As primeiras estrelas

2005-04-22

HE 1327-2326. Crédito: STScI,DSS,Magnum Telescope.
A análise espectroscópica de uma estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
descoberta recentemente, HE 1327-2326, revelou que esta é a estrela com menos ferro que se conhece. Este facto é extremamente importante porque indica que HE 1327-2326 se formou quando o Universo era muito jovem.

HE 1327-2326 é uma das 1777 estrelas do levantamento de estrelas aparentemente pobres em metais
metal
Em Astronomia, todos os elementos químicos de número atómico superior ao do hélio são designados por metais, ou por elementos pesados.
efectuado por A. Frebel (Universidade Nacional da Austrália), no âmbito do seu doutoramento. Após as observações com o telescópio de 3,6m do ESO
European Southern Observatory (ESO)
O Observatório Europeu do Sul é uma organização europeia de Astronomia para o estudo do céu austral fundada em 1962. Conta actualmente com a participação de 10 países europeus e ainda do Chile. Portugal tornou-se membro do ESO em 1 de Janeiro de 2001, no seguimento de um acordo de cooperação que durou cerca de 10 anos.
, aos investigadores obtiveram espectros de alta resolução com o telescópio Subaru
Subaru Telescope
O Telescópio Subaru é um telescópio óptico e de infravermelhos, com um espelho de 8,2 m de diâmetro. O Subaru encontra-se no Observatório de Mauna Kea, no Havai, e é operado pelo Observatório Astronómico Nacional do Japão – NAOJ e pelo Instituto Nacional de Ciências Naturais.
, de 8m, que permitiram determinar a composição química desta estrela.

HE 1327-2326 possui uma quantidade de ferro muito baixa ([Fe/H]=-5,4±0,2), tão baixa que a torna a estrela com menos ferro que se conhece. HE 0107-5240, que detinha o recorde, possui duas vezes mais ferro que HE 1327-2326! Mas enquanto HE 0107-5240 é uma estrela evoluída (estrela gigante vermelha
estrela gigante vermelha
As estrelas gigantes vermelhas são estrelas gigantes com temperaturas à superfície entre 2500 e 3500°C, do tipo espectral M ou K. As estrelas gigantes são um estado evoluído de estrelas anãs, como o Sol - as estrelas anãs, ao terminarem o processo de fusão de hidrogénio no seu núcleo, arrefecem e expandem-se, evoluindo para estrelas gigantes. Um dos seguintes processos, ou os dois, ocorre agora: a fusão de hidrogénio em hélio numa camada à volta do núcleo; a fusão de hélio em carbono e oxigénio no núcleo. As estrelas gigantes são muito luminosas: num diagrama Hertzsprung-Russell, o ramo das estrelas gigantes é mais luminoso do que a sequência principal.
), a nova recordista é uma estrela da sequência principal
estrela anã
Uma estrela anã, também dita estrela da sequência principal, é uma estrela não evoluída, que ainda se encontra na fase de fusão do hidrogénio em hélio, no seu núcleo.
.

Estrelas com significativamente menos elementos químicos pesados do que o Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
– dos quais o ferro é usado como indicador – são chamadas de estrelas de baixa metalicidade
abundância de metais
A abundância de metais de um dado objecto celeste é a abundância química de todos os seus elementos, excepto o hidrogénio e o hélio. Para os astrónomos, todos os elementos com número atómico superior ao do hélio são considerados metais.
. Enquanto os elementos mais leves, como o hidrogénio, o hélio e o lítio, apareceram com o Big Bang, elementos como o ferro só aparecem através das reacções nucleares dentro das estrelas e nas explosões de supernovas
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
e por isso, com o evoluir do Universo. Por isso, os investigadores acreditam que a baixa metalicidade de HE 1327-2326 é um indicador de que esta estrela se formou muito pouco depois do Big Bang.

O estudo de HE 1327-2326 pode ser usado para desvendar a história do enriquecimento químico do Universo muito jovem. Para isso, é importante estabelecer as quantidades relativas dos outros elementos químicos
elemento químico
Elemento composto por um único tipo de átomos. Os elementos químicos constituem a Tabela Periódica.
. Tal como HD 0107-5240, HE 1327-2326 apresenta sobre-abundância de carbono e azoto, relativamente a o ferro; mas inesperadamente, HE 1327-2326 tem uma abundância de lítio muito baixa e uma abundância de estrôncio muito elevada.

A distinta composição química de HE 1327-2326 faz desta estrela uma excelente ferramenta para a arqueologia estelar e permite explorar algumas das teorias de formação das primeiras estrelas. Uma hipótese é HD 1327-2326 ter-se formado a partir de uma nuvem de gás enriquecida pela explosão de uma das primeiras supernovas. Contudo, não se pode excluir a hipótese de HE 1327-2326 ser uma das primeiras estrelas de pouca massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
e que os elementos pesados foram agregados, ou do meio interstelar
meio interestelar
O meio interestelar é constituído por toda a matéria existente no espaço entre as estrelas. Cerca de 99% da matéria interestelar é composta por gás, sendo os restantes 1% dominados pela poeira. A massa total do gás e da poeira do meio interestelar é cerca de 15% da massa total da matéria observável da nossa galáxia, a Via Láctea. A matéria do meio interestelar existe em diferentes regimes de densidade e temperatura, como por exemplo as nuvens moleculares (frias e densas) ou o gás ionizado (quente e ténue).
, ou através de transferência de massa de uma estrela evoluída com a qual HE 1327-2326 formaria um sistema binário.

Este estudo encontra-se publicado num artigo da Nature sob o título “A assinatura da nucliossíntese das primeiras estrelas”.


Fonte da notícia: http://www.mso.anu.edu.au/news/media_releases/media_release_050414.php