XMM-Newton põe em dúvida a existência de energia escura

2003-12-29

O objecto difuso no centro da imagem é RXJ0847.2+3449, um dos enxames de galáxias observados pelo XMM-Newton. RXJ0847.2+3449 é constituído por algumas dezenas de galáxias. A 7000 milhões de anos-luz de nós, observamo-lo como era há 7000 milhões de anos, quando o Universo tinha perto de metade da idade actual. Crédito: ESA.
Um grupo internacional de astrónomos, liderado por D. Lumb (Centro de Pesquisa e Tecnologia Espacial da ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
, na Holanda), comparou enxames de galáxias
enxame de galáxias
Um enxame, ou aglomerado, de galáxias é um conjunto de galáxias gravitacionalmente ligadas. A Via Láctea pertence ao aglomerado chamado Grupo Local de galáxias. O enxame de galáxias mais próximo de nós é o Enxame da Virgem.
distantes com enxames de galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
na nossa vizinhança. O estudo baseou-se em observações em raios-X
raios-X
A radiação X é a radiação electromagnética cujo comprimento de onda está compreendido entre o ultravioleta e os raios gama, ou seja, pertence ao intervalo de aproximadamente 0,1 Å a 100 Å. Descobertos em 1895, os raios-X tambêm são, por vezes, chamados de raios de Röntgen em homenagem ao seu descobridor. A radiação X é altamente penetrante, o que a torna muito útil, por exemplo, para obter radiografias.
, realizadas com o observatório espacial XMM-Newton
X-ray Spectroscopy Multi-Mirror Mission (XMM-Newton)
Satélite de raios-X da Agência Espacial Europeia colocado em órbita no dia 10 de Dezembro de 1999, com a ajuda de um foguetão Ariane 5. Este satélite é o segundo de uma série de missões no âmbito do programa espacial europeu de longo termo Horizon 2000.
(ESA), de oito enxames de galáxias distantes, em que o enxame mais longínquo dista cerca de 10 mil milhões de anos-luz
ano-luz (al)
O ano-luz (al) é uma unidade de distância igual a 9,467305 x 1012 km, que corresponde à distância percorrida pela luz, no vácuo, durante um ano.
. Este estudo foi conduzido no âmbito do Projecto Omega do XMM-Newton, que investiga a densidade
densidade
Em Astrofísica, densidade é o mesmo que massa volúmica: é a massa por unidade de volume.
de matéria no Universo.

Os enxames de galáxias são fortes emissores de raios-X porque contêm uma grande quantidade de gás a alta temperatura. Este gás rodeia as galáxias da mesma forma que o vapor rodeia as pessoas numa sauna. Ao medir a quantidade e a energia dos raios-X de um enxame de galáxias, os astrónomos conseguem deduzir a temperatura do gás, bem como a massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
do enxame de galáxias.

Teoricamente, num Universo onde a densidade de matéria é elevada, os enxames de galáxias continuam a crescer com o passar do tempo, de forma que, em média, os enxames de galáxias do presente deviam conter mais massa do que no passado. Mas a maioria dos astrónomos acredita que nós vivemos num Universo de baixa densidade de matéria, no qual uma substância misteriosa, designada por energia escura, constitui 70% do cosmos
Cosmos
O conjunto de tudo quanto existiu, existe e alguma vez existirá. A larga escala, o Universo parece ser isotrópico e homogéneo.
. Neste cenário, os enxames de galáxias deviam parar de crescer ainda cedo na história do Universo de modo que, a partir dessa altura, os enxames deviam ser praticamente indistintos dos enxames de galáxias do presente.

Num artigo a ser publicado na revista científica europeia Astronomy and Astrophysics, astrónomos do Projecto Omega apresentam resultados que mostram que os enxames de galáxias do Universo distante – e, portanto, do Universo mais jovem – são bastante diferentes dos enxames de galáxias próximos. Os enxames de galáxias do Universo mais jovem parecem emitir mais raios-X do que os do presente, o que significa que se alteraram com o tempo.

Num outro artigo, também a ser publicado na revista Astronomy and Astrophysics, A. Blanchard (Laboratório de Astrofísica do Observatório Midi-Pyrénées, em França) e os seus colaboradores concluem, do seu estudo sobre a evolução do número de enxames de galáxias com o tempo, que no passado havia menos enxames de galáxias. Este resultado também favorece um Universo de densidade de matéria elevada, contrariando o Modelo da Concordância que postula um Universo com 70% de energia escura e uma densidade de matéria muito baixa.

São, certamente, conclusões muito controversas. Para reconciliar as novas observações do XMM-Newton com o Modelo da Concordância, os astrónomos têm de admitir uma lacuna fundamental no seu conhecimento do comportamento dos enxames de galáxias e, possivelmente, das próprias galáxias que constituem os enxames. Quanto à possibilidade dos resultados do XMM-Newton estarem simplesmente errados, outras observações em raios-X estão a decorrer de forma a poder confirmá-los. Se o resultado for o mesmo, poderemos ter de repensar o o grau do nosso conhecimento da natureza do Universo.

Fonte da notícia: http://www.esa.int/export/esaCP/SEMRHL274OD_Expanding_0.html