O trânsito de Vénus no próximo dia 8 de Junho

2004-06-03

Em cima: mapa-mundo de visibilidade do trânsito de Vénus de 8 de Junho de 2004. Crédito: Fred Espenak, Centro de Voo Espacial Goddard, NASA. Em baixo: quatro contactos visíveis num trânsito de Vénus (ou de Mercúrio). Na entrada, ou ingresso, de Vénus no disco solar dão-se o primeiro (I) e segundo (II) contactos; na saída, ou egresso, são observados o terceiro (III) e o quarto (IV) contactos.
O trânsito
trânsito
Designa-se por trânsito a passagem de um objecto astronómico à frente do disco de um objecto maior e mais longínquo. Por exemplo, o trânsito de Vénus diante do Sol.
de Vénus
Vénus
É o segundo planeta mais próximo do Sol. Em termos de dimensões e massa é muito semelhante à Terra. A sua caracteristica mais marcante é possuir uma atmosfera de CO2 muito densa e um efeito de estufa muito intenso.
é simplesmente a passagem do planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
Vénus em frente ao disco solar, quando observado da Terra. Vénus e Mercúrio
Mercúrio
Mercúrio é o planeta mais próximo do Sol. É o mais pequeno dos planetas rochosos, com um diâmetro cerca de 40% menor do que o da Terra.
têm órbitas
órbita
A órbita de um corpo em movimento é a trajectória que o corpo percorre no espaço.
à volta do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
internas à órbita da Terra e por isso, periodicamente, encontram-se entre a Terra e o Sol (a esta configuração chama-se conjunção
conjunção
Uma conjunção ocorre quando dois corpos têm a mesma longitude celestial aparente, ou a mesma ascensão recta, ao serem observados a partir de um terceiro corpo. Se observarmos a conjunção do Sol e de um planeta duma órbita interior, diz-se que é uma conjunção inferior se o planeta estiver do nosso lado e diz-se que é uma conjunção superior se o planeta estiver do outro lado do Sol. Por exemplo, para o caso de Mercúrio e Vénus, a conjunção inferior ocorre quando estes estão entre a Terra e o Sol.
inferior). Mas, devido às diferentes inclinações dos planos das órbitas de Mercúrio, Vénus e Terra, só raramente acontece um trânsito. Para ocorrer um trânsito planetário, Vénus, ou Mercúrio, tem de passar exactamente na linha que une a Terra ao Sol, ou seja, a conjunção inferior tem de se dar quando os planetas interiores se encontram perto dos pontos de intersecção das suas órbitas com a eclíptica
eclíptica
A eclíptica é a linha de intersecção do plano da órbita da Terra à volta do Sol com a esfera celeste. Coincide com a trajectória aparente que o Sol descreve ao longo das 12 constelações do Zodíaco e ainda da Constelação de Ofiúco, durante um ano terrestre. Dado que o equador da Terra faz um ângulo de 23°27'30'' com o plano da órbita da Terra, a eclíptica também faz um ângulo de 23°27'30'' com o equador celeste, intersectando-o nos dois pontos equinociais.
(nodos orbitais). Em média, ocorrem cerca de 13 trânsitos de Mercúrio por século (um em cada 7,5 anos) e 4 trânsitos de Vénus em cerca de 243 anos.

O próximo trânsito de Vénus, no dia 8 de Junho, poderá ser observado na sua totalidade no Norte de Portugal Continental; o resto do país só perderá os instantes iniciais. Observar este raríssimo evento será um privilégio para a nossa geração, já que ninguém hoje vivo alguma vez observou este fenómeno – o último trânsito de Vénus ocorreu em 1882! E será, provavelmente, uma oportunidade única na vida dos portugueses, pois o próximo, em 2012, não será visível em Portugal. Depois, só em 2117 (não visível em Portugal) e em 2125 (parcialmente visível em Portugal).

Historicamente, os astrónomos utilizaram o trânsito de Vénus para determinar a distância da Terra ao Sol (a unidade astronómica
unidade astronómica (UA)
Unidade de distância, definida como a distância média entre a Terra e o Sol, que corresponde a 149 597 870 km, ou 8,3 minutos-luz.
), pelo método da triangulação. Se houver registos de observações em locais diferentes na Terra dos exactos momentos em que o planeta entra e deixa o disco solar, então é possível determinar a distância da Terra ao Sol utilizando a paralaxe
paralaxe
A paralaxe é a mudança aparente da posição de um objecto observado, causada por uma mudança da posição do observador
. Uma vez conhecido o valor da unidade astronómica, as distâncias dos outros planetas podem ser determinadas pela 3ª lei de Kepler
Leis de Kepler
As três Leis de Kepler do movimento planetário que descrevem as propriedades das órbitas elípticas são: 1ª- As órbitas planetárias são elipses em que o Sol é um dos focos; 2ª- (Lei das Áreas) no movimento orbital, áreas iguais são varridas em tempos iguais; 3ª- O quadrado do período é proporcional ao cubo da distância: P2=[4π2/ G(m1+m2)] a3.
.

J. Horroks e W. Crabtree foram os primeiros a utilizar telescópios para observar o trânsito de Vénus, em 1639, mas o primeiro astrónomo a reconhecer a importância da observação dos trânsitos planetários (de Mercúrio e de Vénus) para a determinação da escala do Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
foi Edmund Halley
Edmund Halley
(1656-1742) E. Halley, físico e matemático inglês, é mais conhecido por ter previsto, em 1705, que um certo cometa brilhante era periódico e seria visível de novo em 1758 - o que se confirmou e o cometa recebeu o nome de Cometa Halley. Contemporâneo de Isaac Newton, reconheceu a importância do trabalho de I. Newton e apoiou-o financeiramente na publicação dos seus Principia Mathematica. Distinguiu-se com muitos trabalhos em diversas áreas, incluindo: catálogos de estrelas do céu austral; teoria sobre a variação do magnetismo terrestre; estudos sobre os movimentos próprios das estrelas; os ventos e as monsões; as marés; óptica; cartografia; navegação marítima, e foi pioneiro em estudos sociológicos, calculando estatísticas com as tabelas de mortalidade.
. No século XVIII, os trânsitos de Vénus (1761 e 1769) não eram visíveis na Europa, o que levou astrónomos a navegarem até partes remotas do mundo para realizarem medições.

Actualmente, os interesses científicos nas observações dos trânsitos são outros, como por exemplo, aproveitá-los para o estudo e teste de métodos de detecção de planetas extra-solares
planeta extra-solar
Um planeta extra-solar é um planeta que não orbita o nosso Sol.
, dado que eles também transitam as suas estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
. O trânsito de Vénus de 2004 ficará certamente para a História pela atenção despertada no âmbito das escolas e pelas iniciativas que têm vindo a ser preparadas em todo o mundo. Destacamos aqui o programa educativo concebido pelo Observatório Europeu do Sul
European Southern Observatory (ESO)
O Observatório Europeu do Sul é uma organização europeia de Astronomia para o estudo do céu austral fundada em 1962. Conta actualmente com a participação de 10 países europeus e ainda do Chile. Portugal tornou-se membro do ESO em 1 de Janeiro de 2001, no seguimento de um acordo de cooperação que durou cerca de 10 anos.
- ESO: http://www.vt-2004.org (ou a tradução em Português http://www.oal.ul.pt/vt2004/ ).

Observar o trânsito de Vénus é, essencialmente, observar o Sol, o que significa tomar todas as precauções que se tomam quando se observam eclipses
eclipse
Um eclipse é uma ocultação total ou parcial de um corpo celeste, quando outro corpo passa entre este e o observador.
ou manchas solares: nunca se deve olhar o Sol olho nu, e muito menos sem qualquer protecção, sob o risco de provocar graves lesões oculares irreversíveis, ou mesmo a cegueira. Existem formas perfeitamente seguras para observar o trânsito de Vénus, como por exemplo, utilizando óculos equipados com filtros especiais, à venda em farmácias, utilizando a técnica da projecção, ou colocando filtros solares em telescópios.

O NUCLIO estará na Marina de Cascais (loja 20) a partir do nascer do Sol (~6h00), pondo à disposição do público telescópios com filtro solar, solarscopes, assim como algumas actividades educativas.

Se quiser tomar nota, terça-feira, dia 8 de Junho:
primeiro contacto 6h20;
segundo contacto 6h40;
máximo do trânsito 9h24
terceiro contacto 12h06;
quarto contacto 12h25.

Pode encontrar mais informação sobre trânsitos de Vénus no Tema do Mês:
http://www.portaldoastronomo.org/tema.php?id=5