Quinze anos de Ciência com o Telescópio Espacial Hubble

2005-04-29

Imagens de alta resolução, obtidas com a câmara ACS do Hubble, comemorando os 15 anos em órbita do telescópio: em cima, a galáxia Remoinho (M 15) e a sua companheira NGC 5195, e em baixo, um pilar de gás frio na nebulosa da Águia (M 16). Crédito: NASA/ESA/S. Beckwith (STScI) & the Hubble Heritage Team (STScI/AURA).
O Telescópio Espacial Hubble
Hubble Space Telescope (HST)
O Telescópio Espacial Hubble é um telescópio espacial que foi colocado em órbita da Terra em 1990 pela NASA, em colaboração com a ESA. A sua posição acima da atmosfera terrestre permite-lhe observar os objectos astronómicos com uma qualidade ímpar.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
) entrou em órbita
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
da Terra a 25 de Abril de 1990, tornando-se o primeiro telescópio óptico a orbitar acima da atmosfera terrestre
atmosfera terrestre
A atmosfera terrestre é composta por um conjunto de camadas gasosas que envolvem a Terra. Estas camadas são designadas por Troposfera (da superfície da Terra até cerca de 10 km de altitude), Estratosfera (10 - 50 km), Mesosfera (50 - 100 km), Termosfera (100 - 400 km) e Exosfera (acima dos 400 km).
. As expectativas eram grandes nos vários campos da astrofísica e 15 anos depois, com mais de 700 000 imagens obtidas, mais de 25000 objectos diferentes observados, e tendo contribuído para milhares de artigos científicos em todo o mundo, pode-se considerar que o Hubble cumpriu as promessas e continua a servir a Ciência com mais descobertas.

Para comemorar o 15º aniversário do Hubble, a NASA apresentou duas imagens de dois objectos bem conhecidos: a galáxia Remoinho
M51 (NGC 5194) - Galáxia do Remoinho
M51, conhecida por Galáxia do Remoinho (Whirpool Galaxy), é uma galáxia espiral espectacular na constelação dos Cães de Caça, a uma distância de 15 milhões de anos-luz. Pensa-se que os braços espirais de NGC 5194 devam a sua forma espiral quase perfeita à interacção com a galáxia mais pequena. M 51 é composto, de facto, por duas galáxias: uma maior, também designada por NGC 5194, e outra mais pequena, designada NGC 5195. Pensa-se que os braços espirais de NGC 5194 devam a sua forma espiral quase perfeita à interacção com a galáxia mais pequena.
(M 51) e a nebulosa
nebulosa
Uma nebulosa é uma nuvem de gás e poeira interestelares.
da Águia (M 16). Estas são das maiores e das mais nítidas imagens que o Hubble já obteve. Cem locais nos Estados Unidos exibem estas fotografias desde o dia 25 em painéis com 1,2x1,8 m e 0,9x1,8 m de dimensão, respectivamente.

A imagem da galáxia
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
Remoinho mostra exemplarmente as características típicas de galáxias espirais, desde os braços curvos, onde residem as estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
jovens, ao núcleo central amarelado, onde se encontram as estrelas mais velhas. Os braços espirais
braço espiral
Um braço espiral de uma galáxia é uma estrutura curva no disco de uma galáxia espiral (ou, em alguns casos, de uma galáxia irregular), constituída por estrelas jovens, aglomerados de estrelas, nebulosas, gás e poeiras.
são fábricas de estrelas: a linha de montagem começa nas nuvens escuras de gás, no bordo interior do braço, segue para as regiões de formação de estrelas, que aparecem brilhantes e cor-de-rosa, e termina nos aglomerados de estrelas azuis, no bordo exterior do braço.

A imagem do Hubble mostra que a galáxia companheira, NGC 5195, que parecia estar no prolongamento de um dos braços, está na verdade a passar por detrás da galáxia Remoinho. À medida que a pequena companheira passa, o seu efeito gravitacional provoca surtos de formação de estrelas na galáxia maior.

Os cientistas utilizaram a câmara ACS para fotografar uma região nova da nebulosa da Águia. A imagem mostra um coluna de gás frio e denso, e de poeira, com cerca de 9,5 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
de altura (duas vezes a distância do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
à estrela mais próxima). Esta coluna pode ser uma incubadora gigante para estrelas recém-nascidas. A luz ultravioleta
ultravioleta
O ultravioleta á a banda do espectro electromagnético que cobre a gama de comprimentos de onda entre os 91,2 e os 350 nanómetros. Esta radiação é largamente bloqueada pela atmosfera terrestre.
de um grupo de estrelas jovens e quentes, que se encontra acima da coluna, fora da imagem, vai esculpindo o pilar de gás e iluminando a sua superfície. A silhueta da coluna é realçada contra o brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
de gás mais distante.

Estrelas podem estar ainda a formar-se dentro da coluna de gás. Algumas nascem devido ao colapso gravitacional
colapso gravitacional
Processo pelo qual uma estrela ou outro objecto celeste implode por acção do seu prório campo gravítico, resultando num objecto que é muito menor e muito mais denso do que o objecto original. O colapso gravitacional é o processo pelo qual se formam estrelas e aglomerados de estrelas, a partir de nuvens interestelares de gás e poeira, galáxias, ou ainda buracos negros.
do gás denso, outras devido à pressão do gás que é aquecido pelas estrelas quentes vizinhas. No centro da coluna, distinguem-se concentrações de matéria em forma de “dedos” e “nodos”. Podem ser locais onde se formaram estrelas pelo colapso gravitacional do gás, antes das estrelas vizinhas começarem a emitir radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
ultravioleta. Estas regiões são, aproximadamente, do tamanho do nosso Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
.

A luz ultravioleta das estrelas jovens e quentes pode induzir formação de estrelas em regiões no topo do pilar. Os nodos brilhantes e os dedos salientes no cimo da estrutura são exemplos desses locais. As estrelas aquecem o gás no cimo da coluna e criam uma onda de choque
onda de choque
Uma onda de choque é uma variação brusca da pressão, temperatura e densidade de um fluído, que se desenvolve quando a velocidade de deslocação do fluído excede a velocidade de propagação do som.
, responsável pela orla brilhante, à esquerda e em cima, na borda do topo da nebulosa. À medida que o gás quente expande, empurra o gás frio e escuro. A pressão intensa pode então facilitar o processo de formação de estrelas.

O Telescópio Espacial Hubble é um projecto conjunto da NASA e da ESA. Deve o seu nome ao astrónomo Edwin Hubble
Edwin Hubble
(1889-1953). Astrónomo norte-americano que na década de 1920 alterou profundamente a visão então vigente do Universo. Entre as suas descobertas mais importantes, destacam-se o ter verificado que a Via Láctea é apenas uma entre muitas outras galáxias e o ter demonstrado que o Universo está em expansão.
(1889-1953), que entre outras importantes contribuições para o nosso conhecimento do Universo, foi quem confirmou a expansão do Universo observacionalmente.

O telescópio foi lançado com o vaivém Discovery, a 24 de Abril de 1990, e no dia seguinte foi posto em órbita da Terra, a uma altitude de 569 km e com uma inclinação de 28,5° relativamente ao equador. Uma volta é completada em cada 97 minutos, a uma velocidade de 28000 km/h.

O Hubble, com um espelho primário de 2,4 m, foi o primeiro telescópio óptico a ser posto em órbita da Terra, evitando assim a distorção causada nas imagens pela atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
terrestre. Também foi o primeiro telescópio espacial a ser concebido de forma a receber manutenção no espaço. Foi assim possível corrigir um defeito do espelho principal, detectado logo dois meses depois de estar em funcionamento, e que causava aberração esférica
aberração esférica
Chama-se aberração esférica à distorção da imagem formada no plano focal por um espelho esférico. Esta distorção resulta do facto de não ser possível, com um espelho esférico, focar num só ponto um feixe incidente de raios paralelos.
. Em Dezembro de 1993, uma equipa de astronautas corrigiu a óptica do telescópio. Ao longo dos anos, as várias missões de serviço permitiram a substituição e instalação de novos instrumentos.

O telescópio espacial provou estar à altura das expectativas criadas em torno dos avanços científicos que provocaria. Eis algumas das suas grandes contribuições, nas mais diversas áreas:

O Universo em expansão – a observação da explosão de estrelas em galáxias cuja luz foi emitida quando o Universo tinha metade da actual idade sugere, ainda preliminarmente, que a expansão do Universo está a acelerar.
As primeiras galáxias – imagens do campo profundo (Hubble Deep Field em 1996 e Hubble Ultra Deep Field em 2004) revelaram galáxias de uma época muito próxima do Big Bang, quando as primeiras estrelas reaqueceram o Universo frio e escuro.
Buracos Negros – o Hubble foi o primeiro telescópio a encontrar provas da existência de buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
elevada no centro de quase, senão de todas, as galáxias.
Origem dos raios gama
raios gama
Os raios gama são a componente mais energética e mais penetrante de toda a radiação electromagnética. Os fotões gama possuem energias elevadíssimas, tipicamente superiores a 10 keV, às quais correspondem comprimentos de onda inferiores a umas décimas do Ångstrom. Este tipo de radiação é, por exemplo, emitido espontaneamente por núcleos atómicos de algumas substâncias radioactivas.
– as observações do Hubble permitiram determinar que as fulgurações de raios gama
fulguração de raios gama
Uma fulguração de raios gama é uma potentíssima explosão, com consequente libertação de fotões gama, que ocorre em direcções aleatórias no céu. Descobertas acidentalmente nos anos 1960, sabe-se que algumas delas estão associadas a um tipo particular de supernovas, as explosões que marcam o fim da vida de uma estrela de massa elevada.
tinham origem na periferia de galáxias distantes, no Universo jovem.
Quasares – o Hubble confirmou que os quasares
quasar
Os quasares são objectos extragalácticos extremamente brilhantes e compactos. Hoje acredita-se que são o centro de galáxias muito energéticas ainda num estado inicial da sua evolução (são, pois, núcleos galácticos activos - NGAs) e a sua energia provém de um buraco negro de massa muito elevada. Os seus desvios para o vermelho indicam que se encontram a distâncias cosmológicas. O seu nome, quasar, vem do inglês quasi-stellar object, ou seja, objecto quase estelar, devido à semelhança da sua imagem em placas fotográficas com a imagem de uma estrela.
são, de facto, núcleos galácticos activos em galáxias distantes e a sua energia vem do buraco negro central.
Formação de estrelas – o Hubble revelou os diversos e complexos processos que influenciam a formação de estrelas, mostrou que os discos de poeira à volta das estrelas jovens são comuns e permitiu espreitar a estrutura interna desses discos, que sugere a presença de planetas
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
em formação.
Morte das Estrelas – as imagens de estrelas moribundas, como por exemplo de nebulosas planetárias
nebulosa planetária
As nebulosas planetárias são nebulosas formadas por camadas de gás expelido por estrelas de pequena massa, que terminaram a sua fase de estrela gigante vermelha e se encontram no fim da sua vida. No centro da nebulosa planetária, a estrela transforma-se numa anã branca quente e é a radiação que emite que faz a nebulosa brilhar. As nebulosas planetárias não têm nada a ver com planetas, mas obtiveram o seu nome porque quando observadas através de um pequeno telescópio, se assemelham a um disco de um planeta.
, permitiram aos cientistas compreender um pouco melhor os factores que influenciam o processo de morte das estrelas.
Sistema Solar – imagens de incrível detalhe deram-nos a conhecer melhor os nossos vizinhos, como por exemplo: as auroras
aurora
A aurora é a luz emitida pelos iões da atmosfera terrestre, principalmente nos pólos geomagnéticos da Terra, estimulada pelo bombardeamento de partículas de alta energia ejectadas pelo Sol. As auroras aparecem dois dias depois das fulgurações solares, proporcionando um espectáculo de rara beleza, e atingem o seu pico cerca de dois anos depois do máximo de manchas solares. As auroras boreais e austrais são observáveis a latitudes elevadas no hemisfério Norte e hemisfério Sul, respectivamente.
de Júpiter
Júpiter
Júpiter é o quinto planeta mais próximo do Sol. Com um diâmetro cerca de 11 vezes maior do que a Terra e uma massa mais de 300 vezes superior, é o maior planeta do Sistema Solar e o primeiro dos planetas gigantes gasosos.
, Saturno
Saturno
Saturno é o sexto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. Com um diâmetro cerca de 10 vezes o da Terra, é o segundo maior planeta do Sistema Solar. A sua característica mais marcante são os belos anéis que o rodeiam.
e Ganímedes; a colisão do cometa
cometa
Os cometas são pequenos corpos irregulares, compostos por gelos (de água e outros) e poeiras. Os cometas têm órbitas de grande excentricidade à volta do Sol. As estruturas mais importantes dos cometas são o núcleo, a cabeleira e as caudas.
Shoemaker-Levy com Júpiter; as imagens de Marte
Marte
Marte é o quarto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. É o último dos chamados planetas interiores. O seu diâmetro é cerca de 50% mais pequeno do que o da Terra e possui uma superfície avermelhada, sendo também conhecido como planeta vermelho.
.

Em Janeiro de 2004, a administração da NASA notificou que iria cancelar futuras missões humanas de manutenção ao telescópio Hubble. A decisão baseou-se nos riscos a que os astronautas do vaivém se sujeitam. Neste momento, outras opções de manutenção estão a ser pensadas, incluindo missões robóticas controladas remotamente.

Parabéns ao Telescópio Espacial Hubble!

Fonte da notícia: http://hubblesite.org/newscenter/newsdesk/archive/releases/2005/12/text/