Foi obtido o primeiro mapa celeste de neutrinos de alta energia!

2003-08-13

O primeiro mapa com a localização de possíveis fontes de neutrinos de alta energia no hemisfério celeste Norte. Crédito: AMANDA Project.
Detectar neutrinos
neutrino (ν)
O neutrino é uma partícula elementar da classe dos leptões. Com carga eléctrica nula e massa quase nula, o neutrino interage muito pouco, estando sujeito apenas à força nuclear fraca e à força gravitacional. O neutrino é um leptão e tem spin semi-inteiro (fermião). Conhecem-se três tipos diferentes de neutrinos: o neutrino do electrão (νe), o neutrino do muão (νμ), e o neutrino do tau (ντ).
de alta energia e sobretudo ser capaz de identificar a sua origem permanece uma das mais importantes buscas na Astrofísica dos nossos dias. Dado que os neutrinos cósmicos são invisíveis, não possuem carga eléctrica, e quase não possuem massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
, é quase impossível detectá-los. Ao contrário dos fotões
fotão
O fotão, muitas vezes referido como a partícula de luz, é o quantum do campo electromagnético e é a partícula elementar da radiação electromagnética.
, que constituem a radiação electromagnética
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
, os neutrinos podem atravessar planetas
planeta
Um planeta é um objecto que se forma no disco que circunda uma estrela em formação e cuja massa é superior à de Plutão (1/500 da massa da Terra) e inferior a 10 vezes a massa de Júpiter. Ao contrário das estrelas, os planetas não produzem luz, apenas reflectem a luz da estrela que orbitam.
, estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
, os vastos campos magnéticos
campo magnético
O campo magnético é a região em torno de um corpo na qual é detectada uma força magnética. Os campos magnéticos actuam apenas em partículas electricamente carregadas. Campos magnéticos fracos são por exemplo gerados por efeito de dínamo no interior dos planetas e luas, enquanto que campos magnéticos mil milhões de vezes mais fortes podem ser gerados em estrelas e galáxias. Os campos magnéticos são capazes de controlar o movimento de gás ionizado e até moldar a forma dos corpos por eles actuados.
do espaço interestelar, e até galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
inteiras, sem sofrer qualquer interacção. É por esta razão que é muito difícil detectar neutrinos. Mas é também pela mesma razão que os neutrinos,produzidos por eventos que ocorreram a distâncias cosmológicas, são portadores de informação que permaneceu intacta ao longo do seu trajecto.

Com base em dados recolhidos ao longo de um único ano, o telescópio AMANDA II (do inglês Antartic Muon and Neutrino Detector Array) permitiu aos astrónomos obter o primeiro mapa do céu visto em neutrinos de alta energia. Este mapa, dado a conhecer à comunidade científica no último congresso da União Astronómica Internacional
International Astronomical Union (IAU)
A União Astronómica Internacional foi fundada em 1919, tendo por missão promover, coordenar e salvaguardar a Ciência da Astronomia, em todos os aspectos, através de colaboração internacional. Conta com mais de 8 300 membros individuais, e ainda com 66 países membros. É a entidade internacionalmente reconhecida como autoridade para a atribuição de designações de objectos celestes e de quaisquer características à sua superfície, como por exemplo crateras e vulcões.
, é um mapa preliminar, e fornece aos astrónomos as primeiras pistas sobre os neutrinos de alta energia, que se julgam emanar dos acontecimentos celestes mais violentos no Universo: colisões de buracos negros
buraco negro
Um buraco negro é um objecto cuja gravidade é tão forte que a sua velocidade de escape é superior à velocidade da luz. Em Astronomia, distinguem-se dois tipos de buraco negro: os buracos negros estelares, que resultam da morte de uma estrela de massa elevada, e os buracos negros galácticos, que existem no centro das galáxias activas.
, fulgurações de raios gama
fulguração de raios gama
Uma fulguração de raios gama é uma potentíssima explosão, com consequente libertação de fotões gama, que ocorre em direcções aleatórias no céu. Descobertas acidentalmente nos anos 1960, sabe-se que algumas delas estão associadas a um tipo particular de supernovas, as explosões que marcam o fim da vida de uma estrela de massa elevada.
, e os núcleos activos das galáxias muito distantes.

Para já, o mapa vem demonstrar que a tecnologia utilizada neste tipo de detector funciona. Este telescópio, financiado pela Fundação Nacional para a Ciência (EUA), está situado no pólo Sul. O seu princípio de detecção é baseado em pequenos detectores de luz enterrados no gelo a 1,5 km de profundidade. Contudo, ao contrário do que se poderia pensar, não foi concebido para olhar para cima (ou seja, para detectar neutrinos provenientes do céu do Sul)! Foi concebido para olhar para baixo, ou seja, para o céu do hemisfério Norte através Terra. O telescópio consiste em 677 módulos ópticos feitos de vidro, cada um deles com o tamanho de uma bola de bowling, dispostos ao longo de 19 cabos colocados na vertical por baixo do gelo antárctico. Estes 19 cabos definem um volume cilíndrico com 500 m de comprimento e 120 m de largura, constituindo assim um autêntico detector de partículas.

Contudo, estamos ainda longe de poder detectar neutrinos nesta gama de altas energias de forma rotineira. Mesmo que soubéssemos da existência duma fonte cosmológica responsável por alguns destes neutrinos, só poderíamos detectar cerca de 10 neutrinos por ano provenientes dessa fonte, o que é manifestamente insuficiente. No entanto, para dar alguma resposta neste sentido, está já planeada uma extensão do próprio telescópio AMANDA: acrescentar mais cabos aos 19 actualmente utilizados de modo a produzir um detector cobrindo um volume de 1 quilómetro cúbico no pólo Sul! Esse telescópio chamar-se-á IceCube (Cubo de Gelo).


Fonte da notícia: http://www.pressroom.astronomy2003.com/news/index.html?id=32