Planeta dá forma ao anel de poeira de Fomalhaut

2005-06-24

Imagem do anel de poeira à volta da estrela Fomalhaut, obtida pelo Hubble com o coronógrafo da câmara ACS a bloquear a luz da estrela, de forma a salientar o anel muito menos brilhante. Em baixo, a mesma imagem anotada. O centro do anel está desviado da estrela por 15 unidades astronómicas. Os astrónomos acreditam que um planeta, não detectado pelo Hubble, é responsável por este desvio. O bordo interior e o exterior estão indicados na imagem; o bordo interior é muito mais bem definido do que o exterior, o que também sugere a presença de um corpo que limpa o material interior. Apesar do coronógrafo, alguma luz da estrela é ainda visível na imagem, formando um \"ruído\" de luz difusa. Crédito: NASA, ESA, P. Kalas and J. Graham (University of California, Berkeley), and M. Clampin (NASA\'s Goddard Space Flight Center).
O Telescópio Espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
) efectuou observações do estreito anel de poeira à volta da estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
Fomalhaut (HD 216956). As imagens, no visível, mostram que o centro do anel está afastado da estrela por 15 unidades astronómicas
unidade astronómica (UA)
Unidade de distância, definida como a distância média entre a Terra e o Sol, que corresponde a 149 597 870 km, ou 8,3 minutos-luz.
(no nosso Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
, o centro do anel estaria entre Saturno
Saturno
Saturno é o sexto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 10 vezes o da Terra, é o segundo maior planeta do Sistema Solar. A sua característica mais marcante são os belos anéis que o rodeiam.
e Úrano
Úrano
É o sétimo planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 4 vezes superior ao da Terra é o terceiro planeta gigante gasoso. A sua característica mais marcante é o facto de o seu eixo de rotação estar inclinado cerca de 97º em relação à eclíptica.
, relativamente ao Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
). A explicação mais plausível para este facto é a existência de um planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
que se move numa órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
elíptica e cujo efeito gravitacional dá esta nova forma ao anel de poeira.

O desvio do centro do anel relativamente à estrela já tinha sido inferido a partir de observações anteriores, em comprimentos de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
maiores (infravermelho
infravermelho
Região do espectro electromagnético compreendida entre os comprimentos de onda de 0,7 e 350 mícrones. Esta banda permite observar astros, fenómenos, ou processos físicos com temperaturas entre 10 e 5200 graus Kelvin.
e submilímetro), com a ajuda de modelos teóricos. Mas agora, as imagens incrivelmente detalhadas do Hubble revelam directamente o desvio do centro do anel relativamente a Fomalhaut.

Os mapas de emissão térmica mostravam que um dos lados do anel é mais quente do que o outro, implicando que o centro do anel desviava-se da estrela por uma distância cerca de metade da determinada agora pelo Hubble. A diferença pode dever-se às observações do Hubble serem muito mais precisas, ou poderá implicar que o tamanho do anel é diferente em outros comprimentos de onda.

As imagens do Hubble permitem determinar que o bordo interior do anel é mais abrupto do que o bordo exterior, sugerindo a presença de um corpo que esteja a limpar o material interior. Outro sinal da influência de um corpo vem do anel ser relativamente estreito, com cerca de 25 unidades astronómicas.

O planeta suspeito pode esta a orbitar Fomalhaut dentro do bordo interior do anel, entre 50 a 70 unidades astronómicas da estrela. O anel tem cerca de 133 unidades astronómicas. O Hubble não consegue observar directamente o planeta, de forma que o cálculo da sua massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
tem de ser efectuado indirectamente, por simulações computacionais da dinâmica do anel.

Fomalhaut, com apenas 200 milhões de anos, é uma estrela jovem comparada com o Sol, que tem cerca de 4,5 mil milhões de anos. Encontra-se a 25 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
, na constelação
constelação
Designa-se por constelação cada uma das 88 regiões em que se divide a abóbada celeste, por convenção de 1922.
do Peixe Austral. O anel de Fomalhaut é dez vezes mais velho do que os discos que se observam à volta das estrelas AU Microsopii e Beta Pictoris, onde se suspeita que ainda estejam planetas em formação. Se tomarmos o nosso Sistema Solar como exemplo, devem-se ter formado planetas à volta de Fomalhaut em algumas dezenas de milhões de anos desde o seu nascimento.

O anel de poeira assemelha-se à Cintura de Kuiper
Cintura de Kuiper
A Cintura de Kuiper é uma região em forma de disco, localizada depois de Neptuno, entre 30 e 50 UA do Sol. É constituída por muitos pequenos corpos gelados, restos da formação do Sistema Solar, e é a fonte dos cometas de curto-período. O primeiro objecto da Cintura de Kuiper, 1992QB1, com 240 km de diâmetro, só foi descoberto em 1992, mas desde então já se conhecem centenas de objectos da Cintura de Kuiper (KBO, do inglês Kuiper Belt Object). Há astrónomos que consideram Plutão, e a sua lua Caronte, objectos da Cintura de Kuiper.
do nosso Sistema Solar, um vasto reservatório de corpos gelados que sobraram da formação dos planetas do nosso Sistema Solar. O sistema de Fomalhaut assemelha-se ao nosso Sistema Solar durante os seus anos de formação, quando os planetas e o resto do material que sobrou da formação destes interagiam directamente: algum do material gelado pode ter colidido com os planetas interiores do Sistema Solar, irrigando-os com água formada no Sistema Solar exterior e mais frio; outros corpos gelados podem ter viajado para a região mais exterior do Sistema Solar, formando a Cintura de Kuiper e a Nuvem de Oort
Nuvem de Oort
A Nuvem de Oort é uma nuvem esférica que rodeia o Sistema Solar, constituída por pequenos corpos gelados, resíduos da formação do Sistema Solar. Embora não existam observações directas dos objectos desta nuvem, acredita-se que seja o reservatório da maior parte dos cometas que entram no Sistema Solar interior, os cometas de longo-período. Os astrónomos estimam que a Nuvem de Oort estende-se entre 50 000 e 100 000 UA. A Nuvem de Oort foi proposta pelo astrónomo J. Oort em 1950.
. Contudo a dimensão do anel de poeira de Fomalhaut – quatro vezes a Cintura de Kuiper – indica-nos que nem todos os sistemas planetários se formam e evoluem da mesma maneira.

A equipa de investigação, liderada por P. Kalas (Universidade da Califórnia em Berkeley, EUA), apresentou os seus resultados na revista Nature de 23 de Junho.

As observações que permitiram mapear a estrutura do anel de Fomalhaut foram realizadas com a câmara ACS e abrangeram um período de cinco meses, entre Maio e Outubro de 2004. Mas uma região do anel ainda tem de ser observada, pois estende-se para além do campo de visão da câmara. Os astrónomos esperam completar o mapeamento total do anel este Verão.

Fonte da notícia: http://hubblesite.org/newscenter/newsdesk/archive/releases/2005/10/text/