Pulsar permite aprofundar conhecimentos sobre a matéria ultra densa e os campos magnéticos

2004-12-22

Em cima: 3C58 é o remanescente da supernova observada em 1181 por astrónomos chineses e japoneses. A imagem, de longa exposição, obtida pelo Chandra mostra que o pulsar, na região central da nebulosa, está rodeado por um toro brilhante de emissão de raios-X (que pode ver-se na ampliação, à direita na imagem). Uma fulguração de raios-X emerge em ambos os sentidos, perpendiculares ao plano do toro e a partir do seu centro, estendendo-se por uma distância de alguns anos-luz. Mais além, pode observar-se ainda uma teia de anéis de raios-X. Crédito: NASA/CXC/SAO/P. Slane et al. Em baixo: Esta imagem compara a imagem obtida pelo Chandra com outra obtida em rádio pelo VLA, a 30 de Abril de 1984. Os anéis intricados de raios-X, vistos pelo Chandra, e as configuração obtidas do rádio estendem-se por 12 anos-luz a partir do pulsar, mostrando a complexa estrutura do campo magnético existente. Crédito: raios-X: NASA/CXC/SAO/P. Slane et al.; rádio: NCSU/S. Reynolds.
Uma equipa internacional de cientistas utilizou dados obtidos pelo Observatório de Raios-X Chandra
Chandra X-ray Observatory
O observatório de raios-X Chandra, lançado em 1999, faz parte do projecto dos Grandes Observatórios Espaciais da NASA. O seu nome homenageia Subrahmanyan Chandrasekhar, Prémio Nobel da Física em 1983. O Chandra detecta fontes de raios-X a milhares de milhões de anos-luz de nós. Observar em raios-X é a única forma de observar matéria muito quente, a milhões de graus Célsius. O Chandra detecta raios-X de regiões de alta energia, como por exemplo remanescentes de supernovas.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
) para medir a temperatura do pulsar existente no centro da nebulosa
nebulosa
Uma nebulosa é uma nuvem de gás e poeira interestelares.
3C58, o remanescente de uma supernova
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
cuja explosão foi observada em 1181, por astrónomos chineses e japoneses. A imagem da 3C58, obtida pelo Chandra, mostra também fulgurações
fulguração
Uma fulguração é uma libertação de energia de forma explosiva da qual resulta um aumento rápido do brilho do astro no qual ocorre. São exemplo deste tipo de fenómenos as fulgurações solares, associadas às manchas solares, bem como as fulgurações de raios-X, que ocorrem em estrelas de neutrões, e de raios gama, que se sabe estarem relacionadas com as explosões de supernova.
e anéis magnetizados de partículas de alta energia geradas pelo pulsar.

Existem, neste momento, fortes evidências de que, em cerca de 800 anos, a superfície do pulsar 3C58 arrefeceu para uma temperatura ligeiramente inferior a 1 milhão de graus Celsius. Esta temperatura pode parecer muito elevada, no entanto, para uma jovem estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
de neutrões
neutrão
Partícula que, juntamente com o protão, constitui os núcleos atómicos. Exceptuando o hidrogénio, todos os átomos têm neutrões, e é o número de neutrões que determina o isótopo de determinado elemento químico. Os neutrões têm carga eléctrica neutra. Os neutrões são formados por três quarks (dois "d" e um "u"), são bariões (e hadrões) e o seu spin é um número semi-inteiro. Os neutrões livres declinam por decaímento beta, com um tempo de semi-vida de 10,8 minutos, originando um protão, um electrão e um neutrino. No núcleo atómico, o neutrão é tão estável quanto o protão.
significa muito frio.

As colisões entre neutrões e outras partículas subatómicas no interior de um pulsar produzem neutrinos
neutrino (ν)
O neutrino é uma partícula elementar da classe dos leptões. Com carga eléctrica nula e massa quase nula, o neutrino interage muito pouco, estando sujeito apenas à força nuclear fraca e à força gravitacional. O neutrino é um leptão e tem spin semi-inteiro (fermião). Conhecem-se três tipos diferentes de neutrinos: o neutrino do electrão (νe), o neutrino do muão (νμ), e o neutrino do tau (ντ).
, que se escapam e levam consigo energia. Gera-se assim um processo de arrefecimento, que depende, de forma crítica, da densidade
densidade
Em Astrofísica, densidade é o mesmo que massa volúmica: é a massa por unidade de volume.
e do tipo de partículas existente no interior do pulsar. As medições da temperatura da sua superfície constituem um meio de descobrir condições extremas, nas quais a densidade será tão elevada que o conhecimento corrente de como as partículas interagem umas com as outras se torna limitado. Estas condições representam o máximo de densidade que pode ser atingido antes de a estrela se transformar num buraco negro
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
.

A temperatura relativamente baixa do pulsar 3C58, combinada com resultados obtidos para o pulsar Vela e para outra estrela de neutrões
estrela de neutrões
Uma estrela de neutrões é o remanescente de uma estrela de massa elevada que explodiu como supernova. Trata-se de um objecto muito compacto constituído essencialmente por neutrões, com apenas cerca de 10 a 20 km de diâmetro, uma densidade média entre 1013 e 1015 g/cm3, uma temperatura central de 109 graus e um intenso campo magnético de 1012 gauss.
igualmente jovem, são dados que apontam para um rápido arrefecimento, que se deve a condições inesperadas ocorridas nas estrelas de neutrões. Uma possível explicação é a de que terão sobrevivido mais protões
protão
Partícula que, juntamente com o neutrão, constitui os núcleos atómicos. Todos os átomos têm pelo menos um protão e é o número de protões que determina o elemento químico do átomo. Os protões têm carga eléctrica positiva. Os protões são formados por três quarks (dois u e um d), são bariões (e hadrões), e o seu spin é um número semi-inteiro.
do que seria previsto ao colapso que deu origem à estrela de neutrões. Mas talvez a responsabilidade do arrefecimento se possa atribuir a alguma forma exótica de partículas subatómicas.

À volta do pulsar pode observar-se uma estrutura em forma de toro, com fulgurações que se estendem na direcção perpendicular ao seu plano. Isto deve-se à radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
emitida por partículas de energia extremamente alta, produzidas pelo pulsar, e mostra semelhanças com o que acontece em redor do pulsar da Nebulosa do Caranguejo
Nebulosa do Caranguejo
É o primeiro objecto (M 1) do famoso catálogo de Charles Messier. Trata-se de um remanescente de supernova situado a uma distância de 6000 anos-luz, cuja explosão foi avistada por astrónomos chineses no ano de 1054.
.
As imagens obtidas pelo Chandra para os pulsares das nebulosas 3C58 e do Caranguejo, assim como para uma lista crescente de pulsares, provam que os fortes campos electromagnéticos, existentes em torno de estrelas de neutrões em rápida rotação, são poderosos geradores de partículas de alta energia. Uma das implicações mais intrigantes destes resultados é a de que os pulsares podem projectar campos magnéticos
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
, tal como partículas de alta energia, para longe no espaço.

A nebulosa 3C58 estende-se por doze anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
a partir do pulsar no seu centro. As imagens de rádio
rádio
O rádio é a banda do espectro electromagnético de maior comprimento de onda (menor frequência) e cobre a gama de comprimentos de onda superiores a 0,85 milímetros. O domínio do rádio divide-se no submilímetro, milímetro, microondas e rádio.
obtidas, bem como a intrincada estrutura dos anéis de raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
, visível na imagem do Chandra, são certamente representações da estrutura complexa do campo magnético existente. Será necessário preceder a uma análise ainda mais detalhada e também estabelecer outros paralelos, com a Nebulosa do Caranguejo e com outros pulsares, para que os astrónomos possam compreender melhor a forma como estes corpos produzem o campo magnético. Numa escala mais alargada, a análise permitirá talvez compreender como é formado o campo magnético pelos discos de matéria que giram em torno dos poderosos buracos negros no centro das galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
.

As observações do Chandra ao pulsar 3C58, localizado a 10 000 anos-luz da Terra, foram realizadas por um período de quase 100 horas, entre 22 e 26 de Abril de 2003, utilizando o Advanced CCD Imaging Spectrometer. A equipa de estudos foi liderada por Patrick Slane, do Centro de Astrofísica Harvard-Smithson, em Cambridge, Massachusetts. Os resultados foram publicados a 20 de Novembro de 2004, no Astrophysical Journal.

Fonte da notícia: http://chandra.harvard.edu/press/04_releases/press_121404.html