Buraco negro destroça uma estrela

2004-04-12

Em cima, à esquerda: imagem da galáxia RX J1242-11 obtida pela ROSAT em Julho de 1992; em Janeiro de 1991, a ROSAT não detectou nenhuma fonte de raios-X neste campo; o quadrado a branco marca o campo de visão da imagem do Chandra (40x40 segundos de arco2) obtida agora. Crédito: NASA/CXC/MPE/S.Komossa et al. Em cima, à direita: imagem de RX J1242-11 obtida pelo Chandra em Março de 2001; vê-se uma única fonte pontual, cerca de 200 vezes menos brilhante do que quando foi observada pela ROSAT, 9 anos antes. Crédito: MPE/S.Komossa. Em baixo: ilustração em 4 passos da destruição de uma estrela por efeito de maré. 1- A estrela aproxima-se do buraco negro; 2- a estrela é esticada pelo efeito gravitacional do buraco negro (forças de maré); 3- as forças de maré são suficientemente fortes para desfazer a estrela; 4- a maior parte do gás da estrela perde-se do sistema, mas uma pequena porção é apanhada pelo buraco negro e acaba por aquecer e emitir radiação X, antes de cair no buraco negro. Crédito: ESA & Stefanie Komossa (Max Planck Institute for Extraterrestrial Physics).
Pela primeira vez, reuniram-se fortes evidências de um buraco negro
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
a destruir uma estrela
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
e a consumir parte desta. Os astrónomos acreditam que a estrela aproximou-se do buraco negro depois de ter sido desviada do seu rumo devido a um encontro muito próximo com outra estrela. À medida que chegava mais perto do buraco negro, o efeito gravitacional deste foi aumentando e a estrela foi sendo esticada pelas forças de maré, até ser desfeita.

Este evento, chamado destruição estelar por efeito de maré, foi capturado por dois observatórios espaciais: o Chandra
Chandra X-ray Observatory
O observatório de raios-X Chandra, lançado em 1999, faz parte do projecto dos Grandes Observatórios Espaciais da NASA. O seu nome homenageia Subrahmanyan Chandrasekhar, Prémio Nobel da Física em 1983. O Chandra detecta fontes de raios-X a milhares de milhões de anos-luz de nós. Observar em raios-X é a única forma de observar matéria muito quente, a milhões de graus Célsius. O Chandra detecta raios-X de regiões de alta energia, como por exemplo remanescentes de supernovas.
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
) e o XMM-Newton
X-ray Spectroscopy Multi-Mirror Mission (XMM-Newton)
Satélite de raios-X da Agência Espacial Europeia colocado em órbita no dia 10 de Dezembro de 1999, com a ajuda de um foguetão Ariane 5. Este satélite é o segundo de uma série de missões no âmbito do programa espacial europeu de longo termo Horizon 2000.
(ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
). Combinando estas observações com imagens mais antigas obtidas pela sonda ROSAT
ROentgen SATellite (ROSAT)
O observatório espacial de raios-X ROSAT foi uma missão internacional entre a Alemanha, os Estados Unidos da América e o Reino Unido, lançada em 1990 e terminada em 1999. Dois instrumentos principais foram a bordo do satélite: um telescópio de raios-X e uma câmara de campo largo com o seu próprio sistema de espelhos.
, os astrónomos detectaram uma potente fulguração
fulguração
Uma fulguração é uma libertação de energia de forma explosiva da qual resulta um aumento rápido do brilho do astro no qual ocorre. São exemplo deste tipo de fenómenos as fulgurações solares, associadas às manchas solares, bem como as fulgurações de raios-X, que ocorrem em estrelas de neutrões, e de raios gama, que se sabe estarem relacionadas com as explosões de supernova.
de raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
no centro da galáxia
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
RX J1242-11. Esta explosão em raios-X, uma das mais intensas alguma vez detectadas numa galáxia, teve origem no gás da estrela destruída, que foi aquecido a milhões de graus antes de ser engolido pelo buraco negro. A energia libertada pelo processo é equivalente à energia da explosão de uma supernova
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
.

O buraco negro no centro de RX J1242-11 tem uma massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
aproximadamente 100 milhões de vezes a massa do Sol
massa solar
Massa solar é a quantidade de massa existente no Sol e, simultaneamente, a unidade na qual os astrónomos exprimem as massas das estrelas, nebulosas e galáxias. Uma massa solar é igual a 1,989x1030 kg.
, enquanto que a estrela destruída teria provavelmente uma massa equivalente ao Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
. Os astrónomos calculam que cerca de 1% da massa da estrela foi consumida, ou acretada, pelo buraco negro. Esta pequena quantidade é consistente com as previsões de que o momento e a energia do processo de acreção
acreção
Designa-se por acreção a acumulação de matéria (gás e poeira) para um astro central, como por exemplo um buraco negro, uma estrela, uma galáxia, ou um planeta.
farão com que a maior parte do gás da estrela destruída escapar-se-á do buraco negro.

A probabilidade de ocorrer uma destruição estelar por efeito de maré numa galáxia é muito pequena. Se acontecesse no centro da nossa galáxia, a 25000 anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
de nós, a explosão em raios-X seria cerca de 50000 vezes mais brilhante do que a fonte de raios-X mais brilhante da nossa Galáxia
Via Láctea
A Via Láctea é a galáxia de que faz parte o nosso Sistema Solar. Trata-se de uma galáxia espiral gigante, com um diâmetro de cerca de 160 mil anos-luz e uma massa da ordem de 100 mil milhões de vezes a massa do Sol.
, sem contar com o Sol.

A alta-resolução espacial do Chandra e a alta-resolução espectral do XMM-Newton são essenciais para este tipo de estudos. O Chandra mostrou que o evento de RX J1242-11 ocorreu no centro da galáxia, onde reside o buraco negro. Por sua vez, o espectro obtido pelo XMM-Newton revelou que se tratava dum buraco negro, excluindo assim outras possíveis explicações astronómicas.

Fonte da notícia: http://www.esa.int/export/esaSC/SEMUPO1PGQD_extreme_0.html
ou http://chandra.harvard.edu/press/04_releases/press_021804.html