiro dos planetas gigantes gasosos.
.

O trio de estrelas forma um conjunto muito apertado: a distância da estrela principal ao par de estrelas que a orbita é aproximadamente igual à distância entre Saturno
Saturno
Saturno é o sexto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 10 vezes o da Terra, é o segundo maior planeta do Sistema Solar. A sua característica mais marcante são os belos anéis que o rodeiam.
e o Sol. O espaço é tão exíguo que põe em questão as teorias de formação dos planetas gigantes quentes. Os astrónomos pensavam que este tipo de planetas se formava longe das suas estrelas de origem e depois migravam para o interior. Num sistema tão coeso como este não existe muito espaço para um planeta poder crescer na sua periferia.

A teoria corrente diz que os planetas gigantes quentes se formam na periferia dos discos circunstelares de gás e poeira das estrelas jovens. O material que constitui o disco aglomera-se para formar um núcleo sólido e este vai atraindo gás e crescendo. A partir de uma certa altura, o gigante gasoso vai apertando a sua órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
para o interior do disco, até ficar muito próximo da estrela. A descoberta de HD 188753 Ab num sistema triplo muito coeso vem contradizer este cenário. É que devido à perturbadora presença dos seus companheiros, a estrela principal deve ter gerado um disco circunstelar (com a matéria prima para a formação dos planetas) cujo raio era apenas metade da distância orbital actual do planeta descoberto. Isto, evidentemente, levanta uma quantidade de novas questões. Explicar a formação de um gigante gasoso em condições de temperatura tão elevada por estar a uma distância tão pequena da estrela é agora um novo desafio lançado aos cientistas.

Os astrónomos já tinham previamente identificado planetas em torno de cerca de 20 sistemas binários e de um sistema triplo, mas em qualquer desses sistemas as estrelas tinham muito espaço entre elas.

Os sistemas de estrelas múltiplos estão, na sua maioria, aglomerados e são difíceis de estudar. Konacki ultrapassou este desafio usando uma versão modificada da técnica de caça aos planetas baseada na velocidade radial da estrela. Neste método, a presença de um planeta é inferida pela atracção gravitacional que induz na estrela-mãe provocando oscilações subtis no movimento desta. Esta estratégia funciona bem para uma estrela única, ou para binários ou sistemas triplos afastados, mas não pode ser aplicada a sistemas cujas estrelas estejam muito próximas, pois, nestes casos, a luz das várias estrelas confunde-se. Konacki desenvolveu modelos detalhados de sistemas com estrelas próximas para conseguir separar a luz que vinha de cada estrela. Isto permitiu-lhe identificar, pela primeira vez, a atracção gravitacional induzida por um planeta numa estrela pertencente a um sistema deste tipo. De um conjunto de 20 sistemas examinados, HD 188753, foi o único que revelou abrigar um planeta.

Os dados relativos a esta descoberta foram publicados na semana passada, na revista Nature. O autor conclui ainda que, possivelmente, os planetas são mais robustos do que previamente se admitia. Uma boa notícia, pois prova que os planetas podem existir em condições de vizinhança interessantes, que até agora não foram exploradas.

Fonte da notícia: http://www.jpl.nasa.gov/news/news.cfm?release=2005-115