Binário de anãs brancas inunda o espaço com ondas gravitacionais

2005-06-09

Em cima: ilustração que representa as duas anãs brancas do sistema J0806, realizando órbitas tão apertadas que estão destinadas a fundir-se. Neste momento, o sistema poderá estar a encher o espaço de ondas gravitacionais – rugas no espaço-tempo, previstas por Einstein, mas que nunca foram detectadas directamente. Crédito: GSFC/D. Berry. Em baixo: o gráfico mostra os dados obtidos pelo Chandra. Os raios-X emitidos por J0806 variam com um período de 321,5 segundos, sugerindo que as 2 anãs brancas se orbitam mutuamente com um período de 5 minutos. Crédito: NASA/CXC/GSFC/T. Strohmayer.
Graças ao Observatório de Raios-X Chandra
Chandra X-ray Observatory
O observatório de raios-X Chandra, lançado em 1999, faz parte do projecto dos Grandes Observatórios Espaciais da NASA. O seu nome homenageia Subrahmanyan Chandrasekhar, Prémio Nobel da Física em 1983. O Chandra detecta fontes de raios-X a milhares de milhões de anos-luz de nós. Observar em raios-X é a única forma de observar matéria muito quente, a milhões de graus Célsius. O Chandra detecta raios-X de regiões de alta energia, como por exemplo remanescentes de supernovas.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
), um cientista descobriu duas anãs brancas
anã branca
Uma anã branca, sendo o núcleo exposto de uma gigante vermelha, é uma estrela degenerada muito densa na qual se encontra esgotada qualquer fonte de energia termonuclear. As anãs brancas, que constituem uma fase final da evolução das estrelas de pequena massa, representam cerca de 10 % das estrelas da nossa galáxia, e são por isso muito comuns. O nosso Sol passará um dia pela fase de anã branca, altura em que terá um diâmetro de apenas 10 000 km.
que se encontram a descrever, em torno uma da outra, órbitas
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
tão apertadas, que estão destinadas a fundir-se. Os dados indicam que o sistema de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
deve estar a gerar ondas gravitacionais, que estão a transportar energia para o espaço a uma taxa prodigiosa. O sistema transforma-se assim no principal candidato a alvo de missões futuras, destinadas a detectar directamente estas subtis ondas no espaço-tempo
espaço-tempo
O espaço-tempo é um conceito único introduzido por Albert Einstein no âmbito da Teoria da Relatividade Geral, que reconhece a união do espaço e do tempo.
.

As ondas gravitacionais são perturbações na curvatura do espaço-tempo
curvatura do espaço-tempo
Designa-se por curvatura do espaço-tempo a deformação nele introduzida pela presença de matéria, no contexto da Teoria da Relatividade Geral.
que se deslocam à velocidade da luz
velocidade da luz
A velocidade da luz é a rapidez com que se propagam as ondas luminosas (ou radiação electromagnética). No vácuo, é igual a 299 790 km/s, sendo independente do referencial considerado.
e que só se tornam apreciáveis em eventos cósmicos violentos, como colisões de objectos compactos (corpos com muita massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
num volume muito pequeno), explosões de supernovas
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
, ou o próprio Big Bang. Foram previstas pela Teoria da Relatividade Geral
Teoria da Relatividade Geral
A Teoria da Relatividade Geral foi formulada por Albert Einstein em 1916 como expansão da Teoria da Relatividade Restrita (formulada em 1905) de forma a incluir o efeito da gravitação no espaço-tempo. Esta teoria propõe que o espaço-tempo é uma estrutura quadri-dimensional cuja curvatura é determinada pela presença de matéria. Neste sentido, a gravitação manifesta-se como curvatura do espaço-tempo, e não como uma força entre duas massas.
de Einstein. Segundo esta teoria, um sistema binário constituído por objectos compactos emite ondas gravitacionais. Estas afastam-se à velocidade da luz, fazendo com que as estrelas se aproximem. O período orbital
período orbital
O tempo necessário para que um corpo descreva uma órbita completa e fechada em torno de outro corpo.
do sistema em questão, conhecido por RX J0806.3+1527, ou apenas J0806, está a diminuir de 1,2 milissegundos por ano, uma taxa que é consistente com a teoria.

As anãs brancas do sistema J0806 têm, cada uma, uma massa estimada igual a metade da massa do Sol
massa solar
Massa solar é a quantidade de massa existente no Sol e, simultaneamente, a unidade na qual os astrónomos exprimem as massas das estrelas, nebulosas e galáxias. Uma massa solar é igual a 1,989x1030 kg.
, embora sejam apenas aproximadamente do tamanho da Terra. O binário deve ter a órbita mais pequena dos sistemas binários conhecidos, com as estrelas afastadas de uma distância de 80000 quilómetros, que é apenas um quinto da distância Terra-Lua. Como as estrelas giram tão próximas uma da outra, viajando a mais de 1,5 milhões de quilómetros por hora, a produção de ondas gravitacionais aumenta.

Segundo Tod Strohmayer, do Centro Goddard para o Voo Espacial (NASA), que apresentou estes resultados no último encontro da Sociedade Americana de Astronomia, se os dados se confirmarem, J0806 pode ser uma das fontes mais brilhantes de ondas gravitacionais da Galáxia
Via Láctea
A Via Láctea é a galáxia de que faz parte o nosso Sistema Solar. Trata-se de uma galáxia espiral gigante, com um diâmetro de cerca de 160 mil anos-luz e uma massa da ordem de 100 mil milhões de vezes a massa do Sol.
. Pode mesmo vir a converter-se numa das primeiras fontes deste tipo a serem detectadas pela futura missão espacial LISA (ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
/NASA) – Laser
Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation (LASER)
A palavra LASER designa uma amplificação de luz por emissão estimulada de radiação. O princípio físico por trás deste fenómeno é a emissão estimulada: sob certas condições, um fotão atinge um átomo excitado e provoca a emissão de um fotão. O átomo emite dois fotões: o fotão estimulador, que passa incólume, e o fotão estimulado, que tem o mesmo comprimento de onda, a mesma fase, a mesma polarização e a mesma direcção de propagação que o fotão estimulador. Se cada um destes fotões estimular mais átomos, o feixe inicial de fotões é assim amplificado.
Interferometer Space Antenna
– destinada a captar ondas gravitacionais.

Observações realizadas no visível e nos raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
mostraram, para este sistema, variações periódicas, com um período de 321,5 segundos – pouco mais de 5 minutos. Este período é provavelmente o período orbital do sistema. No entanto, a possibilidade de que ele represente a rotação de uma das anãs brancas não deve ser ainda totalmente posta de parte.

Tod Strohmayer considera que este deve ser o mais compacto dos binários conhecidos, ou então deverá ser um dos sistemas mais estranhos até hoje observados. Qualquer que seja o caso, o sistema terá certamente uma grande história para contar.

Fonte da notícia: http://chandra.harvard.edu/press/05_releases/press_053005.html