“A Grande Morte”: novo estudo culpa um meteorito pela maior extinção na Terra

2003-12-15

Deccan Traps - depósitos vulcânicos no planalto do Decão, na Índia. Crédito: Lazlo Keszthelyi/VolcanoWorld.
A maior extinção na Terra ocorreu há 251 milhões de anos, quando 90% da vida no planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
desapareceu. A causa desta extinção maciça, conhecida por “A Grande Morte”, tem sido debatida há mais de uma década, com fortes críticas a quem defende que o culpado foi um meteorito
meteorito
Um meteorito é um corpo sólido que entra na atmosfera da Terra (ou de outro planeta), sendo suficientemente grande para não ser totalmente destruído pela fricção com as partículas da atmosfera, e assim atingir o solo. Os meteoritos dividem-se em três categorias, segundo a sua composição: aerolitos (rochosos), sideritos (ferro) e siderolitos (ferro e rochas).
que colidiu com a Terra. Esta teoria prevê que o grande impacto deu origem a mudanças climáticas drásticas e a actividade vulcânica extraordinária. Os dois efeitos terão afectado fortemente a composição da atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
, que levou milhares de anos até recuperar, deixando apenas um décimo das plantas e animais vivos.

Agora, uma equipa de investigadores liderada por A. Basu e R. Poreda (Universidade de Rochester, EUA) descreve num artigo da Science a descoberta de mais evidências que apontam um grande impacto de meteorito como responsável pela maior eliminação de vida na história do planeta. O meteorito seria muito antigo, da altura em que o Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
ainda se encontrava em formação.

Há duas décadas, Luis Alvarez (laureado com o Prémio Nobel ) e o seu filho Walter Alvarez detectaram, por toda a Terra, grandes concentrações de irídio em rochas que datam do fim da era dos dinossauros. Porque o irídio só se encontra em concentrações tão elevadas nos asteróides
asteróide
Um asteróide é um pequeno corpo rochoso que orbita em torno do Sol, com uma dimensão que pode ir desde os 100 m até aos 1000 km. A maioria dos asteróides encontra-se entre as órbitas de Marte e de Júpiter. Também são designados por planetas menores.
, concluíram que um meteorito gigante terá embatido na Terra por essa altura, levando provavelmente ao desaparecimento dos dinossauros. As conclusões dos Alvarez começaram por ser contestadas e ignoradas, mas as evidências foram-se acumulando e a sua teoria é hoje das teorias mais aceites.

A. Basu acrescentou argumentos à teoria dos Alvarez quando, em 1988, anunciou a descoberta de quartzo deformado (cristais especiais que se dividiram ao longo de certos planos indicativos de um grande impacto) imediatamente debaixo das armadilhas no planalto do Decão, Deccan Traps, na Índia. As Deccan Traps são enormes armadilhas (locais de acumulação) de depósitos vulcânicos que foram datados como sendo de há 65 milhões de anos – exactamente quando ocorreu a extinção dos dinossauros. A descoberta do quartzo deformado imediatamente debaixo das armadilhas sugere que um impacto gigante precedeu as grandes enchentes de lava.

Apesar do impacto de um meteorito ser hoje largamente aceite como a fonte do desaparecimento dos dinossauros, a origem da “Grande Morte” permanece em debate. Em 1991, Basu publicou um estudo que mostrava um enorme fluxo de lava na Sibéria, datado precisamente de há 251 milhões de anos, quando se deu a grande extinção. A lava não foi lançada numa grande erupção de um vulcão, mas infiltrou-se pela rocha derretida, ao longo de milhares de anos – a lava era tanta que se fosse espalhada uniformemente enterraria a superfície da Terra debaixo de 3 metros de magma.

Prosseguindo a sua investigação, Basu e Poreda mostraram que tanto a lava indiana como a lava siberiana vinham de uma profundidade até cerca de 3000 km abaixo da superfície. Estes não eram simplesmente exemplos de magma local que subiu pela crosta – algo trouxe a lava todo o caminho desde perto do núcleo terrestre.

A procura de amostras de rocha com 251 milhões de anos de idade não é fácil, pois as placas tectónicas oceânicas, que constituem até 70% da superfície terrestre, são mais recentes. Numa área na Antárctida chamada Pico da Grafite, Basu e Poreda tiraram rocha de um estrato que se encontrava entre uma camada que continha muitos fósseis e uma camada quase sem fósseis chamada fronteira do Pérmico/Triásico, ou P/T. Um dos fósseis que era predominante numa camada e passou a ausente na outra era a flora Glossopteris, uma planta que se sabe que desapareceu com “A Grande Morte”. Esta constatação assegurou-lhes que tinham extraído rocha do período certo. Poreda já tinha realizado testes nesta mesma camada e encontrado quartzo deformado e fulerenos, que são moléculas
molécula
Uma molécula é a unidade mais pequena de um composto químico, sendo constituída por um ou mais átomos, ligados entre si pelas interacções dos seus electrões.
que aprisionam átomos
átomo
O átomo é a menor partícula de um dado elemento que tem as propriedades químicas que caracterizam esse mesmo elemento. Os átomos são formados por electrões à volta de um núcleo constituído por protões e neutrões.
de gases extraterrestres, novamente indicando um impacto de meteorito ou cometa
cometa
Os cometas são pequenos corpos irregulares, compostos por gelos (de água e outros) e poeiras. Os cometas têm órbitas de grande excentricidade à volta do Sol. As estruturas mais importantes dos cometas são o núcleo, a cabeleira e as caudas.
. Contudo, estes resultados foram contestados por alguns investigadores.

Olhando para o problema de um novo ângulo, Basu e Poreda separaram as partículas magnéticas das amostras do Pico da Grafite e de uma fonte de estratos do P/T de Meishan (China) e do Japão. Para sua surpresa, descobriram que os grãos que seleccionaram continham uma liga de ferro que não existe na Terra. Uns 40 bocados eram pequeníssimos fragmentos de meteorito, com 4,56 mil milhões de anos, enquanto que outros grãos mostravam características metálicas que sugeriam ter sido formados por calor
calor
O calor é energia em trânsito entre dois corpos ou sistemas.
extremo, como por exemplo, num forte impacto dum meteorito. O próprio facto destes grãos não se terem deteriorado com o tempo significa que foram enterrados muito rapidamente nos depósitos sedimentares, o que mais uma vez aponta para a teoria de um grande impacto.

No final da era do Pérmico, a Antárctida encontrava-se perto da sua presente localização e era a parte mais a Sul do antigo supercontinente Pangeia, enquanto que o Sul da China se encontrava no equador e o Japão a norte do equador. Uma distribuição tão global e ampla destes grãos metálicos da fronteira do P/T favorecem o cenário de um grande impacto de um corpo celeste por essa altura.

Os críticos da teoria do impacto no P/T podem apontar a ausência do irídio, o elemento que é tão raro na Terra e tão comum nos asteróides, como um ponto fraco nesta teoria. O trabalho de investigação agora publicado argumenta fortemente que nem todas as colisões com corpos extraterrestres deixam irídio como prova. Basu sugere que, por exemplo, uma colisão com um cometa, que pode ter um núcleo de meteoróide, teria pouco irídio. Assim, o culpado que extinguiu nove em cada 10 criaturas na Terra e quase deu cabo da Vida quando esta ainda estava no seu início, pode ter sido criado antes da Terra estar completamente formada.

O assunto não está encerrado. Basu e Poreda planeiam continuar a procurar evidências de um impacto catastrófico na camada P/T em diferentes locais do mundo. Esperam conseguir um número suficiente de amostras de locais diferentes para ser possível reconstruir os cenários exactos das duas maiores extinções em massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
da história da Terra.

Fonte da notícia: http://www.rochester.edu/pr/News/NewsReleases/scitech/basu-meteorite.html