Estrutura geológica na superfície marciana sugere que rios fluíram em Marte no passado

2003-12-11

Em cima: esta fotografia cobre uma área de 14 km por 19,3 km dentro duma cratera (sem nome) do hemisfério Sul de Marte, a leste duma região onde existe uma grande rede de canais. A luz solar ilumina a superfície pela esquerda; a fotografia original, em tons de cinzento, foi obtida pela Mars Orbiter Camera, sendo a cor adicionada com base nos dados da câmara da Mars Odyssey. A estrutura em forma de leque cobre uma área de cerca de 13 km de comprimento e 11 km de largura. Ao centro: detalhe da região central da estrutura em forma de leque, mostrando uma crista em forma de arco, que é o chão invertido de um antigo canal que mudou de rumo. Em baixo: detalhe da região sudeste da estrutura em forma de leque, mostrando o cruzamento de cristas com níveis diferentes. Crédito: NASA/JPL/Malin Space Science Systems.
Fotografias obtidas com a sonda Mars
Marte
Marte é o quarto planeta do Sistema Solar, a contar do Sol. É o último dos chamados planetas interiores. O seu diâmetro é cerca de 50% mais pequeno do que o da Terra e possui uma superfície avermelhada, sendo também conhecido como planeta vermelho.
Global Surveyor
(NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
/JPL) revelam uma estrutura em forma de leque na superfície de Marte, que os investigadores interpretam como evidência de que, em tempos recuados, rios de água líquida fluíam na superfície marciana. Esta estrutura cobre uma área aproximada de 13 km de comprimento e 11 km de largura, e situa-se dentro de uma cratera sem nome do hemisfério Sul, numa região de vales e canais. Os investigadores acreditam que esta estrutura em forma de leque é o depósito de sedimentos transportados através dos vales pela água, que endureceram e sofreram a erosão ao longo do tempo. Este tipo de estrutura geológica é indicadora de deltas em leque e leques aluviais.

Num artigo publicado na edição on-line da revista Science, a equipa científica responsável pela Mars Orbiter Camera descreve as consequências mais importantes desta descoberta. Em primeiro lugar, a existência desta estrutura mostra que, durante períodos consideráveis de tempo, cursos de água percorreram alguns vales em Marte, tal como os rios o fazem na Terra. Em segundo lugar, o facto desta estrutura ser hoje um depósito de rocha sedimentar demonstra que algumas rochas sedimentares em Marte foram depositadas num ambiente líquido. E em terceiro lugar, a forma em leque, o padrão dos seus canais e os seus declives baixos oferecem evidências circunstanciais de que a estrutura geológica era, na verdade, um delta – ou seja, um depósito feito quando um rio, ou ribeiro, entra num reservatório de água, como um lago, por exemplo. Assim, esta formação é um forte indicador de que algumas crateras e bacias
bacia de impacto
Uma bacia é uma planície com uma depressão na qual se podem acumular por exemplo água, sedimentos, lava, ou gelos. Em Astronomia, uma bacia (dita de impacto) é uma cratera de impacto cujos bordos podem estar bem ou mal definidos.
em Marte tiveram, no passado, lagos. Apesar de centenas de outros locais onde vales entram pelas crateras e bacias terem sido fotografados pela Mars Orbiter Camera, nenhum mostrou formações geológicas como esta agora descoberta.

A estrutura em forma de leque é o remanescente de um depósito maior que sofreu erosão. O sedimento solto original foi endurecendo e transformou-se em rocha, que depois a erosão moldou ao que é hoje observado. Utilizando dados do altímetro a laser
Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation (LASER)
A palavra LASER designa uma amplificação de luz por emissão estimulada de radiação. O princípio físico por trás deste fenómeno é a emissão estimulada: sob certas condições, um fotão atinge um átomo excitado e provoca a emissão de um fotão. O átomo emite dois fotões: o fotão estimulador, que passa incólume, e o fotão estimulado, que tem o mesmo comprimento de onda, a mesma fase, a mesma polarização e a mesma direcção de propagação que o fotão estimulador. Se cada um destes fotões estimular mais átomos, o feixe inicial de fotões é assim amplificado.
da sonda Mars Global Surveyor, das câmaras das sondas Mars Odyssey
2001 Mars Odyssey
A missão 2001 Mars Odyssey é uma missão da NASA destinada ao planeta vermelho, Marte, com o objectivo de utilizar câmaras e espectrógrafos para procurar evidências da existência de água líquida e de actividade vulcânica, tanto no passado como no presente. Lançada em 7 de Abril de 2001, a sonda chegou a Marte em 24 de Outubro de 2001 e ficou a orbitar o planeta. Observações realizadas pela Mars Odyssey em 26 de Maio de 2002 deram indícios da existência de enormes depósitos de gelo de água abaixo da superfície do planeta.
e Viking Orbiter, assim como imagens da Mars Orbiter Camera, os investigadores estimaram que o leque tem actualmente cerca de um quarto do volume do material que foi removido dos canais donde vieram os sedimentos.

Os canais através dos quais os sedimentos foram transportados já não são visíveis hoje; apenas se mantêm os seus fundos, pois a erosão elevou-os de forma a transformá-los em cristas. O processo de inversão que transformou os fundos dos antigos canais em cristas ocorreu porque o material dos fundos era mais resistente às forças da erosão: ou era cimentado mais fortemente do que os materiais à volta, ou possuía grãos mais grossos (que são mais difíceis de remover), ou ambos.

A análise da região central do leque (ver a segunda imagem ao lado) mostra uma crista em forma de arco: é o fundo invertido dum curso sinuoso de água que ajustou o seu trajecto. A sinuosidade e as curvas cortadas em forma de arco são a principal evidência de que cursos de água persistiram durante bastante tempo nesta área.

O detalhe da região perto do bordo sudeste do leque (ver a última imagem ao lado) revela a existência, dentro do depósito sedimentar, de cristas (canais invertidos) com níveis diferentes, indicando uma longa e complexa história de processos relacionados com os cursos de água. Uma crista mais baixa, que fora o fundo de um canal que transportava água e sedimentos para baixo e para a direita, cruza outra crista, mais alta, que era o fundo de um canal que transportava material para cima e para a direita. A crista mais baixa foi formada primeiro; este canal já estava completamente cheio de sedimentos e soterrado debaixo da superfície quando o segundo canal se formou.

Embora ainda não tenha sido detectada, existem fortes indicações de que, em tempos, houve água líquida em Marte. Fotografias recentes obtidas pela Mars Global Surveyor sugerem que algumas ravinas foram cortadas por um curso efémero de água líquida, num passado geológico recente; outra sonda, a Mars Odyssey (NASA), descobriu extensos depósitos de gelo próximo da superfície, a grandes latitudes. A atmosfera
atmosfera
1- Camada gasosa que envolva um planeta ou uma estrela. No caso das estrelas, entende-se por atmosfera as suas camadas mais exteriores. 2- A atmosfera (atm) é uma unidade de pressão equivalente a 101 325 Pa.
de Marte é tão ténue que, qualquer água líquida à superfície rapidamente, ou se evapora, ou congela. Como consequência, se no passado houve água líquida que subsistiu na superfície marciana durante algum tempo, então é porque o clima era mais clemente.

A câmara a bordo da Mars Global Surveyor já tirou mais de 155 000 fotografias desde que a sonda começou a orbitar Marte, a 12 de Setembro de 1997. Contudo, as fotografias de alta resolução ainda só cobrem cerca de 3% da superfície do planeta
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
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Fonte da notícia: http://www.jpl.nasa.gov/releases/2003/151.cfm e
http://photojournal.jpl.nasa.gov/catalog/PIA04869