Novas observações desdizem a presença de gelo espesso nos pólos lunares

2003-12-02

Imagens dos pólos da Lua, obtidas com o sistema de radar do Observatório de Arecibo, no comprimento de onda de 70 cm. No topo, o pólo Sul lunar, mostrando as crateras Shoemaker e Faustini. Em baixo, o pólo Norte lunar, mostrando a cratera de Hermite e várias crateras pequenas perto da grande cratera Peary. Crédito: Bruce Campbell/Arecibo Observatory.
Duas sondas espaciais apresentaram, nos anos 90, evidências de que existe gelo espesso nos pólos da Lua
Lua
A Lua é o único satélite natural da Terra.
. Mas agora, observações realizadas com o sistema de radar do Observatório de Arecibo (Universidade Cornell/NSF), no comprimento de onda
comprimento de onda
Designa-se por comprimento de onda a distância entre dois pontos sucessivos de amplitude máxima (ou mínima) de uma onda.
de 70 cm, não encontraram sinais de gelo espesso nos pólos lunares. As observações foram as mais profundas até agora efectuadas com esta resolução espacial na superfície polar da Lua, alcançando mais de 5 metros de profundidade. Os resultados indicam que, se de facto existe água nos pólos, encontra-se bastante dispersa e permanentemente gelada nas camadas de poeira, duma forma semelhante ao solo sempre gelado (permafrost) que encontramos na Terra. E se assim for, só se poderá testar a presença de gelo nos pólos lunares indo à Lua recolher directamente um pequeno volume à volta de poeira, derretê-lo e procurar água com um espectrómetro de massa
espectrómetro de massa
Um espectrómetro de massa é um instrumento para produzir iões num gás e determinar a sua massa, de modo a determinar a sua composição.
.

As primeiras evidências observacionais da existência de gelo na Lua apareceram em 1996, quando dados de rádio
rádio
O rádio é a banda do espectro electromagnético de maior comprimento de onda (menor frequência) e cobre a gama de comprimentos de onda superiores a 0,85 milímetros. O domínio do rádio divide-se no submilímetro, milímetro, microondas e rádio.
obtidos com a sonda Clementine (SDIO/NASA
National Aeronautics and Space Administration (NASA)
Entidade norte-americana, fundada em 1958, que gere e executa os programas espaciais dos Estados Unidos da América.
) indicaram a presença de gelo na parede de uma cratera no pólo Sul da Lua. Depois, dados obtidos com o espectrómetro
espectrómetro
O espectrómetro é um instrumento cuja função é medir os comprimentos de onda de um determinado espectro de luz, permitindo identificar as espécies químicas responsáveis pelas riscas existentes nesse espectro.
de neutrões
neutrão
Partícula que, juntamente com o protão, constitui os núcleos atómicos. Exceptuando o hidrogénio, todos os átomos têm neutrões, e é o número de neutrões que determina o isótopo de determinado elemento químico. Os neutrões têm carga eléctrica neutra. Os neutrões são formados por três quarks (dois "d" e um "u"), são bariões (e hadrões) e o seu spin é um número semi-inteiro. Os neutrões livres declinam por decaímento beta, com um tempo de semi-vida de 10,8 minutos, originando um protão, um electrão e um neutrino. No núcleo atómico, o neutrão é tão estável quanto o protão.
da sonda Lunar Prospector (NASA), lançada em 1998, indicaram a presença de hidrogénio, e por inferência, a presença de água nos pólos lunares, a uma profundidade de cerca de um metro. Contudo, observações realizadas com o sistema de radar em Arecibo, no comprimento de onda de 12 cm, não mostraram sinais de gelo espesso nos pólos da Lua pelo menos até um metro de profundidade. E agora, os novos dados obtidos em Arecibo tornam pouco provável a presença de gelo espesso nos pólos lunares até 5 metros de profundidade.

Em Mercúrio
Mercúrio
Mercúrio é o planeta mais próximo do Sol. É o mais pequeno dos planetas rochosos, com um diâmetro cerca de 40% menor do que o da Terra.
, o radar de Arecibo encontrou, em crateras à sombra (que nunca chegam a apanhar luz solar), camadas de gelo com espessura da ordem de um metro, somente com uma fina camada de poeira por cima. Este era o cenário que se esperava verificar na Lua, mas que as observações com o radar não confirmaram. A diferença entre Mercúrio e a Lua pode dever-se à taxa média de cometas
cometa
Os cometas são pequenos corpos irregulares, compostos por gelos (de água e outros) e poeiras. Os cometas têm órbitas de grande excentricidade à volta do Sol. As estruturas mais importantes dos cometas são o núcleo, a cabeleira e as caudas.
que atingem a superfície lunar ser baixa, aos recentes impactos de cometas em Mercúrio, ou ao facto da Lua perder o gelo mais rapidamente do que Mercúrio.

Os pólos lunares são boas armadilhas para a água gelada devido encontrarem-se à temperatura de –173°C. Nos pólos da Lua, o limbo do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
aparece apenas 2 graus acima do horizonte, de forma que a luz solar nunca penetra nas crateras mais profundas. O radar de Arecibo sondou o solo de duas crateras profundas, no pólo Sul da Lua, que permanecem sempre na sombra: Shoemaker e Faustini. E no pólo Norte, sondou o solo de Hermite e de várias crateras pequenas na zona da grande cratera Peary.

O radar de Arecibo é um bom detector de gelo espesso porque tira vantagem do fenómeno conhecido por coherent backscatter: as ondas de radar ao atravessarem o gelo podem percorrer distâncias consideráveis sem serem absorvidas e irregularidades dentro do gelo provocam reflexões que produzem um forte eco de radar; por contraste, o solo lunar é muito mais absorvente e não provoca um eco de radar tão forte.

Este trabalho, liderado pelo investigador B. Campbell (Centro para os Estudos Terrestres e Planetários do Instituto Smithsonian, EUA) encontra-se descrito num artigo publicado na revista científica Nature, de Novembro.

Fonte da notícia: http://www.news.cornell.edu/releases/Nov03/radar.moonpoles.deb.html