Desvendando os segredos das galáxias anãs

2003-08-04

Simulação da galáxia esferoidal anã Ursa Menor, envolta por um halo de matéria escura. Crédito: Richard Sword (University of Cambridge).
Pensa-se que as galáxias
galáxia
Um vasto conjunto de estrelas, nebulosas, gás e poeira interestelar gravitacionalmente ligados. As galáxias classificam-se em três categorias principais: espirais, elípticas e irregulares.
esferoidais anãs são os blocos de construção de galáxias maiores. As galáxias esferoidais anãs são raras e exibem poucas estrelas
estrela
Uma estrela é um objecto celeste gasoso que gera energia no seu núcleo através de reacções de fusão nuclear. Para que tal possa suceder, é necessário que o objecto possua uma massa superior a 8% da massa do Sol. Existem vários tipos de estrelas, de acordo com as suas temperaturas efectivas, cores, idades e composição química.
. Mas contêm grandes quantidades de matéria escura
matéria escura
A matéria escura é matéria que não emite luz e por isso não pode ser observada directamente, mas cuja existência é inferida pela sua influência gravitacional na matéria luminosa, ou prevista por certas teorias. Por exemplo, os astrónomos acreditam que as regiões mais exteriores das galáxias, incluindo a Via Láctea, têm de possuir matéria escura devido às observações do movimento das estrelas. A Teoria Inflacionária do Universo prevê que o Universo tem uma densidade elevada, o que só pode ser verdade se existir matéria escura. Não se sabe ao certo o que constitui a matéria escura: poderão ser partículas subatómicas, buracos negros, estrelas de muito baixa luminosidade, ou mesmo uma combinação de vários destes ou outros objectos.
, ou seja, matéria que não emite radiação
radiação electromagnética
A radiação electromagnética, ou luz, pode ser considerada como composta por partículas (os fotões) ou ondas. As suas propriedades dependem do comprimento de onda: ondas ou fotões com comprimentos de onda mais longos traduzem radiação menos energética. A radiação electromagnética, ou luz, é usualmente descrita como um conjunto de bandas de radiação, como por exemplo o infravermelho, o rádio ou os raios-X.
e que por isso os astrónomos não podem observar. Para sondar os segredos escuros destas galáxias, uma equipa, constituída por astrónomos da Universidade de Cambridge (Reino Unido), recorreu a alguns dos maiores telescópios ópticos da Terra. O seu trabalho foi apresentado na conferência da União Astronómica Internacional
International Astronomical Union (IAU)
A União Astronómica Internacional foi fundada em 1919, tendo por missão promover, coordenar e salvaguardar a Ciência da Astronomia, em todos os aspectos, através de colaboração internacional. Conta com mais de 8 300 membros individuais, e ainda com 66 países membros. É a entidade internacionalmente reconhecida como autoridade para a atribuição de designações de objectos celestes e de quaisquer características à sua superfície, como por exemplo crateras e vulcões.
, que decorreu em Sidney (Austrália) no final de Julho.

Algumas das galáxias esferoidais do nosso Grupo Local
Grupo Local de galáxias
O Grupo Local de galáxias é o enxame de galáxias a que a Via Láctea pertence. É um enxame pequeno, constituído por duas galáxias espirais grandes - Andrómeda e a Via Láctea - e por mais de quarenta pequenas galáxias, muitas só descobertas recentemente.
de Galáxias encontram-se suficientemente próximas de forma aos astrónomos conseguirem medir o movimento de estrelas individuais. O estudo do movimento de muitas estrelas permite determinar a distribuição de massa
massa
A massa é uma medida da quantidade de matéria de um dado corpo.
de uma galáxia.

Surpreendentemente, quando os astrónomos observaram as estrelas no bordo de uma destas galáxias esferoidais anãs, a galáxia do Dragão, descobriram que estas estrelas da região mais externa da galáxia, estavam a mover-se com uma velocidade tão elevada que a galáxia só poderia manter-se coesa se contivesse uma massa de matéria escura 100 vezes superior à massa de todas as estrelas. Utilizando modelos teóricos dos movimentos das estrelas numa galáxia que contém grandes quantidades de matéria escura, a equipa demonstrou que as suas observações só podiam ser explicadas se a galáxia estivesse rodeada por um enorme halo de matéria escura.

Observações da galáxia esferoidal anã da Ursa Menor foram um elemento surpresa neste estudo. A equipa descobriu um inesperado conjunto de estrelas que se moviam devagar e interpretaram como sendo os restos mortais de um enxame globular. O enxame, que se devia ter desmembrado pela galáxia fora, continuava coeso. A equipa apercebeu-se então que isso só é possível se a matéria escura nesta galáxia estiver distribuída de uma forma diferente das outras galáxias normais.

Em Maio de 2003, observações adicionais da galáxia da Ursa Menor mostrou que as estrelas nas regiões mais externas da galáxia não se movem tão depressa como as estrelas no bordo da galáxia do Dragão. Várias teorias estão a ser trabalhadas para explicar este facto. Talvez a matéria escura no bordo da galáxia da Ursa Menor tenha sido capturada pela Via Láctea
Via Láctea
A Via Láctea é a galáxia de que faz parte o nosso Sistema Solar. Trata-se de uma galáxia espiral gigante, com um diâmetro de cerca de 160 mil anos-luz e uma massa da ordem de 100 mil milhões de vezes a massa do Sol.
, a sua maior vizinha, permitindo que algumas das estrelas da galáxia da Ursa Menor se afastassem devagarinho para fora da sua galáxia de origem. Ou talvez sejam estrelas que passaram demasiado perto de outras estrelas do centro da galáxia, e esse encontro próximo as tenha lançado para o bordo da galáxia.

Qualquer que seja a explicação, esta descoberta promete um marco importante para a Astronomia: a primeira detecção dos verdadeiros limites de uma galáxia. Esta poderá ser a chave para a compreensão de como se formam galáxias gigantes, tais como a nossa Via Láctea.


Fonte da notícia: http://www.admin.cam.ac.uk/news/press/dpp/2003072301