Cometas afinal não são relíquias intocadas do Sistema Solar

2003-09-15

Visão artística de um cometa. Crédito: ESA/AOES Medialab.
Há muito que se consideravam os cometas
cometa
Os cometas são pequenos corpos irregulares, compostos por gelos (de água e outros) e poeiras. Os cometas têm órbitas de grande excentricidade à volta do Sol. As estruturas mais importantes dos cometas são o núcleo, a cabeleira e as caudas.
como constituídos por material congelado no tempo, isto é, que não tinha evoluído desde a época de formação do nosso Sistema Solar
Sistema Solar
O Sistema Solar é constituído pelo Sol e por todos os objectos que lhe estão gravitacionalmente ligados: planetas e suas luas, asteróides, cometas, material interplanetário.
. Estudos recentes mostram que afinal não é assim: vários processos, ao longo dos 5 mil milhões de anos de idade do nosso Sistema Solar, alteraram lentamente os cometas enquanto estavam retidos no seu local de origem, a remota nuvem de Oort
Nuvem de Oort
A Nuvem de Oort é uma nuvem esférica que rodeia o Sistema Solar, constituída por pequenos corpos gelados, resíduos da formação do Sistema Solar. Embora não existam observações directas dos objectos desta nuvem, acredita-se que seja o reservatório da maior parte dos cometas que entram no Sistema Solar interior, os cometas de longo-período. Os astrónomos estimam que a Nuvem de Oort estende-se entre 50 000 e 100 000 UA. A Nuvem de Oort foi proposta pelo astrónomo J. Oort em 1950.
.

Consequentemente, tornou-se agora claro que a nuvem de Oort, bem como a sua parente próxima, a cintura de Kuiper
Cintura de Kuiper
A Cintura de Kuiper é uma região em forma de disco, localizada depois de Neptuno, entre 30 e 50 UA do Sol. É constituída por muitos pequenos corpos gelados, restos da formação do Sistema Solar, e é a fonte dos cometas de curto-período. O primeiro objecto da Cintura de Kuiper, 1992QB1, com 240 km de diâmetro, só foi descoberto em 1992, mas desde então já se conhecem centenas de objectos da Cintura de Kuiper (KBO, do inglês Kuiper Belt Object). Há astrónomos que consideram Plutão, e a sua lua Caronte, objectos da Cintura de Kuiper.
, não são congeladores cósmicos perfeitos, pois não conseguiram preservar as propriedades primitivas do material que compõe os cometas.

O primeiro processo que foi reconhecido como tendo afectado os cometas, durante o seu armazenamento na nuvem de Oort, é a radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
. Seguidamente, os astrónomos compreenderam que a pulverização dos grãos de poeira para o meio interestelar
meio interestelar
O meio interestelar é constituído por toda a matéria existente no espaço entre as estrelas. Cerca de 99% da matéria interestelar é composta por gás, sendo os restantes 1% dominados pela poeira. A massa total do gás e da poeira do meio interestelar é cerca de 15% da massa total da matéria observável da nossa galáxia, a Via Láctea. A matéria do meio interestelar existe em diferentes regimes de densidade e temperatura, como por exemplo as nuvens moleculares (frias e densas) ou o gás ionizado (quente e ténue).
desempenha um papel importante na evolução dos cometas. Finalmente, alguns modelos teóricos defendem que os cometas da nuvem de Oort podem ser aquecidos de forma significativa devido à passagem de estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
na vizinhança do Sol
Sol
O Sol é a estrela nossa vizinha, que se encontra no centro do Sistema Solar. Trata-se de uma estrela anã adulta (dita da sequência principal) de classe espectral G. A temperatura na sua superfície é aproximadamente 5800 graus centígrados e o seu raio atinge os 700 mil quilómetros.
, bem como devido a alguma explosão de supernova
supernova
Uma supernova é a explosão de uma estrela no final da sua vida. As explosões de supernova são de tal forma violentas e luminosas que o seu brilho pode ultrapassar o brilho de uma galáxia inteira. Existem dois tipos principais de supernova: as supernovas Tipo Ia, que resultam da explosão duma estrela anã branca que, no seio de um sistema binário, rouba matéria da estrela companheira até a sua massa atingir o limite de Chandrasekhar e então colapsa; e as supernovas Tipo II, que resultam da explosão de uma estrela isolada de massa elevada (com massa superior a cerca de 4 vezes a massa do Sol) que esgotou o seu combustível nuclear e expeliu as suas camadas externas, restando apenas um objecto compacto (uma estrela de neutrões ou um buraco negro).
relativamente próxima de nós que entretanto tenha ocorrido.

Mais recentemente, os investigadores descobriram que os cometas da cintura de Kuiper (a região que fornece os cometas de curto período
cometa de curto período
Designam-se por cometas de curto período aqueles cujo período orbital é inferior a 200 anos.
, situada a cerca de 50 AU
unidade astronómica (UA)
Unidade de distância, definida como a distância média entre a Terra e o Sol, que corresponde a 149 597 870 km, ou 8,3 minutos-luz.
do Sol) podem ser apreciavelmente danificados por colisões. A ser assim, isto implica que os cometas da cintura de Kuiper, embora compostos por material muito antigo, não podem eles próprios ser muito velhos. Pelo contrário, estes cometas devem ser objectos recentemente criados a partir de objectos maiores que, na cintura de Kuiper, terão existido e posteriormente sido destruídos por violentos impactos. De facto, esta hipótese parece ser confirmada pelas observações que mostram que muitos dos cometas de curto período não parecem ser velhos.

Como resutado destas descobertas recentes, os astrónomos compreendem agora que os cometas, embora sejam os objectos do Sistema Solar mais bem preservados desde que o Sol e os planetas
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
se formaram, foram sendo modificados de forma significativa, embora muito lenta, enquanto armazenados na nuvem de Oort e na cintura de Kuiper. Neste contexto, missões como a ROSETTA (ESA
European Space Agency (ESA)
A Agência Espacial Europeia foi fundada em 1975 e actualmente conta com 15 países membros, incluindo Portugal.
), na qual uma sonda irá pousar no núcleo de um cometa
núcleo de um cometa
O núcleo de um cometa é a parte sólida e gelada, localizada no centro da cabeça do cometa e é constituído por poeiras e gases gelados. O diâmetro dos núcleos cometários tem tipicamente entre 10 e 20 km.
e retirar amostras de material, serão extremamente importantes.

Fonte da notícia: http://www.swri.org/9what/releases/astspin.htm