Chandra revela calor no centro da Via Láctea

2004-08-02

Esta imagem foi produzida através da combinação de doze observações do Chandra (Observatório de Raios-X da NASA) efectuadas numa região de 130 anos-luz no centro da Via Láctea. As cores representam raios-X de fraca (vermelho), média (verde) e alta (azul) energia. Identificadas e removidas as fontes pontuais de raios-X devidas a estrelas de neutrões, buracos negros, anãs brancas, estrelas em primeiro plano e galáxias em plano de fundo, o que resta é uma radiação difusa de raios-X, que se estende do canto superior esquerdo até ao canto inferior direito da imagem, na direcção do disco da galáxia. O espectro desta radiação é coerente com o de uma nuvem de gás quente contendo dois componentes: um gás de 10 milhões de graus Celsius e outro de 100 milhões de graus Celsius. Crédito: NASA/CXC/UCLA/M. Muno et al.
O Observatório de Raios-X Chandra
Chandra X-ray Observatory
O observatório de raios-X Chandra, lançado em 1999, faz parte do projecto dos Grandes Observatórios Espaciais da NASA. O seu nome homenageia Subrahmanyan Chandrasekhar, Prémio Nobel da Física em 1983. O Chandra detecta fontes de raios-X a milhares de milhões de anos-luz de nós. Observar em raios-X é a única forma de observar matéria muito quente, a milhões de graus Célsius. O Chandra detecta raios-X de regiões de alta energia, como por exemplo remanescentes de supernovas.
, da NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
, revelou provas da existência de gás extremamente quente numa vasta região do centro da Via Láctea
Via Láctea
A Via Láctea é a galáxia de que faz parte o nosso Sistema Solar. Trata-se de uma galáxia espiral gigante, com um diâmetro de cerca de 160 mil anos-luz e uma massa da ordem de 100 mil milhões de vezes a massa do Sol.
.

A descoberta veio à luz quando uma equipa de astrónomos, liderada por Michael Muno, da Universidade da Califórnia em Los Angeles (EUA), utilizou o poder de resolução único do Chandra para estudar uma região de cerca de 100 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
de extensão, removendo de forma cuidadosa as contribuições das 2357 fontes pontuais de raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
devidas a estrelas de neutrões
estrela de neutrões
Uma estrela de neutrões é o remanescente de uma estrela de massa elevada que explodiu como supernova. Trata-se de um objecto muito compacto constituído essencialmente por neutrões, com apenas cerca de 10 a 20 km de diâmetro, uma densidade média entre 1013 e 1015 g/cm3, uma temperatura central de 109 graus e um intenso campo magnético de 1012 gauss.
, buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
, anãs brancas
anã branca
Uma anã branca, sendo o núcleo exposto de uma gigante vermelha, é uma estrela degenerada muito densa na qual se encontra esgotada qualquer fonte de energia termonuclear. As anãs brancas, que constituem uma fase final da evolução das estrelas de pequena massa, representam cerca de 10 % das estrelas da nossa galáxia, e são por isso muito comuns. O nosso Sol passará um dia pela fase de anã branca, altura em que terá um diâmetro de apenas 10 000 km.
, estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
em primeiro plano e galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
em plano de fundo.

O que restou foi uma radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
difusa e irregular de uma nuvem de gás à temperatura de 10 milhões de graus Celsius, mergulhada noutra de raios-X de energia superior com a característica espectral de um gás a 100 milhões de graus Celsius.

Os raios-X difusos parecem ser a parte mais brilhante de uma crista de emissão de raios-X que se estende por vários milhares de anos-luz ao longo do disco da Galáxia. A extensão desta crista mostra que o efeito combinado da gravidade de todos os objectos conhecidos no centro da Via Láctea – todas as estrelas e o buraco negro central de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
elevadíssima – não é suficientemente forte para evitar a fuga do gás quente a partir da região. O tempo de escape será de cerca de 10 000 anos, uma pequena fracção dos 10 mil milhões de anos de vida da Galáxia. Isto implica que o gás terá sido continuamente regenerado e aquecido.

O gás pode ter sido renovado por ventos oriundos de estrelas de massa elevadíssima, mas a origem do seu aquecimento continua por desvendar.

O aquecimento do gás de 10 milhões de graus Celsius pode estar relacionado com as ondas de choque
onda de choque
Uma onda de choque é uma variação brusca da pressão, temperatura e densidade de um fluído, que se desenvolve quando a velocidade de deslocação do fluído excede a velocidade de propagação do som.
de supernovas
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
, mas desconhece-se como é aquecido o gás de 100 milhões de graus. A hipótese de que a fonte de aquecimento poderiam ser protões
protão
Partícula que, juntamente com o neutrão, constitui os núcleos atómicos. Todos os átomos têm pelo menos um protão e é o número de protões que determina o elemento químico do átomo. Os protões têm carga eléctrica positiva. Os protões são formados por três quarks (dois u e um d), são bariões (e hadrões), e o seu spin é um número semi-inteiro.
e electrões
electrão
Partícula elementar pertencente à família dos leptões - partículas sujeitas à interacção nuclear fraca, electromagnética e gravitacional. Os electrões possuem carga eléctrica negativa e encontram-se nos átomos de todos os elementos químicos, orbitando à volta do núcleo atómico, que possui carga eléctrica positiva.
de alta energia, produzidos nessas ondas de choque, cai por terra quando se analisa o espectro do gás – este não é consentâneo com o aquecimento por partículas de alta energia. Também o campo magnético
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
galáctico observado parece excluir o aprisionamento e o aquecimento por turbulência magnética. Mais ainda, a frequência
frequência
Num fenómeno periódico, a frequência é o número de ciclos por unidade de tempo.
das explosões de supernovas não parece ser suficiente para providenciar o aquecimento necessário.

Considerou-se ainda o facto de os raios-X de alta-enegia apenas parecerem difusos, e serem, de facto, devidos ao brilho
brilho
O brilho de um astro refere-se à quantidade de luz que dele provém, ou seja, a quantidade de energia por ele emitida por unidade de área por unidade de tempo. Dado que o brilho observado, ou medido, depende da distância ao objecto, distingue-se o brilho aparente (quando medido a uma determinada distância), do brilho intrínseco (conceptualmente medido na supefície do próprio astro).
combinado de uma população de fontes luminosas pontuais ainda não detectadas – tal como luzes difusas de uma cidade vistas a grande distância.

O problema com esta explicação é que seriam necessárias 200 000 fontes na região observada. Embora o número total de estrelas nesta região seja de cerca de 30 milhões, o número de estrelas do tipo capaz de produzir raios-X, com o poder e a energia requeridos, estima-se ser apenas de 20 000. Além disso, uma tão grande e não resolvida população de fontes produziria uma radiação muito mais suave do que aquela que é observada. Segundo os responsáveis pela investigação, não existe nenhuma classe conhecida de objectos que possa ser responsável por um tão grande número de fontes de raios-X de alta energia no centro da Galáxia.

Fonte da notícia: http://www1.msfc.nasa.gov/NEWSROOM/news/releases/2004/04-169.html